O I Congresso dos Médicos Residentes do Paraná, encerrado nesta sexta-feira em Curitiba, apresentou como consenso a visão de que as atuais políticas governamentais de saúde e educação projetam um cenário sombrio à expectativa da sociedade de acesso a médicos éticos, bem-formados e com as condições de infra-estrutura necessárias para prestar atendimento resolutivo e de qualidade. Para os participantes do encontro, os equívocos envolvem a aceitação passiva da abertura indiscriminada de escolas médicas descompromissadas com a qualidade e de desfiguração da residência médica, passando-a de política de educação para política de saúde, tentando usar o residente como mão-de-obra barata para solucionar deficiências do SUS.
O recente anúncio de que o Ministério da Saúde pretende implantar um novo perfil para a medicina, com o objetivo de formar médicos para as necessidades prioritárias do sistema público, fortalecendo a atenção básica, gerou críticas contundentes. Convidado para fazer a conferência de abertura do Congresso, o presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica, Antonio Carlos Lopes, declarou-se desapontado com o que entende como “desconstrução” do trabalho democrático que ajudou a estabelecer nos quatro anos que esteve à frente da Comissão Nacional de Residência Médica, da qual se desligou no começo do ano contrariado com as ingerências políticas. E foi enfático: “Entendemos que a prioridade deve ser a formação de médicos competentes, éticos, prontos para trabalhar no SUS e também nos diversos locais que o mercado oferece. O paciente do SUS também merece um médico qualificado. Por isso, a formação deve ser de excelência. A proposta do Ministério da Saúde mostra desconhecimento sobre o ensino médico e exercício profissional. Afronta princípios de ensino preconizados por quem exerce a medicina e busca a excelência acadêmica e a competência profissional.”
Antonio Carlos Lopes, também professor titular de Clínica Médica da Unifesp, interpreta e que correto e bom ensino médico é complexo, envolvendo currículo humanista, modelo pedagógico, estrutura acadêmico-administrativa, metodologia de ensino e avaliação e recursos humanos e materiais condizentes. “É necessário ainda que haja quem ensine, pois a medicina é uma profissão em que só se aprende ao lado de quem sabe, assim como é fundamental o ambiente em que se dá o aprendizado”, diz. Ele critica as condições precárias hoje do sistema, que tenta propagar uma residência médica com perfil mais preventivo mas atesta sua incompetência no controle da dengue, da febre amarela e outras doenças prevalentes.
Falta política
O Prof. Renato Passini, da Unicamp e representante da Associação Médica Brasileira na CNRM, faz coro ao discurso de que não é com mais médicos que se suprirá as deficiências no acesso à assistência, mas com condições de trabalho digno para fixar o profissional fora dos grandes centros. “Nâo existe política pública para fixação do médico”, lembra o professor, citando a necessidade de programa de descentralização, de plano de cargos, salários e carreira e de condições de trabalho com segurança e qualidade. Para ele, é utópico pensar que a solução da fixação do médico nas áreas carentes pode estar nos graduados no Exterior, sobretudo Cuba, ressaltando os riscos do despreparo e a condição só temporária de sedução das condições de mercado ao profissional. Assinalou que
Destaca Passini que o número de médicos cresce duas vezes mais do que o da população. Cita que, até o ano de 2000, o Brasil tinha 100 escolas médicas. Hoje já são 175, com oferta de mais de 17 mil vagas no primeiro ano. Menos da metade desses graduandos terá acesso à residência médica, com reflexo na qualidade da formação. O resultado do Enade 2008, que avaliou 113 cursos, indicou que quase 20% deles está em desacordo com os preceitos exigíveis de qualificação. Com isso, diz o professor da Unicamp, pode se interpretar o elevado contingente de profissionais despreparados que chegam ao mercado. José Luiz Bonamigo Filho, da Comissão de Integração do Médico Jovem do CFM, avalia também a situação como grave e que é contrário à abertura de novas vagas de residência para encobrir o problema de excesso de médicos sem condições de ocupá-las. A questão dos especializandos e estagiários, que estariam trabalhando como instrumento de mão-de-obra barata e sem acompanhamento de preceptores, também foi debatida no encontro.
Estatística
O Brasil tem hoje 331.020 médicos ativos, dos quais 16.814 estão no Paraná – 7.985 somente
Lançamento de livro
O livro “Câncer: estadiamento e tratamento” foi lançado na noite de quinta-feira (15) como parte das atividades do I Congresso dos Médicos Residentes do Paraná, realizado no Conselho de Medicina,