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Lei de Planos de Saúde: nada a comemorar

            No mês de junho, a Lei de Planos de Saúde (Lei 9.656/98) completou 10 anos. O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) avalia que a data representa muito mais um marco para reflexão do que momento para comemorações. As notícias sobre o assunto, o número de reclamações e de ações judiciais sobre planos de saúde ilustram bem a grave situação dos consumidores.

            O setor cresceu por 30 anos permeado de abusos contra os usuários, praticamente sem qualquer regulamentação do Estado, controle ou fiscalização. Assim permaneceu até 1991, quando passou a vigorar o Código de Defesa do Consumidor (CDC), cujas normas para equilibrar todas as relações de consumo representaram avanço sem precedentes na defesa dos usuários de planos de saúde. A partir daí, o Poder Judiciário pôde impedir abusos como a exclusão da cobertura de doenças graves – câncer e Aids, por exemplo – e a limitação do número de dias de internação hospitalar, criando significativa jurisprudência favorável aos consumidores lesados.

            Mesmo assim, as empresas de planos de saúde prosseguiram desrespeitando o direito à saúde dos usuários, pouco alterando suas práticas e cláusulas abusivas, o que resultou em grande movimento – do qual o Idec fez parte, junto com os Procons, Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, Conselho Federal de Medicina, Associação Médica Brasileira – reivindicando uma legislação específica para equilibrar as relações entre consumidores, profissionais de saúde e empresas de assistência à saúde.

            A pressão do setor foi grande e a lei aprovada em 2/6/1998 deixou muito a desejar, na medida em que admitiu expressamente a possibilidade de exclusão de procedimentos relacionados às doenças preexistentes (conceito criado pelo próprio setor para reduzir coberturas), permitiu aumentos por mudança de faixa etária, acolheu a reivindicação dos planos de saúde de fragmentação da assistência – em planos ambulatoriais, hospitalares com ou sem parto, odontológicos.

            Sem dúvida, a Lei 9.656/98 trouxe avanços, como a definição da lista da Organização Mundial da Saúde (OMS) como referência para a cobertura de procedimentos; o estabelecimento de critérios para a entrada, funcionamento e saída de empresas no setor; a transferência para a área governamental da saúde da responsabilidade pela regulação e fiscalização das operadoras, tanto em relação aos aspectos assistenciais como àqueles ligados à atividade econômica.

            Lamentavelmente, em 10 anos de lei, pouco mudou na vida real. A nova lei, que já não trazia alterações estruturais no setor, foi piorada por medidas provisórias e resoluções. Sobretudo, ruim foi e é a atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Desde 2000, quando foi criada a ANS, o Idec tem acompanhado seu trabalho, contribuindo com informações, sugestões de regulamentação da lei, entre outros. O Idec chegou a integrar a Câmara de Saúde Suplementar, órgão consultivo da ANS, mas saiu após constatar que a agência não tem ouvidos para os consumidores.

            Os aumentos abusivos, as exclusões de coberturas, a falta de fiscalização do setor, as quebras de operadoras e as conseqüências graves para os usuários, entre muitos outros abusos, continuam aí, de um jeito ou de outro, para consumidores que têm contratos antigos e para os que têm novos.

            Diante de tantas questões que dizem respeito à saúde e à vida dos usuários de planos de saúde, já é tempo de a Agência Nacional de Saúde Suplementar passar a exercer adequadamente sua função pública, seu papel regulador e fiscalizador de forma mais eficiente, mais transparente e mais comprometida com a saúde da população.

            O Idec espera que os próximos 10 anos sirvam, primeiro, para corrigir as falhas cometidas pela agência nesses anos passados e, depois, para mudar os rumos da assistência privada à saúde, a partir de uma política pautada na defesa do direito à saúde e não apenas em ditar regras para o mercado, o que reduz a assistência em saúde à condição de mercadoria.

 

Artigo de Marilena Lazzarini, Coordenadora executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec); e Daniela Batalha Trettel – Advogada do Idec