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Novas regras apertam cerco às operadoras de saúde

ANS aumenta piso de garantias financeiras e setor teme venda ou leilão de carteiras. Uma questão polêmica está tirando o sono dos dirigentes de operadoras de saúde: como se adequar às novas normas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Publicadas há um mês, as novas resoluções normativas ampliam as exigências em relação às garantias financeiras das empresas do setor. Até então, nada fora do previsto. As operadoras já esperavam que findados os seis anos da primeira normativa (RDC Nº 77), que determinou critérios mínimos sobre as provisões técnicas, uma nova lei seria publicada. A surpresa do setor foi quanto à rigidez da nova legislação. A ANS apertou o cerco e as mudanças não vieram em doses homeopáticas.

            "No que diz respeito à segurança para o beneficiário, não há como discutir a importância das novas normas", afirma Arlindo de Almeida, presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge). "O problema é como será feita a constituição dessas garantias, uma vez que grande parte das empresas não conseguiu se adaptar nem mesmo à legislação anterior."

            As operadoras de saúde tiveram seis anos para atender a primeira regulamentação, que determinava a existência de um capital mínimo de operação e uma provisão de risco. Nem todas foram bem-sucedidas. Dados divulgados pela ANS em julho mostram que apenas 838 operadoras se enquadraram às normas. Essas empresas atendem 30,1 milhões de beneficiários, correspondente a 13% de todos os beneficiários do sistema. A entidade aguarda ainda a manifestação de 746 operadoras (47% das empresas), que atendem cerca de 6 milhões de pessoas em todo o País, que têm até janeiro de 2008 para providenciar todas as garantias exigidas. Desse total, 496 simplesmente não se manifestaram e o restante apresentou dados inconsistentes.

            Agora, com a justificativa de manter o equilíbrio financeiro dessas mesmas operadoras, minimizando os riscos de "quebra", a partir de janeiro de 2008, a ANS passa a tratá-las como verdadeiras corporações financeiras. "O setor de saúde trabalha com a poupança da população", pondera Fausto Pereira dos Santos, diretor-presidente da ANS. E, assim como já é exigido das seguradoras especializadas em saúde, terão que apresentar um conjunto de ativos de garantia, que ficarão vinculados ao órgão regulador. Trata-se da RN 159, que estabelece quais serão os ativos "garantidores" e quais os critérios de sua vinculação ao órgão regulador, e da RN 160, que atualiza e amplia as exigências da norma anterior.

            Na revisão, foram introduzidos conceitos como Dependência Operacional, que visa evitar que as empresas "empurrem" adiante suas dívidas com a rede credenciada, a obrigatoriedade da constituição da Margem de Solvência, ou seja, o capital extra necessário para a proteção e sobrevivência da operadora em razão do volume de suas operações, e também a criação de uma Provisão para Eventos Ocorridos e Não Avisados (Peona), relativa às consultas e exames feitas em rede credenciada e que só dias depois são comunicados às empresas.

            O órgão também unificou o conceito de patrimônio mínimo e provisão de risco, estabelecendo agora o conceito de patrimônio mínimo ajustado (PMA), cujos valores máximos passaram de R$ 3,1 milhões para R$ 4,5 milhões.

            Essas novas medidas terão entre seis e dez anos para serem implementadas. E, de acordo com o presidente da ANS, caso não haja o cumprimento das normas, a agência vai analisar caso a caso, processo que caminhará para a decretação de um regime de direção fiscal. "É um período que ainda permite à empresa apresentar um plano de recuperação", explica Santos. Caso a conclusão seja de que a empresa não tem viabilidade, sua carteira poderá ser vendida ou leiloada. Mas ele ressalta que "a ANS não vai liquidar nenhuma empresa, muito menos por atacado."

Interclínicas

            A direção fiscal da ANS tem validade de seis meses, prorrogáveis por mais seis, e vem sendo aplicada para garantir os direitos dos beneficiários. Em São Paulo , o caso mais famoso foi a Interclínicas, que apresentou deficiências econômicas e acabou sendo vendida pelo governo. Um processo doloroso. Segundo o presidente da Abramge, dos cerca de 400 mil beneficiários da empresa, apenas 80 mil ficarão até o final do processo. "Exatamente as pessoas que mais precisam, idosos e pacientes crônicos, que não podem escolher outro plano por causa da carência", afirma Almeida.

            A ANS garante estar ciente das preocupações do setor. "Todo mundo acha bom garantia desde que não seja para si", afirma Santos. "Há seis anos, também tivemos muitas reclamações, mas hoje a maioria dos beneficiários do País estão em empresas que cumpriram os processos." Segundo ele, não é objetivo da ANS causar um efeito sistêmico no setor. "Mas precisamos de normas." Afinal, a regulamentação brasileira ainda não é tão rígida quanto a norte-americana, por exemplo, que trabalha com a lógica do seguro.

            Há quem discorde. Para Almeida, o processo de consolidação é inevitável e característica de épocas de regulamentação. "Nos Estados Unidos, quando houve a regulamentação do setor no governo Nixon, o mercado também reduziu. Mas há muita diferença", avalia. "Nossa legislação é muito mais rígida que a deles. O Brasil é o único país em que a agência reguladora de saúde não trabalha para o crescimento do setor."

            A lógica do mercado brasileiro, para Santos, defende que quanto menos empresas melhor – enquanto a lei americana preserva a companhia, que mantém direitos como aumentar os preços, diversificar o tipo de cobertura e até mesmo rescindir contrato. "No Brasil, o processo de rescisão só acontece após 60 dias sem pagamento e, nesse prazo, a empresa tem que continuar prestando serviço."

Prazo questionável

            O prazo de dez anos, porém, é considerado bastante razoável para resolver a questão financeira. Principalmente, num momento de expansão, crescimento e melhor rentabilidade do setor, destaca Santos. Essa impressão também não é compartilhada por outras lideranças do setor, que acreditam que no prazo estabelecido a grande maioria das empresas não conseguirá cumprir as normas. Exceto as capitalizadas, como a Medial Saúde, que abriu capital e lançou ações na Bolsa de Valores recentemente.

            Segundo Cassiano Leme, diretor de relações institucionais da Medial, a estrutura da empresa não só está preparada para atender as mudanças no tempo determinado, como já se enquadra em vários critérios. "Teremos que fazer algumas adaptações, como nosso patrimônio mínimo, que devido às aquisições terá que ser ajustado."

            Leme considera positivas as medidas e bem razoável o tempo de adaptação. No entanto, ele afirma que medidas podem fazer com que algumas operadoras decidam sair do mercado. "É uma tendência a longo prazo."