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O Brasil é o único país do mundo, que permite ao sujeito criar
uma escola – como uma padaria ou açougue – para ganhar dinheiro."
(Darcy Ribeiro)
Parece que começou na década de 60, quando os médicos resistiam a trabalhar por preço vil e um ministro de Estado teria dito “Providenciaremos a formação rápida e efetiva de tantos deles que, logo, todos virão de joelhos procurar trabalho a qualquer preço." Hoje estamos vendo que isto não ficou só na promessa.
A história nos revela que de 1808 a 1960, isto é, 152 anos, foram criadas 22 escolas médicas, ou seja, uma de cinco em cinco anos. Mas de 1961 a 1970, somente nove anos, aconteceu neste país uma "explosão" de novos cursos. Foram criadas outras 45 novas escolas médicas, ou seja, cinco por ano. Para se ter uma idéia do que foi essa avalanche, só no ano de 1968 foram criadas 13 escolas de medicina, mais de uma por mês. E a coisa não parou, pois, em 1980 o Brasil contava com 75 cursos de medicina, repercutindo num aumento significativo do número de profissionais formados por estas escolas.
E neste início do novo século, vemos com justificada preocupação a barreira da centena ser ultrapassada. O Brasil, agora com 157 escolas médicas, é o campeão isolado de todo o planeta. Mais algumas estão no “forno” para serem oficializadas, a curtíssimo prazo. Isto sem contar que muitas das já existentes aumentaram o número de vagas, usando de algumas estratégias, desde a divisão em turnos semestrais, em "campus" distintos, até do sistema de franchising. São exatamente 14.200 as vagas oferecidas anualmente, por estas escolas, para o primeiro ano dos cursos de medicina.
A LDB, de 20.12.96, bem como o Decreto n.° 2.306 de 19.08.97 proporcionaram condições extremamente liberais para que os Estados e Municípios pudessem decidir livremente sobre a criação de escolas de medicina e outras na área de saúde. A competência da União fixada no art. 10, inciso IX da LDB foi limitada exclusivamente ao sistema federal de ensino superior. Com isto, nestes quatro últimos anos assistimos a um verdadeiro "festival de escolas médicas".
O que fazer diante do aumento rápido e progressivo do número de médicos jovens, sem oportunidades de trabalho, concentrados nas grandes cidades, frustrados, engrossando cada vez mais as fileiras dos descontentes, desiludidos e mal remunerados?
Ao prefaciar o primeiro Documento do Ensino Médico, editado pela Associação Médica Brasileira em 1990, a professora Alice Reis Rosa já conclamava: "Somente sejam criadas escolas de Medicina em condições que lhes permitam promover adequada capacidade dos graduados. É este o primeiro dos procedimentos indispensáveis aos esforços de oferecer médicos competentes à sociedade."
É preciso, pois, que o governo tenha a coragem de tomar medidas necessárias e saneadoras que atinjam os objetivos desejados: não mais escolas, sim melhores escolas; não mais médicos, sim médicos devidamente formados e qualificados.
A implementação por Lei de requisitos mínimos para criação de novos cursos de medicina, como os propostos, um em 1990 e outro em 1999 pela Comissão de Ensino Médico da Associação Médica Brasileira, seria um passo fundamental e importante para a garantia da qualidade na formação do profissional médico.
Dr. Antonio Celso Nunes Nassif, Professor Adjunto e Livre Docente de Otorrinolaringologia da UFPR, ex-presidente da Associação Médica Brasileira e coordenador do site www.escolasmedicas.com.br