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Palocci alega que “‘importante é renovar a CPMF”

BRASÍLIA – Depois de se reunir ontem à noite com os líderes governistas, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, apoiou a proposta do relator da reforma tributária, Virgílio Guimarães (PT-MG), de desvincular os recursos da CPMF da Saúde, deixando claro que o objetivo do governo é garantir a arrecadação dos recursos. Apesar da forte reação da oposição e de governistas à medida, Palocci disse que só será mantida a vinculação com a Saúde se a CPMF continuar provisória:
– Digamos que o Congresso prorrogue apenas a CPMF. Aí, mantém como está a vinculação. Criado um novo imposto, porém, não tem vinculação. A CPMF é transitória. Já como CMF, não terá vinculação e será regulada por lei complementar – disse Palocci.
O ministro não escondeu o objetivo do governo:
– Para nós, não há problema em manter a vinculação. O importante é que a CPMF seja renovada.
A proposta de transformação da CPMF em CMF, porém, é do próprio governo.

Ministro da Saúde diz que é inaceitável

A desvinculação das receitas da CPMF do Fundo Nacional de Saúde e do Fundo de Combate à Pobreza foi criticada até pelo ministro da Saúde, Humberto Costa, que considerou a proposta inaceitável. O ex-ministro da Previdência Roberto Brant (PFL-MG) reagiu dizendo que a medida é descabida e que nunca imaginou que pudesse ser patrocinada pelo PT, sugerindo que o ministro da Saúde peça demissão. Pela proposta do relator, os recursos da contribuição, de cerca de R$ 20 bilhões anuais, ficariam vinculados apenas à Seguridade Social, o que, de acordo com os críticos, não garantiria o repasse mensal dos recursos para o Sistema Único de Saúde (SUS) e para o Fundo de Combate à Pobreza.
– Considero a proposta inaceitável e vou procurar o relator para saber o que motivou a desvinculação. Se todos têm que cumprir metas de aplicar recursos na Saúde, não faz sentido alterar as regras – reagiu o ministro da Saúde, por meio de sua assessoria de imprensa.
– O ministro da Saúde tem que pedir demissão, o PT perdeu a noção do limite – disse Brant.
Segundo o ex-ministro, ao longo dos últimos anos, a vinculação ao Fundo de Combate à Pobreza permitiu que os recursos gastos com a Bolsa-Escola passassem de R$ 100 milhões por ano para mais de R$ 1 bilhão. Ele enfatizou ainda que a medida compromete o fluxo contínuo dos recursos para a Saúde. Segundo Brant, a desvinculação das receitas para o SUS daria mais flexibilidade para o ajuste fiscal do governo.
– É um atentado desviar recursos de funções básicas do Estado para o ajuste fiscal – disse Brant.

Administrador hoje é um robô, diz Bittar

O relator do Orçamento de 2004, deputado Jorge Bittar (PT-RJ), defendeu o relatório e disse que o objetivo é dar margem de manobra para os administradores, que hoje enfrentam restrições para a gestão dos recursos, já que boa parte da receita que União, estados e municípios arrecada está vinculada.
– O administrador hoje parece um robô. A intenção é não amarrar todos os recursos da Saúde no SUS e flexibilizar para que o dinheiro possa ser usado em outros projetos como, por exemplo, a saúde da família. Mas esse não é um ponto de honra para o governo – disse Bittar.
Os dados do Sistema Integrado de Acompanhamento das Informações Financeiras (Siafi), do Ministério da Fazenda, mostram que, no primeiro semestre do ano, a única contribuição que teve seus recursos praticamente integrais repassados para a Saúde, a Seguridade e o Fundo de Pobreza foi a CPMF, o que pode não mais acontecer. Dos R$ 8,8 bilhões arrecadados, foram repassados R$ 8,3 bilhões.
Já os recursos da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), como não têm destinação específica dentro da seguridade, foram usados em grande parte para fazer o ajuste fiscal do governo. Dos R$ 8 bilhões arrecadados pela CSLL, deixaram de ser gastos no primeiro semestre R$ 3,7 bilhões. Já da Cofins foram para o ajuste fiscal, retidos no Tesouro, R$ 13,2 bilhões.
– Graças à emenda 29, pela qual o ex-ministro da Saúde José Serra lutou muito, os recursos para a Saúde não poderão diminuir em função dessa desvinculação, mas ela vai diminuir a garantia do fluxo de repasses e poderemos passar alguns meses sem pagar o SUS. É uma mudança de altíssimo risco para a Saúde – protestou o líder do PSDB, Jutahy Magalhães.
O deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ), da comissão especial da reforma tributária, lembra que a vinculação de recursos para a Saúde está na origem da CPMF.
– Esse governo está mostrando um viés anti-social ao desvincular algo que era a origem da CPMF. Essa vinculação garantia repasses automáticos para estados e municípios. Agora o sujeito vai ficar doente em julho e rezar para estar vivo até dezembro, quando recursos do Orçamento serão descontigenciados – criticou Paes.
O petista Carlito Merss (SC), também da comissão especial, disse acreditar que a CPMF deverá ser rediscutida ainda no governo Lula. Ele é um dos que insistem na tese de que o governo tem que caminhar para abrir mão da receita da CPMF e transformá-la em imposto apenas fiscalizatório, com alíquota muito mais baixa do que os 0,38%:
– A CPMF terá que ser toda rediscutida.

CPMF: provisório só no título

A história da CPMF é a de uma contribuição que, em nove anos, sempre manteve o título de provisório, embora sua natureza tenha ficado a cada ano mais permanente. O então chamado Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF) começou a ser cobrado no governo Itamar Franco, em 1994. Criado inicialmente como imposto sobre a movimentação bancária – daí o apelido de “imposto do cheque” – não tinha vinculação definida e entrava no bolo de repartição de receitas com estados e municípios.
Já no governo Fernando Henrique Cardoso, o IPMF foi transformado em contribuição (CPMF), um tipo de tributo cuja receita é centralizada na União, com alíquota inicial de 0,25% . A emenda da CPMF, quando tramitava no Congresso, era chamada de emenda Jatene, em referência ao então ministro da Saúde, Adib Jatene, que lutava pela destinação da receita da CPMF para a Saúde.
Em junho de 1999, já no segundo mandato de Fernando Henrique, a cobrança da CPMF foi renovada, desta vez com alíquota em 0,38%. Essa alíquota deveria valer por 12 meses e cair para 0,30% depois desse período.
Em 2000, foi aprovada mais uma prorrogação da CPMF, até dezembro deste ano. Para conseguir a aprovação, Fernando Henrique concordou com a vinculação dos 0,38% da seguinte forma: 0,20% para o SUS, 0,10% para a Seguridade Social e 0,08% para o Fundo da Pobreza.
De acordo com a última forma aprovada da CPMF, a alíquota da contribuição deveria ser reduzida para 0,08%. Ela teria o caráter de fiscalização, para ajudar a rastrear sonegação de impostos, com o cruzamento entre a declaração de renda e o volume de CPMF pago pelo contribuinte. Os cerca de R$ 2 bilhões que continuariam a ser arrecadados anualmente seriam destinados ao Fundo de Combate à Pobreza.

‘Boneco de Judas em Sábado de Aleluia

BRASÍLIA. Alvo de ataques de governadores, prefeitos e empresários, o “boneco de Judas em Sábado de Aleluia” – o relatório da reforma tributária, assim chamado pelo próprio relator, deputado Virgílio Guimarães (PT-MG) – nasceu de produção conjunta da assessoria do deputado com o secretário-executivo-adjunto do Ministério da Fazenda, Arno Agostin.

Sua redação foi decidida na quarta-feira, durante um encontro dos ministros da Fazenda, Antonio Palocci, e da Casa Civil, José Dirceu, com líderes aliados na casa do presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP). Lá, os líderes aliados se queixaram da falta de um texto sobre o qual discutir.

– Não dava mais para vermos aquelas entrevistas do Guimarães. Precisávamos de um relatório concreto sobre o qual trabalhar – contou um dos participantes do encontro.

Ficou acertado, então, que uma assessora de Guimarães se reuniria com Arno e sua equipe para a elaboração de um relatório. Originalmente, o texto seria apresentado aos líderes na sexta-feira. Como não foi concluído a tempo, chegou às mãos dos aliados às 11h de segunda-feira.

As impressões digitais do governo estão por todo o projeto, incluindo o formato do fundo de compensação da Lei Kandir, em desacordo com a proposta dos governadores. O modelo incluído no relatório foi apresentado por Palocci, por escrito, numa reunião de governadores. A reação foi tamanha que o ministro se espantou:

– Pensei que vocês fossem me aplaudir…- disse à época.

Meses depois, a proposta estava lá, no texto de Guimarães.

– Na Lei Kandir, esse era o limite do governo – explicou o vice-líder do governo, Paulo Bernardo (PT-PR).

Ontem, Guimarães colhia os frutos de um amargo trabalho.

– Se o empresariado achou um crime, os governadores choram e os prefeitos lamentam, então, é melhor nem ter reforma – ameaçou Professor Luizinho (PT-SP).