Embora o problema ainda não ocupe o espaço nobre no noticiário, como ocorreu com a crise do Instituto do Coração (Incor), o colapso dos hospitais beneficentes é iminente e suas conseqüências para a saúde pública serão amplas. Essa advertência, feita pelo presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes do Estado de São Paulo, José Reinaldo Nogueira de Oliveira Junior, em artigo publicado no Estado na quarta-feira, precisa ser seriamente considerada pelas autoridades federais da área da saúde, se quiserem debelar a tempo uma crise que certamente será muito mais grave e duradoura do que a do Incor.
Esta tem raízes complexas, mas entre seus principais componentes está um problema que afeta diretamente as instituições de caráter beneficente que prestam serviços de saúde à população: a falta de dinheiro. A diretoria do Incor, como lembrou Oliveira, reclama que os recursos repassados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) cobrem apenas 20% dos gastos com procedimentos de alta complexidade em pacientes da rede pública de saúde.
Com maior ou menor intensidade, os baixos valores pagos pelo SUS para os hospitais, combinados com os freqüentes atrasos na liberação dos recursos, afetam dramaticamente sua situação financeira, a ponto de ameaçar a preservação de suas atividades.
A situação chegou a um ponto insuportável para muitas Santas Casas e hospitais beneficentes em todo o País. São cerca de 2.100 instituições beneficentes, que realizam cerca de 150 milhões de atendimentos ambulatoriais por ano para a rede pública. Das internações hospitalares pelo SUS, cerca de 40% são feitas nesses hospitais. Em mais de metade dos municípios paulistas, as Santas Casas são a única alternativa de assistência médica para os pacientes do SUS.
Mas, de acordo com Nogueira de Oliveira, o que elas recebem cobre apenas 60% de seus custos. Em certos casos, fica muito abaixo desse porcentual. Por um parto normal, que custa
O problema da baixa remuneração afeta todas instituições que realizam atendimentos pelo SUS. A Federação Brasileira dos Hospitais (FBH) há tempos luta pela correção dos valores repassados pelo Ministério da Saúde, que ficaram congelados de
A Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (SBHH) calcula que, em média, os custos dos hemocentros do País são pelo menos 50% maiores do que os valores repassados pelo SUS. Uma instituição do interior de São Paulo gasta R$ 1 mil por coleta seletiva de plaqueta, mas recebe R$ 336,60 pelo procedimento.
Levantamento realizado pela Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT) junto a empresas associadas constatou a ocorrência de outro grave problema: o acúmulo de dívidas, que chegam a R$ 7 milhões em 130 centros, decorrente de atendimentos que não foram pagos pelo SUS. O Ministério da Saúde alegou que, embora tenham sido autorizados pelas Secretarias estaduais de Saúde, esses atendimentos excediam o teto fixado. “Mas, eticamente, hospitais e outras instituições que cuidam da população podem se recusar a realizar determinados procedimentos porque a cota fixada pelo governo se esgotou?”, perguntam dirigentes da ABCDT.
As instituições que podem estão tentando reduzir os atendimentos aos pacientes da rede pública, para não incorrer em maiores dificuldades financeiras. Algumas Santas Casas e hospitais beneficentes foram forçados a encerrar suas atividades. Outros vão acumulando dívidas com fornecedores, com a Previdência e com seus funcionários. Não podem fazer isso durante muito tempo.
Se não reajustar os valores pagos pelo SUS e não pagar em dia, o governo estará condenando as instituições beneficentes a fechar suas portas.