Empreender um diagnóstico da saúde brasileira é uma tarefa difícil diante das condições atuais e dos desafios da medicina. Porém necessária para aqueles que se ocupam em planejar novas alternativas. Um ponto de partida é observar o aumento do número de participantes no sistema público de alta complexidade. Esta tendência está ancorada na elevação crescente dos custos em função da tecnologia e do próprio envelhecimento da população.
O movimento é reforçado pelo estrangulamento progressivo dos planos de saúde individuais e da própria economia, o que acaba fazendo do Sistema Único de Saúde (SUS) a única alternativa viável ao cidadão. Em contrapartida, temos uma capacidade reduzida de desenvolvimento e incorporação tecnológica frente à necessidade de aprimorar a rede pública.
É urgente ir além da crítica. A superação das dificuldades exige a apresentação de idéias exeqüíveis para promover ajustes. Mas por onde começar uma mudança na saúde? Pela porta de entrada do sistema. As queixas sobre o tempo de espera por uma consulta, sobre a carência de equipamentos para exames e a falta de profissionais são tantas e tão constantes que deixam entrever a acomodação do sistema nesses moldes distorcidos. Isso não pode nem deve ocorrer.
É essencial investir firmemente na capacitação das Unidades Básicas de Saúde, para torná-las de fato a recepção dos usuários no sistema público, triando os casos para hospitais secundários e terciários. Assim, ganha-se em agilidade e diminui-se desperdícios.
Destinar recursos do SUS à compra de serviços da iniciativa privada e ser responsável pelo controle da qualidade é outra proposta. Não é inédita, mas que sofre resistência de alguns setores. Uma das mais importantes vantagens para o Estado em contratar serviços é a opção por uma visão processual, na qual a agilidade no atendimento é prioritária. Sob esta perspectiva, não existe a obrigatoriedade de manter ociosidades e contratos desnecessários. Quem investe zela pelo aproveitamento dos recursos e maximiza a sua utilização.
No que se refere aos médicos, a proposta é o pagamento por performance (PPP). É um recurso que se contrapõe à ação fragmentada e pontual. Especialistas com visão global do tratamento do paciente e praticantes de uma medicina baseada em evidências têm de ser mais bem remunerados. Isto é justificado pelo fato de que o médico que se envolve em uma alocação mais racional, medindo valor à sua prática, com menor necessidade de processos de auditoria, utiliza com equilíbrio a tecnologia e elimina parte do desperdício.
Por fim, não se pode esquecer de que um projeto consistente inclui aspectos de promoção social, prevenção, terapêutica e reabilitação. Prospectivamente, essa abordagem remete à destinação de recursos para suprir a continuidade do atendimento.
Saúde é uma política de Estado, não de governo e muito menos tema de manipulação partidária. Pensar a saúde da próxima década deve fazer parte da agenda nacional. Qualquer país minimamente comprometido com o desenvolvimento e a qualidade de vida não deixa de traçar planos e tomar iniciativas com os olhos nesse futuro próximo.
Claudio Lottenberg é presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein.