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A cada R$ 10 gastos com consultas e procedimentos médicos nos hospitais credenciados ao Sistema Único de Saúde (SUS), em média, somente R$ 6 são ressarcidos. O restante é arcado pelos próprios estabelecimentos. Essa diferença entre os custos e os valores repassados pelo SUS pode levar, a curto prazo, o sistema público de saúde do Paraná a um “apagão” e, com ele, a situações como as enfrentadas em alguns estados do Nordeste: em Alagoas, o governo chegou a decretar estado de emergência, e no Ceará uma greve de médicos colocou em colapso o sistema de atendimento.
A opinião é do presidente da Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços do Paraná (Fehospar), Arthur Leal Neto. Segundo ele, a maioria dos cerca de 5 mil estabelecimentos da área no estado, incluindo 500 hospitais, é dependente do SUS. “Podemos visualizar esse apagão na saúde, se não houver nenhum reajuste na tabela SUS”, enfatiza.
O dirigente lembra que o Paraná perdeu pelo menos 200 hospitais ou clínicas de porte desde a implantação do SUS, por causa da inviabilidade financeira, que continua a ameaçar dezenas de outros. “No mesmo período, não foram abertos nem 50 hospitais, ainda assim os direcionados para o sistema estatal nasceram sob administração do setor público e funcionam em condições de extrema dificuldade.”
Defasagem
O presidente da Fehospar calcula que a defasagem das tabelas do SUS se acentuou com a edição do Plano Real, em junho de 1994. Um indicativo disso, segundo Leal Neto, é que os reajustes do SUS chegaram a 37,30%, e a variação inflacionária (medida pela Fundação Getúlio Vargas) neste período foi de 418,10%
Arthur Leal Neto acha fundamental que se regulamente a Emenda Constitucional 29, que determina a aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, incluindo o valor procedente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.” Ele vê o anúncio do Ministério da Saúde de reajuste de 30% na tabela do SUS apenas como paliativo. “É inadiável uma rediscussão sobre o modelo de saúde brasileiro que, embora perfeito no aspecto conceitual, jamais terá o financiamento necessário para cumprir a sua eqüidade e universalidade com garantia de qualidade e amplo acesso”.
Prejuízos
Obrigados a arcar com os gastos que não são cobertos pelo SUS, muitos hospitais públicos estão afundados
Apesar de ser um problema histórico, a situação se agravou no hospital a partir de 2005, quando o SUS implantou a contratualização, instrumento que definiu metas relacionadas ao total de atendimentos e procedimentos que os hospitais devem atingir. “Se o hospital atender mais do que a meta estipulada, não recebe verba adicional, mas se atender um número menor do que o determinado, sofre desconto no repasse”, explica Orlei Negrello, diretor-administrativo do Pequeno Príncipe.
As metas foram estabelecidas a partir das médias históricas de atendimento dos hospitais. “O cálculo não levou em conta a sazonalidade das doenças e nem a instabilidade dos atendimentos de emergência. Um hospital trata vidas e não podemos dizer quando e quantas pessoas podem ficar doentes e passar mal”, diz Negrello.
Hospitais na “corda bamba”
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O diretor-geral da Aliança Saúde, sistema que administra a Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, Álvaro Luís Lopes Quintas, acredita que este é o momento de se promover uma discussão na sociedade sobre os reflexos da política do Sistema Único de Saúde.
“O próprio Ministério da Saúde encomendou um estudo, em 2002, que apontava uma defasagem de 90% na relação entre custos hospitalares e tabela do SUS. Esta realidade não mudou”, diz o médico.
Quintas explica que os recursos para manter o atendimento na Santa Casa vêm de outras fontes, principalmente da entidade mantenedora do hospital, a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), e do plano de saúde próprio. Além disso, o governo do estado faz um repasse mensal de R$ 100 mil para insumos. “Por enquanto, estamos garantindo o atendimento pelo SUS, mas precisamos de recursos para investimentos.”
A situação não é diferente no Hospital Evangélico, que disponibiliza 80% dos seus 508 leitos ao SUS. Para manter o equilíbrio financeiro mínimo, a saída tem sido apelar para a boa vontade dos fornecedores e contar com a extensão dos prazos de pagamento. “Não podemos restringir o atendimento. Temos feito também empréstimos bancários e nosso passivo está aumentando. Estamos trocando o pneu com o carro andando”, diz Constantino Miguel Neto, diretor-geral do hospital.
Para o Hospital Erasto Gaertner, centro de referência no tratamento do câncer, a facilidade no controle de metas é maior. Mesmo assim, os problemas com os valores repassados pelo SUS atingem a instituição. Em média, 90% dos leitos são para pacientes do SUS e os casos de câncer aumentam, em média, 4% ao ano. “O valor não cobre os procedimentos e, como trabalhamos com alta complexidade, precisamos investir em tecnologia, recorrer a financiamentos e empréstimos e atrasar fornecedores”, explica Flávio Daniel Tomasich, superintendente do hospital.
Solidariedade para crescer
Despertar a solidariedade tem sido a estratégia usada por alguns hospitais para crescer ou mesmo manter suas instalações em boas condições. O Pequeno Príncipe vai investir R$ 11,9 milhões para a ampliação de sua estrutura física, o que vai garantir o atendimento de outras 6 mil crianças até meados de 2008. Já captou 62,71% dos recursos para o projeto. O primeiro investidor foi o governo do estado, com a destinação de R$ 3 milhões. Com a adesão de 61 empresas e mais de 100 pessoas, foram captados R$ 4,4 milhões. O que faltar virá de empréstimo bancário.
O Erasto Gaertner conta com a simpatia do boneco “Wilson” para o sucesso da campanha de ampliação do espaço de atendimento. O boneco possui sementes de grama que, regadas, crescem sob forma de cabelos. A venda do boneco ajuda a angariar recursos. Wilson representa os pacientes tratados no hospital que, em muitos casos, perdem seus cabelos pela quimioterapia, mas recuperam o vigor depois da cura.
Já o grupo de voluntários do Hospital Evangélico coordena a “Campanha do Piso”. É necessária a troca do piso do andar térreo do hospital por um material mais resistente. O investimento previsto é de R$ 260 mil e já foram arrecadados R$ 80 mil. Para divulgar a campanha, os voluntários tentam convencer as pessoas, reconhecendo que a insituição “apela, mais uma vez, para a generosidade daqueles que reconhecem a importância do hospital junto à sociedade paranaense.”
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