A resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que autorizava a ortotanásia, possibilidade de suspender tratamentos que mantêm vivos artificialmente os pacientes sem cura e em estado terminal, foi derrubada por uma decisão judicial em caráter liminar, a pedido do Ministério Público Federal no Distrito Federal. O juiz Roberto Luis Luchi Demo, da 14.ª Vara da Justiça Federal no DF, entendeu que a conduta "parece caracterizar crime de homicídio", conforme consta em sua decisão. O CFM anunciou, por meio da assessoria de imprensa, que vai recorrer.
O juiz destacou ainda, em sua decisão, a dúvida sobre a competência do órgão para editar portarias a respeito da ortotanásia, por se tratar de tipo penal, no lugar do Legislativo brasileiro. Mas ele afirma que somente na sentença do processo poderá dizer se existe ou não conflito entre a resolução e o Código Penal. Com a decisão, a resolução deixa de valer em todo o país.
Diferentemente do que ocorre com a eutanásia – prática de abreviar a vida de um doente incurável de forma controlada com a ajuda de medicamentos -, a ortotanásia não causou grandes conflitos com os movimentos religiosos. Pelo contrário, a resolução do CFM, editada em novembro de 2006, foi elogiada até pela Igreja Católica. A briga, hoje, é muito mais de ordem jurídica do que de caráter ético.
Distorções
No texto da resolução do conselho médico está claro que a ortotanásia só será realizada se houver a concordância explícita do paciente ou dos familiares. No entanto, o procurador regional dos Direitos do Cidadão no DF, Wellington Marques de Oliveira, autor da ação que culminou na suspensão da norma, argumenta que é preciso levar em consideração também os aspectos psicológicos, sociais e econômicos.
Ele destaca ainda o custo do tratamento, a pressão dos planos de saúde e a disponibilidade de equipamentos e medicamentos na rede pública como fatores que podem interferir na decisão da ortotanásia. Oliveira sugere que a prática fique condicionada à avaliação de uma comissão multidisciplinar, formada por psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais e outras especialidades necessárias.
Além disso, o procurador chama atenção para o perigo da carência de recursos na saúde distorcer o conceito da ortotanásia. Ele diz, em suas justificativas na ação, temer que o caos atual da rede pública faça predominar o raciocínio de que vale mais investir os recursos disponíveis em pacientes que têm possibilidade de sobrevivência do que naqueles em estado terminal.