PONTA GROSSA – A superabundância e a carência pontual formam o cenário de contrastes na distribuição do atendimento médico no Paraná. Enquanto em Curitiba existe um médico em cada grupo de 221 moradores, nos 211 municípios paranaenses com menos de 10 mil habitantes a proporção é de um profissional para cada 4 mil pessoas – 18 vezes mais do que na capital. De acordo com os dados do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), em 89 cidades – o que representa uma em cada cinco do estado – não há sequer um médico residente. Moram nessas localidades 442 mil pessoas, que precisam recorrer ao atendimento em um município vizinho quando acontecem emergências e a unidade de saúde está fechada.
Apenas 36 municípios paranaenses atingem a recomendação da OMS. Nessas cidades mora metade da população do estado. Além da capital, estão na lista os grandes pólos regionais, como Londrina e Maringá, cidades de porte intermediário, como Pato Branco e Paranavaí, algumas cidades consideradas pequenas, como Realeza, Paranapoema e Miraselva. Quanto mais distante da capital, maior a probabilidade de a cidade ter uma proporção baixa de médico por morador. O paradoxo é que as cidades da região metropolitana de Curitiba também têm poucos médicos residentes. É que, com a proximidade, eles acabam preferindo morar na capital.
Os números evidenciam que a disparidade é o problema. Entre os 1,8 mil moradores de Esperança Nova, que fica na Costa Oeste, não há nenhum médico. Dois profissionais prestam atendimento no único posto da cidade. Eles moram e trabalham também em municípios vizinhos. Das 5 da tarde às 8 da manhã e nos finais de semana, se alguém enfartar ou sofrer um acidente receberá os primeiros socorros de outro profissional de saúde e será levado pelo motorista de plantão ao hospital de São Jorge, Pérola ou Umuarama. Três anos depois do primeiro levantamento feito pelo jornal, a situação é a mesma na cidade.
O presidente do CRM-PR e professor de Clínica Médica no curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná, Miguel Ibraim Abboud Hanna Sobrinho, admite que a má distribuição só se agrava. Segundo ele, entre os fatores decisivos na fixação do médico estão qualidade de vida, condições de trabalho e oportunidade de atualização profissional. Ele acrescenta que, por exemplo, a presença de uma boa escola para os filhos pode ser determinante. Preocupações com o bem-estar da família e com as opções de lazer norteiam a decisão.
A certeza de que contará com recursos adicionais mínimos, como exames, também pesa na escolha. Como cidades menores geralmente têm condições menos interessantes de trabalho, muitas vezes o profissional recém-formado prefere ficar em um grande centro, mesmo ganhando menos que no interior. Além da possibilidade de não atender bem o paciente, o receio de processos judiciais também afugenta muitos médicos das condições precárias geralmente encontradas no interior.
Ibraim reconhece que quem mais sofre com a má distribuição do atendimento médico é a população. Sem a certeza de que há um médico por perto, os moradores ficam mais vulneráveis. Ele comenta que as ofertas de salários altos apresentadas para atrair médicos a cidades pequenas nem sempre são suficientes. “Não é apenas a questão da remuneração. É um atrativo, mas, normalmente, quando se oferece um salário muito acima da média é porque as condições não são adequadas”, reforça.