O Ministério da Saúde decidiu bancar tratamentos alternativos no SUS (Sistema Único de Saúde), alguns sem comprovação científica. Portaria publicada no "Diário Oficial" da União da última quinta autoriza, reconhece o valor terapêutico e incentiva as unidades de saúde a adotarem terapias como a acupuntura, a homeopatia, a fitoterapia e o termalismo.
Hoje, 19 capitais e 232 municípios do país já adotam uma ou mais dessas práticas. Com a criação de uma política nacional para esse fim, a idéia é ampliá-las e uniformizá-las em todo o país.
Para isso, o ministério pretende destinar mais recursos às unidades de saúde, capacitar as equipes e incentivar a fabricação de fitoterápicos (à base de plantas) por laboratórios oficiais e não-oficiais.
Um ponto polêmico do projeto é o fato de ele autorizar que outros profissionais da saúde, não-médicos, prescrevam ou realizem o tratamento. Tanto o CFM (Conselho Federal de Medicina) como a Federação Nacional dos Médicos consideram essa decisão "absurda" e acreditam que ela só visa o "barateamento" da medicina no sistema público de saúde.
Na opinião de Heder Murari Borba, presidente da federação médica, é "grave" o fato de o Ministério da Saúde apresentar uma política pública que permite a prática da acupuntura e da homeopatia, por exemplo, por não-médicos. “É fazer uma medicina pobre para os pobres.”
O médico Roberto D’Ávila, corregedor do conselho de medicina, endossa as declarações de Borba e diz que a questão não é de reserva de mercado. "É a saúde da população mais pobre que está em jogo. Quem tem mais recursos certamente procura um médico para fazer esses procedimentos. É a oficialização da baixa qualidade à assistência", afirma.
Para ele, a adoção do tratamento com águas termais no SUS é "coisa de maluco". "Não conheço nenhum estudo científico sério que respalde essa técnica. Não dá para entender como isso foi aprovado pelo ministério."
De acordo com o farmacêutico Francisco Batista Júnior, membro do Conselho Nacional de Saúde (CNS) -órgão que foi responsável pela aprovação do projeto-, o termalismo é um tratamento de saúde antigo. "Pode não ser uma ciência exata, baseada em evidências científicas, mas tem seu valor histórico", disse ele.
Mais opções terapêuticas
O Ministério da Saúde afirma que a elaboração da nova política foi democrática e aprovada pelo CNS após amplo diálogo com a comunidade médica e científica.
Segundo Manoel dos Santos, diretor de assuntos farmacêuticos do ministério, a política foi discutida "à exaustão" no Conselho Nacional de Saúde antes de ser aprovada. Roberto D’Ávila, do CFM, que participou de parte das discussões, diz que os médicos alertaram para os problemas da portaria, mas foram voto vencido.
Santos diz que, para 2007, o ministério deve prever no orçamento recursos para a implementação da política em âmbito nacional. Ainda não há previsão de valores.
Neste ano, segundo ele, municípios que queiram adotar os tratamentos alternativos na sua rede de saúde podem receber verbas extras, desde que preenchidos os requisitos exigidos pela pasta.
Segundo ele, o objetivo do ministério é ampliar as opções terapêuticas aos usuários do SUS com segurança e eficácia.
Leia a íntegra da portaria na página www.in.gov.br/materias/xml/ do/secao1/2117398.xml
Entidades pedem exclusividade para médicos
DA REPORTAGEM LOCAL
O presidente do CMA (Colégio Médico de Acupuntura), Rui Tanigawa, defende que o programa do Ministério da Saúde que prevê as terapias alternativas passe por uma regulamentação que garanta que a acupuntura seja exercida somente por médicos.
Para Tanigawa, é um risco à saúde pública o ministério permitir que qualquer profissional da saúde seja um acupunturista.
"É preciso considerar que a acupuntura é um procedimento terapêutico invasivo, pode provocar riscos à vida do paciente. Deve, portanto, ser exercida por profissionais com o devido treinamento e competência para diagnosticar doenças e tratar pacientes -ou seja, médicos", afirma.
Segundo Francisco Batista Júnior, do Conselho Nacional de Saúde, essa questão não será modificada. "Estamos convencidos de que o exercício da acupuntura não é um ato exclusivo do médico. Isso é definitivo", afirmou.
Segundo ele, o projeto deve ser regulamentado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) sem mudança no seu conteúdo. "Não estamos infringindo nenhuma legislação."
Para Batista Júnior, o grande ganho da nova política é que, com a regulamentação, os serviços poderão ser fiscalizados.