O governo federal estuda a edição de uma Medida Provisória liberando recursos para o Instituto do Coração – Incor, de São Paulo, que atravessa a pior crise financeira de sua história. O deputado gaúcho Darcísio Perondi, do PMDB, disse que não basta salvar o Incor. Tem que salvar também centenas de hospitais em todo o país, promovendo o reajuste da tabela do Sistema Único de Saúde – SUS. Hoje, o governo só paga a metade dos custos dos procedimentos. Perondi cita um relatório do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgado em outubro, que apontou o fechamento de 255 hospitais no ano passado. Segundo Perondi, centenas de hospitais, principalmente filantrópicos, devem fechar suas portas até o final deste ano. O deputado Darcísio Perondi informou que nesta quarta-feira (22), em Brasília, a Frente Parlamentar da Saúde vai debater a crise dos hospitais com representantes de diversas entidades ligadas ao setor. O objetivo é incentivar deputados e senadores e fazerem pronunciamentos sobre a crise e a apresentarem emendas para custeio hospitalar ao Orçamento, ao invés de obras e investimentos. Perondi alerta sobre o início de um grande movimento nacional em defesa da saúde. Segundo o parlamentar, o orçamento da saúde para 2007 é insuficiente para conter a crise.
Deputado, a crise dos hospitais ganhou maior visibilidade com o problema do Incor?
Deputado Perondi – A crise do Incor é gravíssima. Mas é só a ponta do iceberg. Esse caso é só uma gripe perto da pneumonia por que passa o setor de saúde no Brasil. O Incor atende a população do país inteiro, inclusive muitos de nós, parlamentares e políticos. Mas essa crise não terá solução com R$ 20 milhões que o governo quer dar. É muito maior que isso. Se o governo der esse dinheiro para o Incor, tem que dar o equivalente a todos os hospitais que estão na iminência de fechar. Não basta salvar o Incor, tem que salvar todos os outros também.
Existe um levantamento do IBGE sobre a crise hospitalar?
Deputado Perondi – Sim. Segundo um estudo divulgado em outubro pelo IBGE, 255 hospitais fecharam suas portas no ano passado em todo o país. Fico imaginando quantas pessoas morreram por falta de atendimento. Para o gestor público, pode morrer um ou um milhão. Mas para uma mulher que perde um filho ou para um irmão que perde um ente querido, é um fato grave, é uma vida que se perde.
E este ano deputado, existe algum número sobre o fechamento de hospitais?
Deputado Perondi – Sou vice-presidente da Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos e tenho informações que me deixam muito preocupado. A previsão é de que mais de 300 hospitais fechem as portas este ano. Essa informação ainda não é oficial, mas preocupa.
Por que esses hospitais estão fechando?
Deputado Perondi – Por absoluta falta de recursos. Não adianta o governo salvar o Incor, só porque ele atende a nós políticos. Tem que salvar as Santas Casas de Fortaleza (CE), de
Anápolis (GO) e de Belo Horizonte (MG), que podem fechar; a Santa Casa de Manaus (AM), que já fechou; e os hospitais de Viamão, Montenegro, Santo Ângelo, São Luiz Gonzaga, Cruz Alta, Ciríaco, no meu Estado. Eu poderia citar pelo menos 30 hospitais que estão na iminência de fechar no Rio Grande do Sul. Afinal, de cada R$ 100 gastos pelos hospitais, apenas R$ 50 são efetivamente pagos pelo SUS. Os outros R$ 50, o hospital tem que arcar sozinho. Sofre o hospital, que trabalha no vermelho; sofre o funcionário, que tem seu salário pago com atraso de até 90 dias; sofre o doente, que vê a extinção de serviços e o péssimo atendimento; e sofre a família, que vê seus entes queridos morrerem.
O que pode ser feito?
Deputado Perondi – Nós, deputados, médicos, provedores e conselheiros municipais de saúde, não podemos perder a capacidade de nos indignar e buscar forças lá no fundo do coração e da alma. A crise é muito grave e os governos federal e estaduais não estão enxergando. Poucos governadores e prefeitos estão enxergando a dimensão da crise, que é mais grave do que vem sendo mostrada. É preciso que haja um levante nacional em todos os cantos do Brasil onde haja crise. É urgente. Este é o momento, porque o orçamento da saúde do governo federal está em discussão em Brasília. Os orçamentos estaduais e municipais também estão sendo debatidos nas Assembléias Legislativas e nas Câmaras de Vereadores. Temos que melhorar o orçamento da saúde e a tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde – SUS. O governo só paga a metade dos custos dos hospitais. Por isso, começaram a fechar de forma crescente. A saída é um reajuste imediato da tabela do SUS. Se existe dinheiro para fazer prédios bonitos na área pública, para construir pontes, inclusive em outros países, e para conceder altos reajustes salariais para categorias distintas, não pode faltar dinheiro para a saúde.
O governo federal é o único responsável?
Deputado Perondi – O governo federal tem que conceder o reajuste da tabela do SUS, mas os governos estaduais têm que complementar e os municipais ajudar também. De acordo com a Constituição, no seu Artigo 30, são as prefeituras as grandes responsáveis pela gestão da saúde.
Mas não basta corrigir a tabela do SUS. O que mais é preciso?
Deputado Perondi – Existem muitos hospitais que possuem passivos fiscais e previdenciários. Essas entidades precisam renegociar suas dívidas. Estamos lutando para que o governo dê mais prazo para que esses hospitais paguem suas dívidas. Como o hospital só recebe metade dos custos dos procedimentos, não consegue pagar seus funcionários e fornecedores, além de impostos. Com isso, é obrigado a buscar empréstimos bancários e a se endividar. Vira uma bola de neve, que a cada dia aumenta mais de volume. Essa bola de neve está matando crianças e idosos em todo o país. O Incor e a Santa Casa de Viamão são exemplos.
Como é a administração de um hospital, é igual a de uma empresa?
Deputado Perondi – É quase igual. Precisa de uma boa gestão, de controle dos gastos, de pagamento de impostos e funcionários, como qualquer empresa. A diferença é que o hospital funciona 24 horas por dia e não podem faltar profissionais, materiais hospitalares e medicamentos. Uma empresa pode reduzir a compra de material por conta da redução da demanda. Um hospital não. Nada pode faltar para atender o doente que a todo instante bate à porta de um hospital.
E como está o Orçamento da Saúde para 2007?
Deputado Perondi – É triste. Infelizmente o governo federal não colocou nenhum dinheiro para o reajuste da tabela do SUS. Isso merece uma grande mobilização nacional de todas as entidades da saúde, inclusive de médicos e funcionários. Agora é o momento de brigar, justamente quando estão sendo discutidos os orçamentos federal, estaduais e municipais. A proposta orçamentária para 2007 encaminhada pelo governo ao Congresso Nacional é ruim, insuficiente para conter a crise. O governo, mais uma vez, deixa de cumprir a Constituição. Deveria destinar R$ 44,1 bilhões para a saúde. No entanto, a proposta orçamentária só prevê R$ 42,4 bilhões. Ou seja, falta R$ 1,7 bilhão para alcançar o piso. Além disso, o governo está destinando para ambulatório e internação, a chamada média e alta complexidade, R$ 300 milhões a menos que no orçamento de 2006. Vamos ter que brigar muito na Comissão de Orçamento. Os parlamentares não podem colocar Emendas somente em investimento, mas também no custeio.
Como se daria essa mobilização?
Deputado Perondi – Na próxima quarta-feira (22), às 8 horas, a Frente Parlamentar da Saúde vai reunir seus membros e representantes das diversas entidades que representam o setor, para discutir a crise hospitalar. Vamos reeditar o Fórum Nacional de Saúde, criado em dezembro do ano passado para evitar o desvio de recursos da saúde para o programa Bolsa Família, prática que vinha sendo promovida insistentemente pelo Palácio do Planalto. Naquela época vencemos a briga e conseguimos evitar o desvio de R$ 2,1 bilhões. Existia um compromisso do Ministério da Saúde de que esse dinheiro fosse todo utilizado no reajuste da tabela do SUS. Infelizmente, o compromisso não foi cumprido. Vamos incentivar deputados e senadores a fazerem pronunciamentos sobre a crise e a apresentarem menos Emendas Parlamentares ao Orçamento para obras e equipamentos, e mais Emendas para custeio hospitalar. Também pretendemos promover uma grande rebelião pacífica nacional, mobilizando a sociedade. Temos menos de 60 dias para melhorar o Orçamento da Saúde.
O governo quer acabar com a vinculação obrigatória de recursos para a saúde?
Deputado Perondi – Sim. A vinculação de recursos para a saúde foi o maior avanço obtido pelo movimento da saúde em 2000. Uma Emenda à Constituição, da qual fui um dos relatores, estabeleceu um valor mínimo de recursos para a saúde. Esse piso aumenta todo ano, tanto a nível federal, quanto estadual ou municipal. Nenhum gestor pode gastar menos que no ano anterior. Mas o governo quer fazer um agrado aos governadores, prefeitos e investidores em nome da vida e isso não dá para aceitar. A gastança pública não passa pela saúde. Aí falta.