Um grupo de 412 médicos da extinta Fundação Hospitalar do Distrito Federal deverá receber cerca de R$ 415 milhões do governo distrital como pagamento de um precatório referente a dívidas trabalhistas de 20 anos. O governador Joaquim Roriz (PMDB) assinou ontem um convênio com o Tribunal Regional do Trabalho da 10.ª Região (TRT) comprometendo-se a pagar o título que representa 60% da dívida judicial do GDF, próxima de R$ 700 milhões.
O Sindicato dos Médicos do DF (Sindmédico-DF) vai discutir com os credores a proposta para o pagamento do débito, cujos detalhes não foram divulgados pelo GDF. O grupo havia ajuizado a ação em 1986, quando aumento de 80% nos salários e acréscimo de 12 referências foram dados aos servidores do GDF, mas não aos médicos do quadro da Fundação Hospitalar. A decisão definitiva só foi proferida pela Justiça em 1994, quando foi expedido o precatório. Mas somente agora, 12 anos depois, o governo se dispôs a quitar a dívida. "Considero a medida muito justa. Junto com o Valdivino (Oliveira, secretário de Fazenda), levei o meu apoio aos médicos até o governador", avalia o secretário de Saúde do DF, José Geraldo Maciel.
Quando a Fundação Hospitalar foi extinta por um decreto em 2000, seus quadros foram absorvidos pela Secretaria de Saúde. Para o Sindmédico, o valor do precatório deveria ser de aproximadamente R$ 553 milhões. A divergência entre os valores se deve aos critérios de incidência de juros e correção monetária. O TRT e a Procuradoria-Geral do DF adotaram diferentes índices para o período a partir de agosto de 1990, quando os médicos deixaram de ser celetistas e se tornaram estatutários. "Mas não queremos criar polêmica com isso. O convênio já é um grande passo. Agora, vamos negociar para chegarmos a um valor razoável", afirma o presidente do sindicato, César Galvão. A maioria dos 412 médicos já está com mais de 60 anos, alguns já faleceram e cerca de 40% cederam parcial ou totalmente os direitos sobre o precatório.
O juiz de conciliação de precatórios do TRT, Rogério Pinheiro, acredita que haverá boa vontade das duas partes para solucionar o problema. Segundo Pinheiro, o governo está propondo um sinal imediato de R$ 50 milhões e a quitação do restante em 10 parcelas semestrais. "É importante que se resolva a questão, pois enquanto esse precatório não for pago, nenhum outro pode ser quitado", explica. Ele vai se reunir hoje com os médicos e o sindicato para apresentar a proposta e iniciar a marcação das audiências de conciliação. Aposentado desde 1995, o médico Fernando de Castro, de 68 anos, está esperançoso. "Agora parece que é verdade que vão pagar. Vamos ver o que o governo tem a oferecer", diz.
O precatório é um documento da Justiça que reconhece uma dívida do governo municipal, estadual ou federal em favor de uma pessoa ou empresa. Ele é emitido após a decisão judicial definitiva, da qual o governo não pode recorrer. O pagamento depende de previsão orçamentária e se dá de acordo com a ordem cronológica em que os precatórios são expedidos, como determina o artigo 100 da Constituição Federal.
Quitação suspensa
Durante o governo de Cristóvam Buarque (1995-1998), o pagamento do passivo trabalhista do GDF foi suspenso. Entre 1994 e 1997, o DF acumulou uma dívida de mais de R$ 1 bilhão. Desde então, uma série de decretos e leis foram criados para regulamentar a questão. Já em 1999, o governo destinou R$ 400 milhões do orçamento para a quitação das dívidas judiciais. No ano seguinte, a reforma administrativa promoveu a extinção das fundações distritais, e as listas de precatórios dessas entidades foram incorporadas à do GDF. A lista única foi questionada por sindicatos de servidores do governo distrital, e o Tribunal de Justiça do DF acabou concedendo uma liminar impedindo os pagamentos até a solução da polêmica. Em 2003, o GDF se comprometeu a repassar R$ 1,5 milhão mensais para o pagamento de precatórios de pequeno valor (até 10 salários mínimos). Com a quitação da dívida com os médicos, o GDF ainda terá que pagar 521 precatórios envolvendo cerca de 20 mil pessoas.