Nem só as reformas preocupam os líderes do governo no Congresso. Desde a semana passada, eles são procurados pelos ministros, em especial daqueles de quem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mais cobra resultados, ansiosos pela votação de uma penca de créditos suplementares que, se não for aprovada nos próximos dias, parte da administração pública pára. O ministro da Saúde, Humberto Costa, é um dos mais preocupados. Ele precisa aprovar créditos que somam quase R$ 400 milhões. Os técnicos da Saúde avisaram na sexta-feira aos integrantes da Comissão Mista de Orçamento que estão ”no limite do limite”: ou a comissão vota as propostas, ou o governo terá que paralisar alguns programas e adiar outros.
Do total de créditos da Saúde, R$ 146,6 milhões serão destinados ao pagamento de cursos de profissionalização em enfermagem, o Profae. Outros R$ 64 milhões servirão para quitar obras que já foram executadas dentro do Sistema Único de Saúde (SUS). Esses são considerados os mais urgentes, porque, se não forem votados logo, os programas param por falta de verbas. ”Já fomos avisados, o processo na comissão está muito lento e o governo corre o risco de ficar prejudicado”, diz o deputado Renato Casagrande (PSB-ES), representante do partido na comissão.
Empacados
A Saúde, por exemplo, espera por esses créditos desde o final de abril, quando enviou os pedidos ao Ministério do Planejamento. No Congresso, os projetos estão empacados há quase dois meses, por um único motivo: retiram recursos das emendas de deputados e senadores. A Saúde agora tentará rever os cortes de 27% nos pedidos dos deputados e senadores para ver se consegue aprovar a proposta esta semana. ”Os créditos são urgentes, mas estamos com um problema porque os deputados e senadores não aceitam cortes de suas emendas e, assim fica difícil fechar um acordo para votá-los. O caso do Ministério da Pesca é tão urgente quanto o da Saúde”, comenta o deputado Carlito Mers (PT-SC), um dos representantes do governo na Comissão Mista de Orçamento.
O Ministério da Saúde não é o único a sofrer com a falta de acordo na Comissão e pelo corte das emendas dos políticos. A Secretaria Especial da Pesca precisa de recursos para a administração normal e garantir assento em organismos internacionais. O Ministério das Cidades, dizem seus técnicos, está com a ”corda no pescoço”. Especialmente, na área de saneamento básico e habitação, em obras que vêm sendo sistematicamente cobradas pelo presidente Lula. Por isso, precisa dos R$ 24,7 milhões (leia quadro), tirados das provisões que os parlamentares haviam feito para suas bases eleitorais.
A oposição reclama. ”Os cortes são drásticos. Em certas situações predatórios. É um procedimento antidemocrático cortar os pedidos dos parlamentares para que os ministros possam aplicar onde quiserem”, comentou o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE). Mas, no caso do Ministério das Cidades, a choradeira dos deputados e senadores não foi suficiente para sensibilizar o governo a rever todos os cortes nas propostas de deputados e senadores ao Orçamento de 2003. ”Os parlamentares terão que entender que, por serem obras novas, não há jeito. O governo não pode parar projetos que estão em andamento e precisam ser concluídos para começar obras novas propostas pelos deputados”, afirmou o relator do Orçamento da União para 2004, deputado Jorge Bittar (PT-RJ)
O Ministério dos Transportes ainda não conseguiu levar os políticos a aceitar esse argumento. Por isso, o crédito de R$ 1 bilhão continua empacado na Comissão Mista. Deste total, R$ 1,6 milhão destinam-se à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que precisa dos recursos para poder fiscalizar o transporte interestadual de passageiros. Mas o principal problema do Ministério dos Transportes será a falta de recursos para a construção de novos trechos de estradas – propostas por bancadas estaduais e regionais. Esse dinheiro será todo aplicado na restauração e conservação de rodovias – R$ 407 milhões.
A briga promete ser grande. O presidente da Comissão Mista de Orçamento, senador Gilberto Mestrinho (PMDB-AM), espera fechar um acordo ainda esta semana para votar as propostas. ”A função do Parlamento é a elaboração do Orçamento e a fiscalização de sua execução. Se o parlamentar não consegue fazer valer suas propostas ao Orçamento, perde sua principal função. Vamos ouvir os técnicos do governo para tentar chegar a um acordo”, comenta. Mas o governo resiste: ”As emendas nunca foram executadas globalmente. A diferença é que o nosso governo trata do Orçamento de forma transparente e não podemos começar obras novas sem terminar as antigas”, diz o deputado Maurício Rands (PT-PE), conterrâneo do ministro da Saúde, Humberto Costa.
É um procedimento antidemocrático cortar os pedidos dos parlamentares para que os ministros possam aplicar onde quiserem
Senador Sérgio Guerra (PSDB-PE)
O governo não pode parar projetos em andamento para começar obras novas propostas pelos deputados
Deputado Jorge Bittar (PT-RJ), relator do Orçamento da União para 2004
Se o parlamentar não consegue fazer valer suas propostas ao Orçamento, perde sua principal função
Senador Gilberto Mestrinho (PMDB-AM),presidente da Comissão Mista de Orçamento
Programas e serviços que podem parar
MINISTÉRIO DAS CIDADES
Conclusão de obras de saneamento básico
R$ 6,9 milhões
Melhoria das condições de habitabilidade
R$ 9,7 milhões
Ampliação ou melhoria da infra-estrutura urbana
R$ 15,8 milhões
MINISTÉRIO DO TURISMO
Valorização do servidor público para assistência médica, pré-escola, auxílio-transporte e outros programas voltados para a administração do ministério.
R$ 7 milhões
MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES
Dragagem emergencial em portos
R$ 20 milhões
Construção de acessos rodoviários no corredor do Mercosul
(BR 101, SC), acesso a Joinville e construção de pontes do corredor do Mercosul
R$ 8 milhões
Conservação e restauração de rodovias
R$ 407 milhões
MINISTÉRIO DA SAÚDE
Qualidade e eficiência do Sistema Único de Saúde – engloba implantação da rede serviços e modernização da rede (pagamento de obras já realizadas)
R$ 64 milhões
Profissionalização da enfermagem – 236 escolas públicas em todo o país que dão cursos de enfermagem e aperfeiçoamento de pessoal podem parar por falta de recursos
R$ 146,6 milhões