No artigo “A coragem de cobrar caro”, edição 1.979 da revista Veja, Stephen Kanitz defende a tese de que tudo que é cobrado, e bem cobrado, é mais valorizado; já o que é de graça, não o é. Tem razão. O articulista, porém, não foi feliz ao sugerir a cobrança pelos já caríssimos serviços públicos. É um grande erro pensar que o atendimento prestado pelos hospitais, escolas e polícias, entre outros serviços essenciais, não é cobrado. É sim e muito bem. Se os serviços são ruins não é por uma questão de preço, mas por outros motivos. Lembremos que a União, os estados e os municípios arrecadam volumes imensos em recursos para financiá-los. Se nossa carga tributária está em torno de 40% do PIB, significa que o setor público retém esse montante do que cada cidadão produz ou ganha.
Muitos brasileiros, para escapar da má qualidade dos serviços públicos, terminam arcando com uma carga tributária ainda mais pesada, assumindo despesas com educação, segurança, plano hospitalar particular, etc. Pagam duas vezes pela mesma categoria de serviço.
O nó da questão, portanto, não reside no custo dos serviços, mas em contradições, políticas e culturas cujos princípios e posturas precisam ser revistos. As falhas estão no planejamento, na destinação dos recursos e no controle dos gastos. Faltam ética e transparência. Antes, porém, é fundamental delimitar as fronteiras entre público e privado. As coisas estão ficando confusas. Afinal, se uma entidade arranca bilhões dos contribuintes e esses não têm direito a nenhum retorno que conte, qual é o papel dessa entidade?
A intenção primeira de Kanitz, todavia, foi chamar a atenção para uma questão que mexe com profissionais das mais diversas atividades. Ele falava do preço dos serviços profissionais, defendendo que basta ser bom e cobrar caro para se conquistar valorização. Não é tão simples assim.
Os contabilistas, por exemplo, há muito vêm debatendo, em todo o País, quanto devem cobrar pelos seus serviços. Tabelas são elaboradas pelos sindicatos, mas são meros parâmetros. O fundamental é que os profissionais se valorizem, levando em conta sua formação, seus recursos, a relevância, o risco, a complexidade e as responsabilidades envolvidas nos serviços. Investir em tecnologia, qualificação e atualização é um conceito difundido na classe. Mas lamentavelmente há profissionais marginalizados desse processo que puxam os preços para baixo, fingindo fazer boa contabilidade, desvalorizando toda a classe. A concorrência é saudável, mas quando parte de agentes medíocres, tende a nivelar a profissão por baixo, restando apenas confiar que o mercado corrija os equívocos.
Ao exigir que os profissionais façam contabilidade como mandam os princípios da ciência contábil, a fiscalização dos conselhos está justificada pelo ângulo da valorização profissional. Hoje, além do registro e da fiscalização, os CRCs estão atuando forte no incentivo à atualização permanente. É uma forma de fiscalização indireta. Os CRCs não podem nem devem assumir papel de escola, mas em parceria com os sindicatos e instituições de ensino, oferecem cursos, palestras, seminários, ciclos de estudo. O CRCPR mesmo está desenvolvendo um amplo projeto de cursos técnicos que atingem todo o Paraná.
Se cada profissional procurar fazer sempre o melhor, com o máximo empenho e qualidade, o mercado cuidará de expurgar aqueles que desmerecem a profissão, cobrando barato, porém, deixando de prestar um bom serviço. Assinalemos finalmente que a contabilidade vem confirmando cada vez mais a sua importância social e os contabilistas assumindo crescente consciência do seu valor.
Maurício Fernando Cunha Smijtink é contador, empresário da contabilidade e presidente do CRCPR.