A Constituição Federal promulgada em 1988 declara que a saúde é um direito de todos e uma obrigação do Estado. Mas para que estes preceitos sejam cumpridos cidadãos brasileiros estão sendo obrigados a entrar com ações na Justiça. Um dos caminhos é o Ministério Público (MP). O promotor de Defesa da Saúde Pública e Garantias Constitucionais, Paulo Tavares, defende que a judicialização é importante, mas ressalta que é importante priorizar outros caminhos, como a pressão popular.
Um exemplo foi a luta recente de portadores de glaucoma, que fizeram protestos na frente da 17ªRegional de Saúde para forçar o Governo do Estado a bancar os medicamentos excepcionais ou de alto custo. A experiência foi apresentada pelo promotor no 4º Congresso Nacional do Ministério Público da Área da Saúde, realizado em setembro em Fortaleza (CE). A conseqüência imediata da mobilização foi o compromisso do poder público de avaliar cada pedido de fornecimento de alto custo individualmente.
‘‘O Ministério Público se preocupa não apenas com a judicialização, mas com a mobilização da comunidade. Este também é seu papel, fazer com que os pacientes se mobilizem, tenham consciência dos seus direitos. O Ministério Público não pode ser encarado como a última solução para os problemas da população’’, ressalta.
Os grupos formados com apoio do MP passaram a fazer manifestações para pressionar a Secretaria Estadual de Saúde, que aceitou avaliar, através de câmaras técnicas, caso por caso, para definir se o medicamento será fornecido. Estes processos agora estão em andamento.
A diminuição dos processos, acredita ele, é fruto da organização popular e também da intensificação, nos últimos dois anos, da postura de exigir dos médicos do Sistema Único de Saúde (SUS) que demonstrem, através de textos científicos, a eficácia dos medicamentos prescritos.
As listagens de medicamentos são elaboradas de acordo com os protocolos do SUS. ‘‘Concordo que vários protocolos estão defasados e não estão incorporando medicamentos que já estão sendo comercializados e já foram aprovados pela Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária). Não está havendo a incorporação na rapidez necessária’’, avalia.
Há dois anos uma médica passou a integrar a equipe da Promotoria da Defesa da Saúde Pública há dois anos. O objetivo é fornecer embasamento técnico para a análise dos casos de solicitação de medicamentos, entre outros, que chegam ao Ministério Público.
"MP não é porta de entrada"
A promotoria comandada por Paulo Tavares é responsável exclusivamente por casos de pacientes do SUS. As questões que envolvem clientes particulares ou de planos de saúde são encampadas pela Promotoria de Defesa do Consumidor. O escritório do promotor, no entanto, não é a porta de entrada para quem inicia a luta pelo fornecimento de medicamento de alto custo. Pelo contrário. Os casos devem chegar ao MP apenas quando as alternativas administrativas forem esgotadas.
A porta de entrada do SUS são as unidades básicas de saúde. Hoje, Londrina conta com 52 postos, espalhados por todas as regiões da cidade. Os casos atendidos pela promotoria, portanto, têm obrigatoriamente de ser encaminhados por profissionais do sistema público.
Após o promotor estar convencido da necessidade do medicamento de alto custo, o próximo passo é encaminhar uma solicitação ao poder público pela via administrativa. Em caso de negativa, a promotoria ingressa na Justiça com uma ação civil pública ou mandado de segurança. O problema então passa a ser judicializado. É exatamente isso que a promotoria pretende evitar.
O promotor alega que o cuidado com a liberação de medicamentos de alto custo justifica-se porque a conta é paga com dinheiro público. ‘‘Na nossa casa, sempre tentamos soluções mais baratas para depois optar pela mais onerosa. O brasileiro acredita que a coisa pública não pertence a ele. Mas é. O SUS é nosso. O SUS é um patrimônio nacional. Por isso é gratuito e universal’’, ressalta.
Tavares ressalta a importância de trabalhar com situações coletivas. ‘‘É mais fácil obter resultados e envolver e beneficiar muito mais pessoas’’, ressalta. Para isso a organização popular é fundamental. E assim o Ministério Público pode cumprir sua função que é atuar para garantir a saúde dos indíviduos e a viabilidade do sistema. ‘‘Essa é muitas vezes a diferença do advogado para o Ministério Público. Com todo respeito, mas o procurador do Estado vai defender só o interesse do Estado. O advogado vai resolver só o interesse do usuário. Todos os lados são respeitáveis. Só que eu tento conciliar o interesse do SUS com o do usuário’’, conclui.