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Projeto permite suspensão de tratamento de doente terminal

A Câmara analisa o Projeto de Lei 3002/08, dos deputados Hugo Leal (PSC-RJ) e Otavio Leite (PSDB-RJ), que permite a suspensão dos tratamentos usados na manutenção da vida de pacientes terminais, portadores de doenças graves e incuráveis. A proposta regulamenta a prática da chamada ortotanásia.
A ortotanásia, segundo os autores, não pode ser confundida com a eutanásia. Conforme explicam, ortotanásia significa o não-prolongamento artificial do processo de morte, enquanto a eutanásia seria a ação direta ou omissão voluntária para provocar a morte de um paciente, mesmo que com o intuito de evitar seu sofrimento.
”O projeto pretende regulamentar a matéria, permitindo a ortotanásia em situações bastante específicas e estabelecendo processo criterioso para sua aprovação”, observam os deputados na justificativa do projeto.
Hugo Leal e Otavio Leite lembram que a Resolução 1.805/06, do Conselho Federal de Medicina, permitiu ao médico “limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal”. A orientação, no entanto, foi suspensa pela Justiça Federal, que considerou que o assunto deve ser regulamentado por lei federal.

Junta médica
Pela proposta, a ortotanásia dependerá de pedido por escrito assinado pelo doente ou seu representante legal, na presença de duas testemunhas. O médico responsável pelo procedimento e demais profissionais de saúde, segundo o texto, não poderão atuar como testemunhas. A prática também deverá ser referendada por junta médica especializada.
O projeto determina também que o paciente ou seu representante legal tenha acesso ao diagnóstico e prognóstico médicos da doença, além de todas as informações sobre modalidades terapêuticas e alternativas para controle da dor.
Após cumpridos os procedimentos, o pedido de ortotanásia dependerá ainda de parecer favorável do Ministério Público, que também poderá provocar o Poder Judiciário, em caso de dúvida, para que se manifeste sobre o pedido.

Tramitação
A proposta será analisada pelas comissões de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, antes de seguir para o Plenário.

 

PROJETO DE LEI No , 3002 DE 2008 (Do Sr. Hugo Leal e Sr. Otavio Leite)

 

Regulamenta a prática daortotanásia no território nacional brasileiro.

 

O Congresso Nacional decreta:

 

Art. 1º Esta lei regulamenta a prática da ortotanásia no território nacional brasileiro.

 

Art. 2º Aplicam-se a esta lei as seguintes definições:

 

I – ortotanásia: suspensão de procedimentos ou tratamentos extraordinários, que têm por objetivo unicamente a manutenção artificial da vida de paciente terminal, com enfermidade grave e incurável; II – procedimento ou tratamento extraordinário:

 

procedimento ou tratamento não usual e cujo único objetivo é prolongar

 

artificialmente a vida;

 

III – procedimento ou tratamento ordinário: procedimento

 

ou tratamento necessário à manutenção da vida de qualquer pessoa ou

 

destinado ao alívio de sintomas que levam ao sofrimento, englobando

 

obrigatoriamente:

 

a) assistência integral de saúde;

 

b) nutrição adequada;

 

c) administração de medicamento para aliviar sofrimento

 

físico ou psíquico;

 

d) medidas de conforto físico, psíquico, social e espiritual.

 

IV – assistência integral de saúde: assistência que engloba todas as dimensões específicas de cada caso, usualmente

 

multiprofissional, incluindo acompanhamento médico nas diversas

 

especialidades envolvidas, cuidados de enfermagem, acompanhamentos

 

psicológico e social, entre outros;

 

V – doença terminal: aquela que, sob julgamento do

 

melhor conhecimento médico, é incurável e resultará em morte, se não forem

 

aplicados procedimentos extraordinários;

 

VI – médico assistente: profissional médico responsável

 

pela assistência ao paciente com doença terminal;

 

VII – junta médica especializada: junta formada por três

 

médicos, de cuja composição façam parte, impreterivelmente, pelo menos um

 

psiquiatra e um médico de especialidade afim com o caso específico do

 

paciente.

 

Art. 3º É permitida ao médico assistente a prática da

 

ortotanásia, mediante solicitação expressa e por escrito do doente ou seu

 

representante legal.

 

I – a solicitação deve ser feita em formulário próprio,

 

datado e assinado pelo paciente ou seu representante legal na presença de

 

duas testemunhas;

 

II – o médico assistente e outros profissionais que

 

trabalhem nos serviços de saúde onde se interna o paciente não podem atuar

 

como testemunha;

 

III – a decisão quanto à solicitação de que trata o caput

 

deverá ser proferida por junta médica especializada.

 

Art. 4º O médico assistente tem o dever de:

 

I – verificar a existência de doença terminal;

 

II – assegurar que o paciente ou seu representante legal

 

tome uma decisão plenamente informada, fornecendo-lhe informações

 

completas sobre o seu caso, que incluam:

 

a) diagnóstico;

 

b) prognóstico;

 

c) todas as modalidades terapêuticas existentes para o

 

caso específico;

 

d) alternativas para alívio ou controle da dor.

 

III – referir o paciente para junta médica especializada,

 

após atendidas todas as exigências previstas em lei, para ratificação

 

diagnóstica e decisão quanto à solicitação da prática de ortotanásia;

 

IV – aconselhar o paciente ou seu representante legal

 

sobre a importância de sempre considerar a possibilidade de desistência da

 

solicitação, a qualquer tempo, de qualquer maneira, sem necessidade de

 

justificação;

 

V – anular prontamente a solicitação assinada pelo

 

paciente ou seu representante legal, sempre que ele assim o desejar;

 

VI – preencher todos os registros médicos necessários à

 

solicitação;

 

VII – assegurar que a interrupção dos procedimentos ou

 

tratamentos extraordinários siga as exigências legais vigentes;

 

VIII – providenciar, quando for o caso, condições para que

 

o paciente possa proceder ao desligamento de aparelhos, se esta for sua

 

decisão;

 

IX – preencher o atestado de óbito;

 

X – assegurar que o paciente continue a receber todos os

 

cuidados ordinários necessários para seu caso específico, independentemente

 

de sua decisão quanto à ortotanásia;

 

XI – assegurar o direito a alta hospitalar ao paciente cuja

 

solicitação de ortotanásia seja aceita;

 

Parágrafo único. O médico assistente não poderá

 

participar de junta médica especializada de paciente seu.

 

Art. 5º Devem ser registrados no prontuário médico do

 

paciente:

 

I – a solicitação escrita, preenchida e assinada pelo

 

próprio paciente ou seu representante legal; II – o diagnóstico emitido pelo médico assistente e o

 

provável prognóstico;

 

III – o diagnóstico, o prognóstico provável e a opinião da

 

junta médica especializada que ratificou a opinião do médico assistente;

 

IV – a descrição dos aconselhamentos feitos ao paciente

 

ou seu representante legal, inclusive quanto ao seu direito de desistir, a

 

qualquer momento e de qualquer maneira, da solicitação feita.

 

Art. 6º A solicitação formulada pelo paciente ou seu

 

representante legal e endossada pela junta médica especializada deve ser

 

submetida à apreciação de membro do Ministério Público, para avaliação da

 

regularidade e da legalidade do procedimento de solicitação da ortotanásia.

 

§ 1º A prática de ortotanásia somente poderá ser efetuada

 

após decisão favorável do Ministério Público.

 

§ 2º Em caso de dúvida, o membro do Ministério Público

 

deverá provocar o Poder Judiciário, para que este se manifeste sobre a

 

solicitação.

 

Art. 7º Os gestores do Sistema Único de Saúde devem

 

tornar públicos, em relatório anual, dados estatísticos sobre a prática da

 

ortotanásia no território nacional.

 

Art. 8º Os médicos, auxiliares de saúde e demais

 

profissionais que participarem da prática da ortotanásia, estritamente na forma

 

prescrita por esta lei, não serão responsabilizados, civil ou penalmente, por

 

seus atos, ressalvados os excessos comprovadamente cometidos.

 

Art. 9º A validade dos atos jurídicos celebrados pelo

 

paciente, tais como planos ou seguros de saúde, seguros de vida ou

 

testamentos, não poderá ser questionada em razão da decisão pela

 

ortotanásia.

 

Art. 10º A morte resultante da ortotanásia praticada sob os

 

ditames desta lei não será interpretada como morte violenta, não natural ou

 

inesperada.

 

Art. 11. Nenhum profissional de saúde está obrigado a dar

 

assistência à prática de ortotanásia. Art. 12. É expressamente vedada a percepção de

 

honorários adicionais ou específicos em razão do acompanhamento de

 

ortotanásia, além daqueles normalmente contratados.

 

Art. 13. Esta lei entrará em vigor cento e oitenta dias após

 

a data de sua publicação oficial.

 

JUSTIFICAÇÃO

 

O problema da terminalidade da vida angustia os

 

profissionais de saúde, especialmente os médicos. O avanço científico e

 

tecnológico no campo da assistência à saúde, que possibilita a manutenção

 

artificial da vida por meio de equipamentos ou tratamentos extremos, gera

 

situações éticas e filosóficas novas, que demandam regulamentação própria e

 

específica.

 

Torna-se imprescindível, portanto, estabelecer limites

 

razoáveis para a intervenção humana no processo do morrer. O prolongamento

 

indefinido da vida, ainda que possível, nem sempre será desejável. É factível

 

manter as funções vitais em funcionamento mesmo em casos de precariedade

 

extrema; por vezes, inclusive no estado vegetativo. Todavia, em muitos casos,

 

esse sofrimento e essa agonia são desumanos, indignos e atentam contra a

 

própria natureza do ciclo da vida e da morte.

 

No intuito de orientar eticamente os médicos em tão grave

 

matéria, o Conselho Federal de Medicina expediu a Resolução nº 1.805/2006,

 

que permite ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que

 

prolonguem a vida do doente em fase terminal de enfermidade grave e

 

incurável. Tal documento, contudo, foi julgado improcedente por decisão do

 

Juiz Federal Roberto Luis Luchi Demo, 14ª Vara no Distrito Federal, em face da

 

natureza da matéria, que deve ser tratada por meio de lei federal.

 

Por esse motivo, propomos a esta Casa Legislativa o

 

presente projeto de lei, uma vez que acredito tratar-se de medida procedente.

 

A ortotanásia, cabe defini-la, não pode ser confundida com a eutanásia. Seguindo esclarecimento da Dra. Roxana Cardoso Brasileiro Borges,

 

“etimologicamente, ortotanásia significa morte correta: orto: certo, thanatos:

 

morte. Significa o não prolongamento artificial do processo de morte, além do

 

que seria o processo natural1”.

 

Eutanásia, por sua vez, segundo o Dr. Herbert Praxedes”,

 

implica “ação direta ou omissão voluntária de cuidados básicos que visam

 

provocar a morte de um paciente”, ainda que para evitar-lhe sofrimento2. Ainda,

 

o Dicionário Aurélio a traduz como “prática (…) pela qual se busca abreviar,

 

sem dor ou sofrimento, a vida de um doente reconhecidamente incurável”,

 

reputando-a “sem amparo legal”. Para Plácido e Silva3, “constitui o homicídio

 

ou crime eutanásico”, não sendo admitida no Direito Penal brasileiro.

 

O médico não pode, certamente, eximir-se de usar todos

 

os recursos ordinários para a manutenção de uma vida. Por outro lado, não lhe

 

pode ser imposto mantê-la indefinidamente, utilizando-se de métodos

 

extremos, que geram maiores malefícios que o bem supostamente esperado. O

 

bom senso explicita seria absurda e desumana tal prescrição legal.

 

O projeto apresentado pretende regulamentar a matéria,

 

permitindo a ortotanásia em situações bastante específicas e estabelecendo

 

processo criterioso para sua aprovação, a fim de assegurar que sua prática

 

ocorra dentro da legalidade. Esperamos, portanto, contar com o necessário

 

endosso de nossos Pares para o aperfeiçoamento e a aprovação deste

 

importante projeto de lei.

 

Sala das Sessões, em de de 2008.

 

Deputado HUGO LEAL

 

Deputado OTAVIO LEITE