O Projeto de Lei 3711/08, do deputado Rafael Guerra (PSDB-MG), regulamenta o exercício da atividade das cooperativas de profissionais de saúde de nível superior (médicos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e odontólogos). Segundo o projeto, não haverá vínculo empregatício entre o profissional de saúde cooperado e o estabelecimento contratante (hospital ou clínica), desde que o profissional tenha liberdade de se fazer substituir na escala de atendimentos por outros cooperados.
O deputado ressalta que o prestador do serviço é sócio da cooperativa, sem nenhum vínculo empregatício – seja com a cooperativa ou com o tomador do serviço -, e portanto não tem qualquer direito trabalhista. "Cada profissional é um associado, e não um empregado", diz o parlamentar.
Rafael Guerra afirma que o projeto é necessário porque o tema é controverso no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) quanto ao vínculo entre médicos e entidades, para efeito de incidência da contribuição previdenciária. "A cooperativa não pode ser considerada como um atentado aos direitos dos trabalhadores", avalia.
Situações
De acordo com o projeto, também não será reconhecido o vínculo trabalhista nos seguintes casos:
– do profissional médico que utiliza um estabelecimento de saúde aberto para a internação ou atendimento de seus pacientes, remunerando esse estabelecimento pelo uso direto da estrutura pelo paciente ou por seu convênio ou seguro saúde;
– do profissional médico integrante de corpo clínico fechado de estabelecimento de saúde que não recebe remuneração proveniente desse estabelecimento, mas sim diretamente do paciente, dos convênios, dos seguros de saúde ou do Sistema Único de Saúde (SUS).
Valor dos honorários
De acordo com a proposta, o SUS terá de adotar as providências necessárias para que o valor dos honorários seja previamente discriminado nas tabelas de procedimentos. O SUS também deverá adotar as providências para que esse valor seja creditado diretamente na conta do profissional que assim o solicitar.
O projeto permite que o estabelecimento de saúde estabeleça limites de quantidade de cooperados que lhe prestarão serviços. A instituição também poderá definir critérios para aceitar esses profissionais, levando em conta sua experiência, títulos e grau de especialização.
Segundo o texto, a substituição do cooperado em determinada escala deverá ser precedida de comunicação formal ao estabelecimento, em prazo previamente estabelecido pelo contratante.
Tramitação
A proposta tramita em caráter conclusivo nas comissões de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio; de Trabalho, de Administração e Serviço Público; de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
PROJETO DE LEI Nº , 3711 2008
(Do Sr. Deputado Federal Rafael Guerra)
Regulamenta o exercício da atividade das Cooperativas de Profissionais de Saúde de nível superior que menciona e dá outras providências
Art. 1º É assegurado aos seguintes profissionais de saúde de nível superior a
organização sob a forma de cooperativa, com o objetivo de prestação de
serviços aos estabelecimentos de saúde.
I – Médicos
II – Fisioterapeutas
III – Terapeutas Ocupacionais
IV – Fonoaudiólogos
V – Odontólogos
Art. 2º Não haverá vínculo empregatício entre o profissional de saúde e o respectivo
estabelecimento contratante, desde que o cooperado tenha liberdade de
fazer-se substituir na escala de atendimentos por outros cooperados, que
atendam os mesmos requisitos fixados pelo estabelecimento, na forma do
artigo 3º.
§ 1º – A substituição do profissional em determinada escala deverá ser
precedida de comunicação formal ao estabelecimento de saúde em
prazo que seja previamente estabelecido pelo contratante.
§ 2º – A liberdade de substituição prevista nesta lei não exime o cooperado
de seguir as normas internas que disciplinam o funcionamento do
estabelecimento, notadamente para assegurar a boa organização e
andamento dos serviços. Art. 3º O estabelecimento de saúde contratante poderá estabelecer limites
quantitativos ao número de profissionais cooperados que lhe prestarão
serviços, bem como critérios para o ingresso de aceitação desses
profissionais, levando-se em conta a experiência, a titulação e
especialização do profissional.
Art. 4º: Também não será reconhecido o vínculo trabalhista nas seguintes hipóteses:
a) ao profissional médico que se utiliza de um estabelecimento de saúde
aberto, para a internação ou atendimento de seus pacientes,
remunerando o referido estabelecimento pelo uso da estrutura
diretamente, através do paciente, ou de seu convênio ou seguro saúde;
b) ao profissional médico integrante de corpo clínico fechado de
estabelecimento de saúde que não recebe remuneração proveniente do
estabelecimento, recebendo pela sua produção efetiva diretamente do
paciente atendido, dos convênios, dos seguros-saúde ou do Sistema
Único de Saúde.
§1º Não descaracteriza a condição prevista na alínea “b” o fato de o agente
pagador efetuar o pagamento ao estabelecimento de saúde para que
este o repasse os honorários ao prestador do serviço.
§2º O Sistema Único de Saúde adotará as providências necessárias para
permitir, no prazo máximo de cento e oitenta dias contados da entrada
em vigor desta lei, que o valor correspondente aos honorários
profissionais seja previamente discriminado nas tabelas de
procedimentos.
§3º Em igual prazo, o Sistema Único de Saúde adotará as providências
necessárias para que o valor correspondente aos honorários
profissionais seja creditado diretamente na conta do profissional que
assim o solicitar.
Art. 5º Desde que atendidos os pressupostos contidos nesta lei, a aplicação de
penalidade trabalhista decorrentes do reconhecimento da relação de
emprego pela autoridade administrativa deverá ser precedida de decisão
irrecorrível da Justiça do Trabalho, reconhecendo a relação de emprego. Art. 6º Ficam remidos os créditos tributários constituídos nos últimos sessenta meses
e anistiadas as respectivas penalidades incidentes decorrentes do
reconhecimento administrativo de vínculo empregatício sobre as
cooperativas de trabalho de que trata esta lei.
Art. 7º Essa lei entra em vigor na data de publicação.
JUSTIFICAÇÃO
O presente projeto pretende regulamentar o exercício dos Profissionais
de Saúde da atividade das Cooperativas de nível superior, uma vez que as
atividades das sociedades cooperativas, regulamentadas através da Lei nº 5.764/71,
é matéria de grande controvérsia, no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social
INSS, quanto a caracterização ou de vínculo empregatício entre médico e entidades,
para efeito de incidência da contribuição previdenciária prevista no art. 22, da Lei
8.212, de 24 de julho de 1991. Dessa forma o presente projeto vem suscitar este
dilema.
Assim, em se tratando de cooperativa validamente constituída e
validamente contratada, o prestador do serviço é sócio da cooperativa e não tem
qualquer vínculo empregatício, quer com a cooperativa quer com o tomador do
serviço, não lhe sendo devido qualquer direito trabalhista. Pois, cada profissional é
um associado e não um empregado. A relação de parceria entre a Cooperativa e o
Contratante é uma relação contratual onde todos os profissionais estão vinculados à
cooperativa na qualidade de sócios e de usuários dos serviços da cooperativa,
conforme o disposto no art. 3º, da Lei nº 5.764/71:
"celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que
reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o
exercício de uma atividade econômica, de proveito comum Sua origem remonta ao Século XIX, na Inglaterra, como forma de reação
dos trabalhadores à revolução industrial. No Brasil, a Constituição Federal de 1988,
no seu art. 174, parágrafo 2o., estabelece o apoio e estímulo ao cooperativismo:
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o
Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo
para o setor privado.
[…]
§ 2º – A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de
associativismo.
As cooperativas são de grande importância na economia, tanto que a
OIT, pela Recomendação 127/66, destacou que:
"com a finalidade de melhorar as oportunidades de emprego, as condições
de trabalho e as receitas dos trabalhadores agrícolas sem terras, deveriam
estes ser ajudados, quando for conveniente, a organizarem-se,
voluntariamente, em cooperativas de trabalho".
É importante essa regulamentação de forma a acabar com as
interpretações que vêm ocorrendo e gerando preconceito quanto as atividades de
cooperativismo médico, bem como sua linha de argumentação de que: (1) os
Hospitais estariam terceirizando sua atividade precípua, o que é condenado pela
jurisprudência atual (Súmula 331 do TST); e (2) que as tradicionais e há muito
utilizadas cooperativas médicas seriam associações fraudulentas e existiriam apenas
para que direitos trabalhistas dos médicos fossem logrados.
A terceirização da atividade médica, ao contrário desse entendimento
adotado pela Fiscalização do Trabalho, é, sim, regular e lícita, desde que
observados, obviamente, a inexistência dos pressupostos fático-jurídicos da relação
de emprego e que a terceirização em questão não se trata de terceirização mas de
atividade-fim.
Numa análise mais detida da legislação específica do setor de saúde,
notadamente as regulamentações do Conselho Federal de Medicina, bem como dos
conceitos envolvidos na caracterização de estabelecimentos de saúde, se percebe
que o objetivo destes se resume à função de criar uma estrutura de trabalho
adequada para o médico, fornecendo condições e instrumental necessário para que
o mesmo desempenhe o ato médico, tomamos emprestado a definição de Corpo Clínico, normatizada pela Resolução nº 1.481/97, do Conselho Federal de Medicina,
que demonstra, inequivocamente, a indispensabilidade da autonomia absoluta de
que se deve valer o profissional médico para atuar:
“o conjunto de médicos de uma instituição com a incumbência de prestar
assistência aos pacientes que a procuram, gozando de autonomia
profissional, técnica, científica, política e cultural”.
De forma que o papel dos hospitais não deve ser confundido com o papel
do profissional médico, pois o ato médico é uma atribuição privativa do médico e não
pode ser outorgada a nenhum estabelecimento de saúde ou a terceiros, pois o
médico, profissional autônomo, desempenha serviço diverso daquele desempenhado
pelos hospitais. Não está submetido ao poder de direção do estabelecimento de
saúde com relação a seus atos, pois que a prestação de seu trabalho se dá de forma
intelectual, técnica e científica, porém depende, ainda que de forma eventual, do
aparato e do instrumental disponibilizado pelos hospitais, por meio da prestação dos
serviços hospitalares. Esse entendimento deve-se estender também ao profissional
médico que:
A) utiliza de um estabelecimento de saúde aberto, para a internação ou
atendimento de seus pacientes, remunerando o referido
estabelecimento pelo uso da estrutura diretamente, através do
paciente, ou de seu convênio ou seguro saúde;
B) integrante de corpo clínico fechado de estabelecimento de saúde que
não recebe remuneração proveniente do estabelecimento, recebendo
pela sua produção efetiva diretamente do paciente atendido.
Lembramos que os serviços hospitalares consistem, tão-somente, no
fornecimento do aparato e instrumental (leitos, ambulâncias, medicamentos,
aparelhagem médica, etc.) destinado à viabilização e suporte dos serviços médicos,
exercidos pelos profissionais (pessoas físicas) por meio do conhecimento técnico,
científico e intelectual adquirido em sua formação acadêmica e profissional. Portanto,
a distinção entre os dois tipos de serviços é óbvia, o caráter empresarial das
atividades hospitalares não são os serviços médicos e estes nem podem ser
considerados, atividade-fim de qualquer hospital. Trazendo as lições do i.Ministro do TST e Jurista Maurício Godinho
Delgado:
“Objetiva, desse modo, o Princípio da Dupla Qualidade que as cooperativas
destaquem-se por uma peculiaridade em face das outras associações: o
próprio associado é um dos beneficiários centrais dos serviços por ela
prestados.
De fato, é o que ocorre, de maneira geral, com as tradicionais
cooperativas de prestação de serviços, clássicas no mercado de
trabalho (ilustrativamente, cooperativas de operadores autônomos de
serviços de táxi, de operadores autônomos de serviços médicos, etc..)
(…)
Observe-se, ilustrativamente, como atua o Princípio da Retribuição Pessoal
Diferenciada na prática do mercado econômico. (…) O mesmo pode
ocorrer com cooperativas de serviços médicos autônomos: o
cooperado médico, que já labora como profissional autônomo, aufere,
em função do cooperativismo, clientela específica, certa e larga –
clientela inimaginável caso ele estivesse atuando sozinho, isolado em
seu consultório; além disso, a cooperativa presta-lhe diversos outros
serviços, ampliando seu potencial.”
Assim, observa-se nas sociedades cooperativas médicas a presença de
todas as características básicas preceituadas na Lei de Cooperativas nº 5.764/71, as
quais estão corporificadas em basicamente dois Princípios que regem o
Cooperativismo:
1 – o Princípio da Dupla Qualidade, segundo o qual o cooperado é,
ao mesmo tempo, cooperado e cliente da cooperativa, na medida
em que também recebe bens ou serviços da sociedade;
2 – o Princípio da Retribuição Pessoal Diferenciada, segundo o qual
o cooperado, associado à cooperativa, tem melhores condições
retributivas do que teria se independente fosse.
Destaca-se, que não existe qualquer vinculação, seja trabalhista,
previdenciária ou de qualquer natureza entre o profissional e o contratante conforme
descrito no artigo 422 da CLT.
Portanto, com relação as cooperativas médicas realmente autônomas, a
terceirização pode ser realizada, já que, como visto, os serviços contratados dizem
respeito à atividade-meio do tomador de serviço; e, de maneira geral, não estão
presentes, concomitantemente, entre cooperado e tomador de serviços, os requisitos
listados no artigo 3º da CLT, quais sejam, pessoalidade, não-eventualidade,
remuneração e, principalmente, subordinação. Destarte, a cooperativa não pode ser
considerada como um atentado aos direitos dos trabalhadores. O seu objetivo é a redução de custos mediante aprimoramento da produção, trazendo melhores
condições de vida. No caso especifico deste projeto de lei o setor de saúde, um dos
segmentos cooperativistas que mais tem crescido no país nos últimos anos, ocorre a
reunião de médicos, dentistas, enfermeiras e outros profissionais do setor, visando o
atendimento público de saúde, de boa qualidade, em melhores condições de trabalho
e remuneração geralmente melhor do que a percebida pelos associados quando
assalariados da rede pública de saúde.
Diante de todos os motivos expostos, e estando evidente o alcance
social da medida pleiteada, esperamos contar com o apoio de nossos ilustres Pares
para a aprovação do projeto de lei nesta oportunidade apresentado.
Sala das Sessões, em de julho de 2008.
Deputado Federal Rafael Guerra
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