A Comissão Parlamentar de inquérito que investiga irregularidades nos planos de saúde não resistiu à pressão das operadoras. A principal proposta de mudança na lei que regula o setor – que limitava a variação de preços entre clientes jovens e idosos – foi retirada do relatório final durante a votação de ontem, na Câmara dos Deputados.
”É preciso reconhecer que na votação prevaleceu o lobby das operadoras e permanece o mecanismo de expulsão dos idosos dos planos de saúde”, lamentou o presidente da CPI, deputado Henrique Fontana (PT-RS), e principal defensor da limitação da variação de preços na comissão.
Atualmente há sete faixas etárias nos planos de saúde, que abrangem usuários de zero a 17 anos até os com mais de 70 anos. Em geral, a cada dez anos os usuários têm suas mensalidades reenquadradas de acordo com a idade. Ou seja, o preço aumenta. No fim, os mais velhos podem pagar até 600% a mais que os mais novos.
Durante os acertos políticos para a aprovação do relatório final, essa variação foi fixada em 300% – a proposta original era limitar em 100%. Mas nem essa solução resistiu à votação. A maioria dos deputados da CPI aceitou os argumentos do deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), que apresentou o destaque que retirou do texto final a limitação da variação de mensalidades. ”É muito temeroso reduzir as faixas sem um estudo atuarial. O perigo é desequilibrar os planos de saúde”, afirmou Perondi.
No lugar da proposta – que estava incluída em um projeto de lei com mudanças na legislação específica dos planos de saúde – os deputados remeteram à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o órgão que fiscaliza e regulamenta o setor, a sugestão para que realize estudos com o objetivo de alcançar uma redução na variação de preços entre jovens e idosos.
A mudança agradou às operadoras. ”Os assuntos de natureza técnica foram remetidos para a ANS, que tem o corpo técnico e a competência para regulamentar o setor. Prevaleceu o bom senso”, avalia o vice-presidente executivo da Sul América Saúde, João Alceu Amoroso Lima, que acompanhou a votação na CPI. O presidente da CPI, porém, promete insistir na limitação de preços. ”Vou apresentar projeto amanhã (hoje) sobre isso, e com o limite de 100%”, garante.
Migração
O relator, deputado Ribamar Alves (PSB-MA), acredita, porém, que várias propostas positivas foram mantidas no relatório final. ”Estamos propondo 47 modificações na legislação. Há vários avanços, como a questão da mobilidade”, diz Alves. A ”mobilidade” citada pelo relator se refere à sugestão de mudança na lei para garantir que os usuários de planos de saúde possam mudar de operadoras sem precisar cumprir novos períodos de carência. A proposta de mudança na legislação específica também transforma em lei a proibição de exigência de cheque-caução para o atendimento de usuários. Hoje isso é proibido por uma regulamentação da ANS.
Outros pontos sem consenso, no entanto, acabaram sofrendo modificações e tiveram seus efeitos práticos amenizados. A primeira versão do relatório previa restrições para a chamada ”dupla porta”, quando hospitais públicos e universitários fazem contratos de prestação de serviços aos planos de saúde e, por isso, reservam parte dos leitos a usuários desses planos. Na versão aprovada ontem, foi sugerido ao Poder Executivo ”o desenvolvimento de estudos sobre o assunto.
Outro ponto é a caracterização como crime da ”meta referencial”, quando as operadoras dão incentivos financeiros a médicos que pedem menos exames para os pacientes – e, assim, reduzindo os custos dos planos de saúde. Originalmente o relatório incluía esse ponto na proposta de mudança na lei. Agora, há uma sugestão para que o governo federal tome providências nesse sentido.