O brasileiro que quiser parar de fumar terá acesso a tratamento e remédios custeados pelo governo federal. Ontem, Dia Internacional de Combate ao Tabagismo, o Ministério da Saúde publicou uma portaria incluindo no Sistema Único de Saúde (SUS) o suporte completo para o dependente de cigarros abandonar o vício: adesivos e gomas de mascar de nicotina para substituir a dose mínima da substância em quadros de crise de abstinência e um antidepressivo usado para auxiliar no abandono do fumo.
Os postos de saúde também terão à disposição do fumante um programa de psicoterapia em grupo com profissionais treinados pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), no Rio de Janeiro. A portaria é parte da meta do governo de dar prioridade máxima à luta contra o cigarro.
– O tabagismo é uma doença e deve ser tratada como tal – recomendou Vera Luiza Costa e Silva, diretora da campanha “Iniciativa por um mundo sem tabaco”, da Organização Mundial de Saúde.
Ontem, no fórum da Organização Panamericana da Saúde (Opas) de combate ao tabagismo, em Brasília, o ministro da Saúde, Humberto Costa, anunciou que serão gastos R$ 5,6 milhões este ano para adequar o SUS aos novos serviços. Segundo o ministro, até 2006 o sistema será capaz de dar a todos os interessados acesso ao tratamento.
Portaria garante repasses regulares
O presidente do Inca, José Gomes Temporão, informou que já existia no Brasil uma portaria que dava direitos aos fumantes ao tratamento do SUS. No entanto, a medida não funcionava, segundo ele, porque não existiam remédios ou profissionais nos postos de saúde para executar o programa. A nova portaria garante repasses regulares de recursos e estabelece a estrutura necessária no sistema para que o programa funcione com eficácia.
– De nada adianta o Brasil ter uma política pública radical contra o tabagismo e não dar apoio a quem quer deixar o vício – justificou Temporão.
Até o fim do ano, 150 equipes treinadas pelo Inca estarão trabalhando nos centros de saúde. A licitação para a compra dos produtos deverá ocorrer em no máximo 45 dias. O Ministério da Saúde vai adquirir os produtos e, em seguido, vai repassá-los aos municípios.
A campanha do governo também atingirá o mercado. Costa afirmou que está discutindo com o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, o aumento da alíquota do IPI como forma de aumentar o preço final do cigarro. Hoje, o IPI do setor é de 330%. O último aumento do imposto foi em dezembro de 2003, de 20%.
– O cigarro é um bom negócio para a indústria do fumo, mas é um péssimo negócio para a população mundial. Nosso compromisso não é com a indústria, mas com o bem estar da sociedade – disse Costa.
Câmara entra na luta contra o fumo
Ontem, a Câmara dos Deputados também entrou na luta contra o fumo. Após o episódio em que o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, foi advertido porque acendera um cigarro numa comissão da Casa, na semana passada, a diretoria da Câmara afixou nos corredores reproduções em larga escala da publicidade do Ministério da Saúde de combate ao tabaco.
A diretoria da Câmara também inaugurou do lado de fora um fumódromo – já que é proibido acender cigarro dentro do Congresso. Ontem, poucas pessoas utilizaram o novo espaço. Constrangidas, não quiseram dar entrevista ou ser fotografadas.
COLABOROU Ailton de Freitas
Hábito de fumar cresce entre adolescentes
BRASÍLIA. Pesquisa realizada em parceria pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) concluiu que cresceu o consumo de cigarros entre jovens. Em Porto Alegre, Vitória, Goiânia e Boa Vista, aproximadamente 70% dos alunos fumam o primeiro cigarro com 13 anos ou menos. Em Curitiba, o percentual de consumidores que experimentam fumar nessa faixa etária chega a 80%. Na maioria das cidades, as meninas experimentam mais cedo do que os meninos. No entanto, os meninos fumam com mais assiduidade do que as meninas.
O estudo também mostra o acesso fácil ao cigarro. Entre 60% e 90% dos estudantes com idade entre 12 e 16 anos disseram que compraram cigarros em lojas, bares ou de vendedores ambulantes, sem que ninguém perguntasse sua idade. O governo pretende reforçar a fiscalização e proibir a venda de cigarros em máquinas automáticas.
Pesquisa foi realizada com estudantes de 11 capitais
De acordo com a OMS, há 1,3 bilhão de fumantes no mundo, e cinco milhões de mortes são causadas por doenças ligadas ao tabaco. No Brasil, cerca de 200 mil pessoas morrem por ano devido a males provocados pelo tabagismo.
Realizado a partir de entrevistas com alunos de 11 capitais em 2002 e 2003, o estudo descobriu que o impacto da mídia e a influência de parentes fumantes são alguns dos aspectos que influenciam os jovens a fumar. Dos entrevistados, 87,3% afirmaram ter entrado em contato com anúncios de cigarro nos 30 dias anteriores. O Ministério da Saúde lançou campanha publicitária no formato de um seriado americanos direcionada a jovens. O “sitcom” se passa no fictício Departamento de Idéias da Indústria do Cigarro, onde o chefe faz de tudo para atingir jovens com suas campanhas. Também foi anunciada parceria com o Ministério da Educação para conscientizar os jovens sobre os males do cigarro.
Também foram divulgados dados de um estudo sobre tabagismo realizado entre 2002 e 2003 em 16 capitais brasileiras. O consumo de cigarros cresceu entre pessoas com baixa escolaridade e mulheres. Quem tem menos de sete anos de estudo fuma quase o dobro de quem estudou mais que isso.
Em Porto Alegre, 25,2% dos entrevistados fumavam. O menor índice foi em Aracaju, 12,9%. A proporção de fumantes no Rio – que chegava a 30% – caiu para 17,5% no estudo divulgado ontem pelo ministério.
Cigarro e pobreza: um círculo vicioso
GENEBRA. As pessoas mais pobres são as que mais sofrem os impactos negativos do tabagismo. O alerta foi feito pela Organização Mundial de Saúde (OMS) no lançamento de sua campanha anual contra o fumo, este ano intitulada “Tabaco e pobreza: um círculo vicioso”. Os dados da OMS revelam que cerca de 80% dos 1,2 bilhão de fumantes do mundo vivem em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento.
De acordo com a OMS, há uma ligação muito forte entre o tabagismo e a pobreza, com conseqüências desastrosas para as já combalidas economias dos países pobres. Números oficiais revelam que uma pessoa morre a cada 6,5 segundos e muitas mais ficam doentes em razão do tabagismo. Isso tem um impacto crescente não só no sistema de saúde, mas também na economia dos países ao reduzir a produtividade e os lucros.
– O mundo não pode aceitar perdas humanas e econômicas tão facilmente evitáveis – disse o diretor-geral da OMS, Lee Jong-Wook.
A OMS lembrou ainda que a maioria dos pequenos produtores de tabaco vive na pobreza e que muitos deles empregam mão-de-obra infantil. Por isso, sustenta a agência, embora inicialmente esses produtores possam ter lucros, não há benefício a longo prazo, uma vez que essas crianças se tornam adultos iletrados.
Para a OMS, entretanto, esse círculo vicioso pode ser rompido. A agência fez um apelo aos países para que assinem a Convenção para o Controle do Tabaco, que já conta com o apoio de 118 nações. A adesão à convenção implica o banimento total ou fortes restrições à propaganda de cigarro nos próximos cinco anos. O documento apresenta diretrizes sobre alertas a serem apresentados nos maços e recomenda um aumento significativo dos impostos.