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Cuidar da saúde faz parte do ensino

Pinotti, o futuro secretário da Educação, quer criar projeto de saúde nas escolas

Tratar da saúde das crianças é também uma forma de melhorar o aprendizado. No que depender do futuro secretário municipal da Educação, o ginecologista José Aristodemo Pinotti, professores se tornarão “investigadores” de possíveis doenças e a escola será um lugar para a descoberta e tratamento de males como miopia e desnutrição. Ele afirma que continua sonhando com o período integral nas escolas, deseja aproveitar melhor os Centros Educacionais Unificados (CEUs) e promete ampliar as vagas nas creches e Emeis. Ontem de manhã, Pinotti recebeu a reportagem do Jornal da Tarde para uma entrevista em sua clínica.

O senhor conhece os CEUs?

Não. Amanhã (hoje) estarei com a secretária de Educação (Maria Aparecida Perez), pois não seria delicado visitar escolas sem a permissão dela. Vamos nos encontrar e quero visitar todos os tipos de escolas: creches, Emeis, latinhas, CEUs e as comuns, para conversar com professores, alunos e pais.

Qual foi a última vez que o sr. visitou uma escola municipal?

Quando era secretário estadual da Educação, em 86 e 87. Depois visitei algumas durante as campanhas que fiz. Ficava preocupado com o que via: banheiros sujos, pichações. É importante estudar em um ambiente agradável.

Que imagem o sr. tem dos CEUs?

Acho o CEU muito bonito, uma construção cara por ser completa. Meus amigos que foram aos CEUs ficaram muito bem impressionados com o que tem lá e os centros que estão aí serão bem mantidos. Isso significa que estou preocupado com essa crise de não pagamento dos funcionários e vou verificar o que está havendo. Farei pressões para que esses pagamentos sejam efetuados. Vou conversar com a secretária para ver como resolver isso. Mas não vamos fazer mais CEUs enquanto não acabarmos com as escolas de lata.

Qual o problema dos centros?

O problema é que não dá para continuar construindo se você tem escolas de lata e se 70% das crianças que precisam de creche estão na fila de espera. Nem enquanto não se melhorar a qualidade do ensino e valorizar o professor. Mas vou preservar ao máximo os que estão aí, porque são um aparelho social precioso. Se possível, quero dar a eles utilização mais plena, já que o custo de manutenção é alto.

O que pode ser feito neles?

Estou pensando e irei verificar se há ociosidade nos centros para preenchê-los com o pós-escola das crianças com mais dificuldade de aprendizado. Segundo o Saeb (sistema de avaliação do Ministério da Educação), 50% das crianças das escolas públicas estão em situação de aprendizado crítica.

O sr. é médico e foi secretário da Saúde. É possível incluir atendimento médico nos CEUs e outras escolas da rede?

Sem dúvida. As crianças de toda a rede precisam de um programa que eu chamaria de Programa de Atenção Integral à Saúde da Criança. É preciso que ele comece nas escolas porque vamos ensinar às professoras como detectar problemas de saúde, muitas das dificuldades de aprendizagem decorrem dos problemas de saúde. Cerca de 20% das crianças do ensino fundamental precisariam usar óculos e acho que só 2% usam. É muito fácil você ensinar os professores a detectar deficiências visuais. Além disso, eles podem detectar outros problemas, como desvio de atenção, violência doméstica, verminose, desnutrição.

E o tratamento seria na escola?

Tudo isso tem de ser detectado na escola. Alguns problemas podem ser até tratados na escola e outros, encaminhados ao posto de saúde. Ou o pediatra pode ir à escola, vai depender de um diálogo que pretendo estabelecer imediatamente com o Claudio Lottenberg (futuro secretário da Saúde) para montarmos esse programa. Há uma facilidade que não pode ser desprezada, que é a de todas as crianças estarem disponíveis no mesmo lugar na mesma hora. Cuidar da saúde faz parte do processo de ensino-aprendizagem porque uma criança desnutrida, maltratada, vai mal no aprendizado e, freqüentemente, é diagnosticada do ponto de vista pedagógico como incompetente, ou pouco inteligente.

O Saeb mostra que as crianças não sabem fazer contas simples nem interpretar textos curtos. Por que elas não aprendem?

Basta seguir a trajetória de um aluno da rede pública. A maioria não tem creche. Os pais não têm tempo nem formação para ensiná-los, eles ficam ou na vizinha ou sozinhos e perdem a riquíssima oportunidade de aprendizado que é a primeira infância. É quando se forma a personalidade. Depois, vão para um ensino fundamental ruim. E aí não tem jeito. Além disso, há uma visão distorcida da aprovação.

O sistema de ciclos será mantido?

Sim, porque é um processo pedagógico bom.

E como evitar que a aprovação seja automática?

Oferecendo reforço para os que têm dificuldade e fazendo avaliações contínuas.

Esse é o Programa Reforçando o Futuro, previsto no programa de José Serra?

Não conheço esse nome. Mas vamos recuperar os alunos e os professores e por isso não vamos construir mais CEUs.

Por que chegamos a essa situação mostrada pelo Saeb?

Ela é fruto da pobreza, da dificuldade que se tem tido de fazer da educação uma prioridade nacional e de equívocos das prioridades. Tudo é importante – material, transporte, uniforme -, mas há outras prioridades. O professor é fundamental e não tem sido valorizado. Não falo só de salário, mas não tem sido respeitado, escutado nem tido boas condições de trabalho. Ele e a escola não têm mais o poder. A descentralização tem de ir para a escola, o poder tem de ficar lá, não na subprefeitura. É a atenção primária. Pretendemos passar para a escola as verbas de manutenção porque assim direção e associações de pais poderão decidir prioridades. Eles conhecem melhor seus problemas.

Ao assumir a Secretaria Estadual da Educação, em 1986, o sr. tinha o sonho do período integral. O sonho continua?

Colocamos 503 mil alunos do Estado no ensino integral e continuo com esse sonho. Escolhemos de cada escola aqueles alunos que tinham mais dificuldade e eles ficaram o dia todo em atividades pedagógicas. É isso o que pretendo fazer novamente. Com atividades culturais e esportivas, eles descobriram suas aptidões e passaram a ser respeitados pelos colegas, melhoraram a auto-estima e passam a ir melhor também nas outras disciplinas. É esse tipo de coisa que queremos no ensino integral.

O período integral vai começar em 2005?

Espero começar o quanto antes. Temos de ver os espaços disponíveis, não só dos CEUs, mas dos centros desportivos municipais, museus, bibliotecas. Vamos usar o bairro e a cidade. Os estudantes vão tomar conta desses espaços. Hoje, as crianças pobres estão seqüestradas dentro de escolas pobres e essa visão pequena que temos tido do ensino tem servido para aumentar as diferenças sociais. Entendo que o ensino público tem de dar mais na escola para quem tem menos em casa. O tempo integral é óbvio que é necessário.

Em entrevista à IstoÉ, em 1992, o senhor disse que “sala de aula talvez seja o pior lugar para ensinar”. Como fazer com que educadores atuem em espaços em que não estejam acostumados?

Valorizando o professor é uma delas. Porque ele pode ter salário baixo, pode estar em sala de aula precária, mas quando estabelece uma alça afetiva com seus alunos, esquece do resto e dá o que tem de melhor. Então, precisamos valorizar o professor para que ele tenha muito mais para dar. E temos de encontrar novas formas de reciclagem porque já descobrimos que não adianta pôr os professores em cursos nas universidades. Está distante da realidade. Vamos usar formas mais criativas, modernas e efetivas de capacitação, levando em conta o dia-a-dia de cada unidade. Vamos reciclar na escola pois cada uma é um mundinho diferente.

O senhor afirmou que uma de suas prioridades será acabar com as filas de espera nas creches e Emeis. Como ampliar as vagas rapidamente?

Para fazer com a velocidade necessária, teremos de aumentar os convênios. Mas vamos dar qualidade a eles e criar normas. Por exemplo, vamos fazer convênio apenas com quem tiver crecheira qualificada. Também podemos alugar prédios adequados e, na medida do possível, construir novas unidades.

Já dá para ter idéia de quantas vagas serão criadas em 2005?

Ainda não porque os dados que temos sobre educação são precários.

A transição está complicada?

Os dados ainda não são suficientes para um bom planejamento, são mandados friamente. Vou ter um diálogo com a secretária e espero obter dados melhores.

Os kits de material e uniforme, o Vai-e-Volta e o Leve-Leite continuam da forma que estão?

Sem dúvida. Vão continuar e, se possível, ser ampliados.

O programa do Serra diz que escolas poderão escolher cores e modelos dos uniformes. O senhor concorda?

Concordo. Acho que uniforme não pode ter logotipo partidário e o aluno deve se sentir à vontade. A decisão pode ficar para a diretoria e a associação de pais.