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Não existe almoço grátis

            A frase-título deste artigo, tradução do inglês “there ain’t no such thing as a free lunch”, foi tomada de empréstimo a Milton Friedman, Nobel de Economia em 1976, que faleceu no último dia 16 deixando sólida influência sobre a política econômica de muitos países que rezam na cartilha neoliberal – inclusive o Brasil do presidente Lula, que se autoproclama de esquerda.

 

A expressão não traz nenhuma novidade. Pelo menos para os contabilistas, habituados a avaliar e registrar o custo de serviços e mercadorias. 

 

O conceito de que tudo tem um preço pode ser estendido até mesmo a outras esferas: se abusamos no uso dos recursos naturais, por exemplo, nos preparemos para pagar a conta: aquecimento do planeta, elevação das águas dos oceanos, tempestades… Se extrapolamos em nossa vida pessoal, mais cedo ou mais tarde, as contas virão…

 

Assim é, de forma muito mais clara, na dimensão do mercado e também no ponto em que política e economia se cruzam – região das análises ácidas de Friedman.

 

Embora seja evidente que não existe nada de graça – nem o cafezinho -, muitos brasileiros, posando de coitadinhos, querem transformar o Estado em uma espécie de templo de milagres. A Previdência Social pode pagar aposentadorias milionárias. A União pode praticar assistencialismo. Nosso presidente, candidato à reeleição, pôde abrir os cofres federais, aumentando em quase 100% os gastos, argumentando que se tratava de investimentos, embora sem planejamento, caso da operação tapa-buracos. Parlamentares fazem média perante seu eleitorado prometendo o 13º aos beneficiários do Bolsa Família. Deputados federais e senadores fazem campanha para aumentar seus rendimentos de R$ 12,8  mil para R$ 24, 5 mil. Membros dos altos escalões do Judiciário exigem reajuste salarial de 12%, elevando seus ganhos para cerca de R$ 30 mil. Os banquetes vão por aí a fora…

 

Está aberta a temporada de caça ao tesouro. A questão é quem paga a fatura. Não é o Estado, mas quem trabalha, produz e paga impostos. Friedman exagerou na defesa da liberdade de iniciativa, desenhando uma sociedade meio darwinista. É preciso impor limites à ganância, mãe de tantas imoralidades e crimes. Mas a leitura da sua obra pode lançar luzes sobre a escuridão de Brasília. Nosso dilema, no entardecer de 2006,  é projetar a manhã radiante em que surge no horizonte um Estado menor, com carga tributária reduzida, alta hoje por causa dos gastos exagerados decorrentes das crescentes concessões e privilégios; eliminar entraves e criar condições para que os brasileiros ganhem o sustento com suor do seu próprio rosto.

 

Uma partilha é o que está ocorrendo nesse momento, em que o presidente Lula negocia uma agenda para os próximos quatro anos: PT, PSDB, PFL, PMDB e partidos minoritários disputando fatias do poder.
Talvez a maior contribuição de Friedman foi demonstrar que o Estado não é, não pode funcionar, como empresa. Essa confusão é um dos piores males. Os governos e legisladores que logo mais assumirão mandatos precisam assimilar um conceito muito simples: política não é mercadoria, mas espaço de definições em prol da sociedade.
Como nossa política não tem sido exercício de decisões importantes para a coletividade, estamos pagando o preço: crescimento econômico medíocre, desemprego em massa, índices de violência assustadores, desigualdade social gritante, infra-estrutura carente de investimentos… O Tribunal de Contas da União acaba de revelar que a má conservação da malha rodoviária do país, nos últimos 30 anos, causou um prejuízo ao patrimônio público de cerca de R$ 434 bilhões, considerando a inibição do desenvolvimento econômico, a elevação do custo operacional dos veículos, o aumento do índice de acidentes e o acréscimo do custo dos fretes e passagens rodoviárias.

 

Maurício Fernando Cunha Smijtink é contador, empresário da contabilidade e presidente do CRCPR.