A secretária nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Ana Ligia Gomes; o diretor do Departamento de Atenção Especializada da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Alberto Beltrame; e a própria presidente do Conselho Nacional de Assistência Social, Simone Aparecida Albuquerque, foram unânimes em afirmar que o papel do CNAS está sendo desvirtuado. Eles concordaram que não caberia ao órgão as atividades de gestão, administração ou de certificação e fiscalização das entidades beneficentes de assistência social.
Ana Lígia afirmou que o conselho deve ser o "provocador" dos debates para a formulação de políticas públicas. Para Simone, não somente o conselho nacional mas os conselhos municipais estão sendo prejudicados por uma "confusão conceitual", que inclui na assistência social entidades de saúde e educação como hospitais, escolas e universidades.
A presidente do CNAS enfatizou que tal confusão prejudica a própria representação da sociedade civil no conselho, pois há dificuldades em definir quem são os trabalhadores e as entidades de assistência social. "Tudo o que é feito para pobre nesse País é chamado de assistência", criticou.
Hospitais
Segundo Alberto Beltrame, o Ministério da Saúde tem mais condições de fiscalizar os procedimentos e o cumprimento dos requisitos que caracterizam os hospitais filantrópicos. Ele explicou que a pasta já tem um programa de avaliação dessas instituições. E informou que os hospitais beneficentes são responsáveis por 33% dos leitos disponíveis no Sistema Único de Saúde.
O diretor ressaltou ainda que a origem dos hospitais no País está ligada à prática das entidades beneficentes, que chegam a atender 70% dos pacientes do SUS em alguns estados, como o Rio Grande do Sul. Para Beltrame, tais instituições exercem um papel "estratégico" no sistema de saúde brasileiro ao complementar o serviço público.
Procurador cobra dívida de entidade que perdeu certificado
Recentemente, foram divulgadas denúncias de fraudes no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), que são investigadas pelo Ministério Público Federal. Ao tratar do assunto na audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família, o procurador Pedro Antonio de Oliveira Machado perguntou aos participantes se seria adequado conceder o perdão das dívidas das entidades que perderem o certificado a partir da aprovação da nova legislação.
Segundo ele, é preciso debater se os critérios terão validade somente a partir da publicação da lei, ou se as dívidas das entidades que já estão em atuação serão cobradas pelo governo. O ministro da Previdência, Luiz Marinho, destacou que o governo não fez nenhuma sugestão sobre o assunto no projeto. De acordo com ele, os parlamentares precisam discutir qual das duas soluções é a melhor para o País.
Entretanto, o ministro destacou que a legislação atual, apesar de prever como punição o ressarcimento da renúncia fiscal praticada pela entidade que tiver seu certificado cassado, não é cumprida. "A cobrança, muitas vezes, é questionada judicialmente e muitas entidades não conseguem pagar. O Estado precisa decidir se é melhor cobrar pelo tempo de benefício usufruído ou se, politicamente, o serviço prestado pela entidade tem mais valor que o tributo não pago."
Deputados questionam certificação e isenção de entidades
Deputados que participaram na quinta-feira (3 de abril) do debate da Comissão de Seguridade Social e Família ainda têm dúvidas sobre o Projeto de Lei 3021/08, do Poder Executivo, que transfere a certificação de entidades beneficentes do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) para áreas específicas dos ministérios da Saúde, da Educação e do Desenvolvimento Social. O presidente da comissão, deputado Jofran Frejat (PR-DF), disse temer que a transferência atrase os processos, porque uma entidade pode atuar tanto na educação quanto na saúde, por exemplo.
O deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) considera desnecessário estimular vagas em escolas privadas por meio de isenção fiscal, possibilidade aberta pelo projeto. Ele lembrou que, com a aprovação do Fundeb, é necessário trazer recursos para as escolas públicas. "A parte da educação deve ser retirada do projeto", apontou.
Já o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS) defendeu a concessão de benefícios fiscais na área da saúde. "A saúde quebra se houver um baque na filantropia."
Financiamento
Em resposta ao presidente da comissão, o ministro da Previdência, Luiz Marinho, disse que há diferentes opções para certificar entidades que atuam tanto na assistência quanto na saúde ou educação. Segundo ele, poderia haver um único CNPJ, com fiscalização interministerial; ou CNPJs distintos de áreas específicas da mesma entidade, para cada ministério fiscalizar o que lhe compete.
O ministro explicou que a proposta servirá para identificar as entidades de assistência social que atuam com seriedade. Marinho sugeriu aos deputados que apresentem emenda para regulamentar a compensação financeira ao Ministério da Previdência por causa da isenção da contribuição previdenciária do empregador dada às entidades filantrópicas. "Não cabe à Previdência financiar saúde, educação ou assistência social", disse o ministro. Ele ponderou ainda que não defende a retirada de recursos dessas pastas. Segundo Marinho, o Tesouro Nacional precisa definir quanto existe em cada orçamento anual para essa compensação.
Separação
O procurador do Ministério Público Federal Pedro Antonio de Oliveira Machado também questionou a classificação de instituições de educação e saúde que cobram pelos seus serviços como entidades de assistência social. Segundo ele, é preciso separar entidades beneficentes das que simplesmente prestam serviços de assistência social, opinião compartilhada pela presidente do CNAS, Simone Aparecida Albuquerque.
A concessão de bolsas de ensino foi citada como exemplo por Machado. Ele observou que algumas entidades, atualmente consideradas beneficentes, oferecem desconto de 50% no valor da mensalidade para famílias com renda superior a três salários mínimos (R$ 1.245). A exigência para a concessão de benefícios de prestação continuada da Previdência Social é de uma renda máxima de 1/4 do salário mínimo (R$ 103,75) por pessoa da família.
SUS
O procurador também questionou o critério de inclusão na filantropia de entidades que já são remuneradas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Ele afirmou que a solução para essas entidades pode estar na correção da tabela do SUS e não na concessão de benefícios fiscais.
Machado também teme dificuldades na análise de processos de assistência social pelos ministérios da Saúde e da Educação. Segundo ele, o Ministério da Previdência Social é o mais descentralizado e tem a maior estrutura jurídica dos três e, mesmo assim, não consegue responder a todos os pedidos. O procurador sugeriu que as entidades tenham de exibir seu certificado, facilitando a fiscalização da sociedade. E defendeu uma análise prévia da Receita Federal antes da concessão de benefícios fiscais.