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TCU mostra como cartel comandou fraude na saúde

Auditoria feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU) aponta a existência de um cartel no esquema que fraudava a compra de derivados de sangue pelo Ministério da Saúde. Segundo o tribunal, um grupo de laboratórios que participavam das licitações combinava preços, causando prejuízo aos cofres públicos, ”além de infração à ordem econômica”. Os acusados podem ter desfalcado o erário em R$ 2 bilhões. Quatorze suspeitos foram presos na última quarta-feira e outros dez estão sendo investigados. O TCU examinou as compras do ministério entre 1996 e 2003 e concluiu que o cartel foi desfeito em 2001. De acordo com os auditores, o fim da combinação de valores entre as empresas resultou numa queda de preços de 51% já em 2002.

Sangria combinada

Auditoria do TCU aponta a existência de cartel montado para vender derivados de sangue com preços mais altos ao governo

Lúcio Vaz

da equipe do Correio

Uma auditoria feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU) mostra como funcionava o esquema da máfia do sangue no Ministério da Saúde. Na quarta-feira, a Polícia Federal prendeu 14 suspeitos de participar da fraude. O prejuízo causado aos cofres públicos, desde o governo Fernando Collor, quando a sangria aos cofres públicos começou a ser montada, pode chegar a R$ 2 bilhões. Realizada para investigar a compra de derivados de sangue pelo ministério entre 1996 e 2003, a auditoria concluiu pela existência de um cartel entre os laboratórios que participavam das licitações. ”As empresas produtoras de hemoderivados estavam fixando, em acordo mútuo, preços e condições de venda, influenciando ou obtendo a adoção de postura uniforme entre os concorrentes e dividindo o mercado brasileiro entre os participantes até 2001”, diz o relatório do TCU.

A auditoria do TCU começou em março do ano passado, na mesma época em que a PF deflagrou a Operação Vampiro. Em fevereiro, os ministros do tribunal aprovaram o relatório, denunciando o esquema, e o encaminharam para que fosse investigado pelo Ministério Público Federal. Também enviaram cópia do documento ao Ministério da Saúde, à Câmara dos Deputados, à Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça e ao Conselho de Defesa Econômica (Cade).

O tribunal sustenta que o cartel se desfez em 2001, e que as empresas teriam partido para a ”competição”. Entre os acusados no inquérito feito pela Polícia Federal, porém, está o coordenador-geral de Logística do Ministério da Saúde, Luiz Cláudio Gomes da Silva, que chegou ao cargo na gestão do ministro Humberto Costa. Na casa do coordenador-geral, no Recife, a Operação Vampiro, da PF, encontrou o equivalente a R$ 208 mil em dinheiro vivo.

Os auditores relataram que o fim do cartel resultou numa queda de preços de 51% já em 2002: ”A concorrência se acirrou a tal ponto que uma das empresas – que havia perdido uma das concorrências – denunciou falhas nos certames 11/2002 e 12/2002”. O Ministério da Saúde realizou dois pregões, temendo pelo desabastecimento de hemoderivados. O preço caiu ainda mais, chegando a US$ 0,1814 a unidade, contra US$ 0,49 obtido na licitação de 2001.

Diferença mínima

Entre as evidências de formação de cartel, o TCU apontou a diferença mínima de preços entre os concorrentes. No caso da concorrência 06/99, foi de apenas US$ 0,0009. Na maioria dos casos, as diferenças de preços se situaram na casa milesimal e centesimal. As outras evidências apontadas: poucos recursos e impugnações entre os concorrentes, divisão dos itens licitados entre dois ou mais concorrentes, a existência de oligopólio no setor, domínio do mercado brasileiro por multinacionais.

Na investigação dos processos licitatórios, o tribunal encontrou falhas na publicidade dos atos do ministério e na apreciação dos recursos e impugnações. Nas concorrências realizadas em 2002, o edital de convocação dos concorrentes para a abertura das propostas de preços foi publicado no mesmo dia em que seria realizada a reunião. A convocação dos habilitados foi feita por meio de fax.

Mesmo constatando as irregularidades, o tribunal reconheceu que seria difícil punir as empresas estrangeiras. No relatório da auditoria, o TCU observa que a declaração de inidoneidade dos licitantes, apesar de ser uma medida legal, ”poderia ser extremamente danosa aos usuários desses produtos, principalmente aos hemofílicos do tipo A. Isso porque apenas tais empresas detêm a tecnologia para a produção desses produtos”.

Sobrepreço

A existência do cartel, segundo o TCU, pode ser comprovada a partir da realização de pregões para a compra de hemoderivados em 2002, para evitar o desabastecimento e conseqüente prejuízo aos pacientes hemofílicos. Abertas as propostas, venceu a empresa Baxter, com preço de US$ 0,183 a unidade. O preço mais elevado, da Octafarma, ficou em US$ 0,239.

Após a abertura das propostas de preços, foi aberta a possibilidade de apresentação de novos lances. Porém, nenhuma empresa apresentou propostas. Venceu a Baxter, com preço total de US$ 6,6 milhões. Confrontado com o valor obtido nas licitações anteriores, esse valor foi 56,43% menor. Essa redução mostra que as empresas estavam cobrando até 129,5% a mais que os preços de mercado.