A confusão é inevitável. Os nomes são parecidos e as duas doenças preocupam. Nas filas dos hospitais, quem procura atendimento para os filhos com suspeita de contaminação pelo rotavírus – que causa vômitos e diarréia -, não deixa de fazer uma associação com o hantavírus, mal que matou 11 brasilienses este ano. Mas os especialistas esclarecem que a única coincidência entre a rotavirose e a hantavirose é o fato de serem doenças causadas por vírus.
Os pais ficam em dúvida não apenas pelos nomes. Os sintomas e o modo de transmissão também confundem (leia quadro). As duas infecções causam febre, vômitos e diarréia. Mas os sinais mais característicos da hantavirose – levados em conta na hora do atendimento nos hospitais – são febre acima de 38 graus, dores no corpo e insuficiência respiratória.
As duas doenças são transmitidas pelo ar. A diferença é que a contaminação pelo hantavírus se dá quando a vítima inala aerossóis de fezes, urina e saliva contaminados. Foi por causa da poeira que a atendente de floricultura Josenita Gonçalves de Jesus, 28 anos, procurou atendimento ontem para a filha Ana Clara, de 1 ano e 3 meses, no Hospital Regional da Asa Sul (Hras).
”Além da terra, onde moro tem muito lixo espalhado”, justifica Josenita. Ela mora no setor de chácaras de Valparaíso II, uma região peri-urbana. A filha começou a ter febre alta no sábado. Depois vieram vômitos e diarréia. ”Tem uma virose atacando perto de casa. Na dúvida, preferi buscar atendimento para descartar a hantavirose. Estou com o coração na boca”, confessa. A menina, segundo os médicos, deve estar com rotavirose.
De acordo com a diretora da Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Saúde, Disney Antezana, não existem exames para determinar se a causa das diarréias é mesmo o rotavírus, em todos os casos. ”Começamos a fazer uma pesquisa por amostragem há um mês, para termos uma idéia. Hoje não é possível precisar a quantidade de casos da doença. Classificamos todas como doenças diarréicas”, explica. O diagnóstico é feito por meio do atendimento clínico e análise dos sintomas.
O desempregado Wantuil Henrique da Rocha Neto, 22, veio do Residencial São Francisco, perto de Santo Antônio do Descoberto, em busca de atendimento para o filho Ryan Henrique, de 1 ano e 2 meses, no Hras, na última segunda-feira. ”Primeiro, pensei que fosse gripe. Depois, lembrei do hantavírus. Tem ainda o rotavírus. Mas como os nomes são idênticos, achei melhor procurar avaliação”, conta o rapaz.
O menino tem vômitos e diarréia desde quarta-feira passada. Chegou a ser internado no hospital de Santo Antônio do Descoberto, na sexta. Depois do atendimento em Brasília, os pais ficaram mais tranqüilos. ”Ainda bem que é rotavirose. É uma doença que se pode controlar em casa”, diz a mãe, Ana Paula Silva, 19. Os médicos receitaram soro. Como o menino rejeita, o pai despeja o líquido na garganta da criança usando uma seringa.
Incidência
Levantamento epidemiológico da Secretaria de Saúde revela que foram registrados 77,1 mil casos de diarréia (não se classificam como número de pessoas atendidas, pois os pacientes podem retornar em busca de um novo atendimento) no ano passado, média de 192 casos por dia, somando-se todos os hospitais e centros de saúde.
Neste ano, foram computados 36.023 registros, até julho. O levantamento do mês de agosto está sendo revisado. Mas o mesmo estudo já mostra que a incidência maior de casos continua restrita aos meses de maio, junho e julho, a exemplo do ano anterior.
Em maio deste ano, foram registrados 5.414 casos. Em junho, 5.575, e em julho, 4.814. Porém, a especialista da Secretaria de Saúde não arrisca associar a incidência de rotavirose com o período de seca. ”Pode ser apenas uma coincidência. Precisaríamos de um estudo para confirmar essa informação”, justifica Disney Antezana.
A diretora de Vigilância diz que o rotavírus sempre teve muitos registros. Mas a doença chamou mais a atenção este ano, por conta do surto de hantavirose, que matou 11 brasilienses . Outras 15 pessoas sobreviveram ao ataque do vírus, transmitido por roedores silvestres.
Disney diz que o rotavírus causa desidratação. Já o hantavírus atinge os pulmões e tem uma taxa de letalidade de 40 a 60%. Não existe vacina. No entanto, o Ministério da Saúde estuda incluir quatro novas vacinas no calendário oficial do país a partir de 2005. Entre elas, a que pode prevenir o rotavírus. A avaliação é feita pela Secretaria de Vigilância.