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Ministro quer regras claras para definir os investimentos na saúde

     O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, corre contra o tempo para concluir o PAC da Saúde – um pacote de medidas para o setor hospitalar que remete ao Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) – ainda neste fim de semana. Previsto para ser entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na próxima terça-feira, o conjunto de propostas envolve reajuste da tabela do Sistema Único de Saúde (SUS), mais repasses para estados e municípios, melhoria no atendimento de urgência e emergência, liberação de verbas para reequipar hospitais universitários e a recuperação das santas casas. "Minha equipe trabalha furiosamente neste feriadão", disse ao Correio.     
     Temporão insiste que a regulamentação da Emenda Constitucional 29 é fundamental para melhorar o sistema de saúde pública do país. A medida prevê que os estados apliquem pelo menos 12% do total arrecadado em impostos na área de saúde. Hoje, apenas cinco estados conseguem tal proeza. Mas, mesmo entre esses que cumprem a determinação constitucional, o ministro diz que está havendo uma espécie de "contrabando" nas contas. "Os estados estão computando investimentos que nada têm a ver com saúde, como despesas com merenda escolar e pagamento de pensões", destaca.  
     Temporão rebate as críticas dos secretários estaduais de saúde, que chamaram os R$ 2 bilhões liberados pela União para conter a crise do Nordeste de "tapa-buraco". "Acho essa afirmação totalmente descabida", ressalta. "Se os governadores cumprissem sua parte, a situação não estaria como está hoje."
     
     O ministro reconhece que, ao depender de recursos de uma contribuição provisória – a CPMF -, o sistema de saúde do país se revela frágil. "Nenhum sistema pode depender de oscilações de receitas, como no caso da CPMF. Por isso, defendo a regulamentação da Emenda 29", afirma. A seguir, os principais trechos da entrevista.
     
     
     A conta é de todos   
     Os secretários de saúde estaduais e mesmo os médicos dizem que os R$ 2 bilhões liberados pelo governo federal não são suficientes para conter a crise. Consideram a medida um "tapa-buraco". Como o senhor vê essa crítica?     
     Acho essa afirmação totalmente descabida e feita por quem desconhece os números do governo. Na prática, eu já havia liberado R$ 220 milhões, que representam para 2008 um impacto no orçamento de R$ 570 milhões. Com os R$ 2 bilhões liberados agora, o somatório causa um impacto de cerca de R$ 4 bilhões só na cobertura dos atendimentos de alta e média complexidades. Tal valor representa 23% a mais do que foi repassado em 2006. Então, ninguém pode dizer que se trata de um recurso "tapa-buraco". O financiamento da saúde é tripartite. Se os governadores cumprissem a sua parte e aplicassem 12% da arrecadação, como determina a Emenda Constitucional 29, essa conta não viria para o governo federal. E a situação não estaria assim.
     
     Os governadores alegam que a lei é injusta ao determinar que os estados apliquem 12% da arrecadação em saúde, enquanto a União, que arrecada muito mais, destina apenas 7%.
     
     Quem determina esses percentuais é a lei. A Emenda 29 diz que o orçamento do Ministério da Saúde é reajustado tomando como base o valor executado no ano anterior corrigido pela variação nominal do PIB (Produto Interno Bruto). O governo federal está cumprindo a sua parte. Não é uma questão de ser justo ou injusto. Essas são as regras.
     
     O que vai mudar com a regulamentação da Emenda 29?
     
     Primeiro, vamos obrigar que estados e municípios cumpram o investimento em saúde determinado pela lei. Também vamos definir, de uma vez por todas, o que são os serviços de saúde. Hoje, alguns estados dizem que aplicam os 12% no setor. Mas, quando a gente vai ver, está contabilizada uma série de gastos que não têm nada a ver com saúde, como pagamentos de pensões e aposentadorias, assistência à saúde de clientela fechada, como os hospitais da Polícia Militar. Isso é um contrabando. Os estados também computam, como gastos de saúde, saneamento básico, limpeza urbana, ações de assistência social não vinculada ao SUS e até merenda escolar. Com a regulamentação da Emenda 29, isso vai acabar. Saneamento básico só pode entrar como gasto de saúde em municípios com menos de 50 mil habitantes.
     
     Governadores dizem que não conseguem cumprir a emenda porque gastam boa parte da arrecadação pagando dívidas com a União. Como cobrar investimentos na saúde?
     
     A discussão que envolve dívidas dos estados com o governo federal transcende o Ministério da Saúde. Se os governadores têm problemas com pagamento de dívidas com a União, sugiro que eles procurem o Ministério da Fazenda.
     
     Eles começaram a reclamar dessas dívidas depois que o senhor jogou parte da responsabilidade da crise na saúde nas costas deles.
     
     Eu tinha que jogar responsabilidade para os estados porque a conta não é só do governo federal. Existe uma lei que tem que ser cumprida. O SUS foi construído a seis mãos – governo federal, estados e municípios. Por que numa crise como essa só o governo federal tem que comparecer com recursos adicionais? Não me parece justo.
     
     No chamado PAC da Saúde, quanto está previsto de investimentos?
     
     Estou fechando o PAC da saúde até a terça-feira. Como se trata de uma discussão aberta dentro do governo, só posso divulgar esses números depois que tiver sido batido o martelo em relação ao volume de recursos. Posso adiantar que estou pedindo mais porque estou trabalhando em cima de propostas novas, como reajuste da tabela do SUS, mais repasses para estados e municípios, melhora do atendimento de urgência e emergência, liberação de recursos para reequipar hospitais universitários e recuperar as santas casas. Isso tudo envolve um volume financeiro adicional que não saberia dizer agora quanto é. Minha equipe trabalha furiosamente neste feriadão para fechar as contas.
     
     Em maio, o senhor disse que o PAC da Saúde estaria pronto em julho. Por que o atraso?
     
     É muito complicado elaborar um projeto desse porte. Precisa-se ter uma avaliação muito refinada da realidade. Além disso, estou tentando evitar que se tenha um conjunto de projetos bem intencionados que não se articulem. Isso evita que se tomem decisões equivocadas em momentos de crise, a médio e longo prazo. As medidas propostas têm que ser integradas. Ou seja, envolvem outros ministérios. E precisam ter capacidade de consolidar o Sistema Único de Saúde mais na frente. Por isso a demora.
     
     Com a crise da saúde no Nordeste, houve alguma modificação no PAC?
     
     Não. A crise no Nordeste foi desencadeada por uma greve em determinadas especialidades médicas e em alguns estados. As questões crônicas do sistema público de saúde, como a superlotação das emergências e a falta de recursos financeiros para encurtar o tempo de espera por uma consulta especializada, ou para uma consulta eletiva, foram trazidas a público por um movimento de especialistas do Nordeste. Mas isso não teve impacto no desenho das estratégias do PAC.
     
     O dinheiro liberado não é recurso novo. Os R$ 2 bilhões estavam previstos no orçamento deste ano. Não há risco de, ao gastá-lo agora, criar um problema no futuro?
     
     Ao chamarmos esses recursos de emergenciais, houve um erro de interpretação. Não foi um dinheiro tirado lá da frente. Ele estava no orçamento, mas encontrava-se contingenciado. Trata-se de um recurso novo que vai entrar e que será incorporado ao orçamento do ano que vem.
     

     O senhor disse que a CPMF é fundamental para a Saúde e que o setor entrará em colapso, caso seja extinta. Isso não revela o quanto o sistema de saúde pública do país é frágil, já que depende de uma contribuição provisória?

     
     Você tem razão. Nenhum sistema de saúde pode depender de oscilações de receitas, como no caso da CPMF. Por isso, defendo que regulamentemos a Emenda Constitucional 29. Saberemos assim com quantos recursos poderemos contar nos próximos 10 anos. E poderemos planejar como crescer e ampliar coberturas e dar qualidade ao sistema de saúde.
     
     Isso é impossível hoje?
     
     Sem a CPMF é impossível. Cem por cento dos recursos que são repassados para alta e média complexidade dos estados e municípios vêm dessa receita. Hoje, o orçamento da saúde tem quatro grandes fontes e uma das principais é a CPMF. Sem essa contribuição, a saúde perde R$ 16 bilhões por ano. Esse dinheiro teria de vir de algum outro lugar. Mas o governo afirma que não tem de onde tirar.