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Saúde: Crise ameaça se espalhar pelo país

Enquanto a crise na saúde se alastra do Nordeste para outras regiões do Brasil, a Emenda 29, que define os porcentuais mínimos de recursos a serem investidos em saúde, aguarda regulamentação na Câmara dos Deputados há dois anos, mas não encontra lugar na pauta de votações, reclama o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), presidente da Frente Parlamentar de Saúde. O problema não é recente. Ganhou espaço na mídia nos últimos meses com as mortes de pacientes que aguardavam atendimento, mas a Federação Brasileira de Hospitais (FBH) garante que faz o alerta de um possível apagão da saúde há pelo menos dez anos. Eduardo de Oliveira, presidente da FBH, lembra que há um ano foi enviado um documento ao governo federal reforçando esta preocupação. “Nós esperávamos medidas, mas não vimos quase nada”, conta Oliveira.

Por isso as recentes greves de médicos no Nordeste não surpreendem o presidente da FBH. Segundo ele, todos vinham reclamando da tabela de remuneração do Serviço Único de Saúde (SUS). “São dez anos sem reajuste significativo”, completa. Oliveira diz que seria necessário aplicar, imediatamente, uma correção de 40% a 50% para recuperar, minimamente, o valor pago pelos procedimentos. Muitos têm defasagem de 100% a 150%, de acordo com o presidente da FBH.
Oliveira é formado há mais de 30 anos e durante 15 anos se dedicou à cirurgia geral. Quando passou a atuar na administração hospitalar, acabou migrando para as entidades de classe. Com sua experiência, ele afirma que o problema da saúde hoje é similar em todo o país. Para ele, a situação parece mais grave no Nordeste porque nas capitais menores o hospital está mais próximo dos gestores públicos e aí a reivindicação da categoria passa a ter um poder maior e este clamor aparece mais. “O fator humano fala mais alto”, diz.

Sem cura

Para o presidente da Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde no Paraná (Fehospar), Arthur Leal Neto, o SUS é uma das mais importantes conquistas da sociedade brasileira, mas, segundo ele, está na hora de se rediscutir o princípio da universalidade, porque o poder público jamais conseguirá destinar os recursos necessários para garantir serviços de qualidade e amplo acesso. Leal Neto, que também é vice-presidente da Confederação Nacional de Saúde, afirma que a melhor alternativa para desafogar o sistema público é estimular o crescimento do segmento suplementar. O presidente da Fehospar defende, ainda, a imediata regulamentação da Emenda 29, “sobretudo para que haja transparência nos gastos em ações efetivamente de saúde nas três esferas de governo”.
O deputado Darcísio Perondi, médico há 32 anos, aposta na Emenda 29 como solução para a crise na saúde, o que só deve ocorrer em 2008 se a lei for regulamentada. Qualquer valor liberado agora, completa, “estanca a hemorragia, mas não cura o paciente”. Segundo ele, a regulamentação vai representar aumento de R$ 15 bilhões no Orçamento da União para a saúde. Também se todos os estados cumprirem a legislação e destinarem 12% para a saúde, serão mais R$ 5 bilhões. Para o deputado, se isso se concretizar, “em menos de um ano a situação se normaliza”. Hoje, somente sete estados e o Distrito Federal aplicam mais de 12% em saúde.

 

MP aponta déficit de R$ 1,7 bi no Paraná entre 2000 e 2005

 

O Ministério Público do Paraná, por intermédio da Promotoria de Defesa da Saúde Pública de Curitiba, já ajuizou quatro ações pedindo que o governo do Paraná cumpra a Emenda 29 e integralize os valores que deveriam ter sido aplicados em saúde no período de 2000 a 2005. Relatórios de auditoria elaborados pelo Ministério Público do Paraná e pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (SUS) mostram que há um déficit entre o que é aplicado em saúde pelo estado e o que deveria ser aplicado, segundo a legislação. Neste período, o déficit acumulado é de R$ 1,796 bilhão.
A promotora Luciane Maria Duda lembra que a primeira ação foi ajuizada em setembro de 2003. De acordo com ela, a ação aguarda, desde dezembro de 2004, o despacho do juiz. A reportagem procurou o Tribunal de Justiça na quinta-feira para saber o motivo deste tempo de espera por um resultado da ação. Segundo a assessoria de imprensa, a resposta deveria ser dada, preferencialmente, pelo presidente da instituição, o desembargador José Antônio Vidal Coelho, mas ele não estava no Tribunal de Justiça naquele dia. Até o fechamento desta reportagem, às 16h30, outra pessoa também não havia sido designada para explicar o caso.
O promotor Marcelo Paulo Maggio diz que o Estado não teria capacidade de honrar o déficit de R$ 1,796 bilhão de uma só vez. Por isso os promotores pedem que o ressarcimento seja gradativo. Ele lembra que os relatórios de auditoria chegaram a este valor porque, também, subtraíram do valor aplicado as quantias referentes a ações que não são específicas de saúde.
Para Maggio e Luciane, o Conselho Estadual de Saúde deveria acompanhar a aplicação dos recursos. O problema, segundo eles, é que o Conselho não recebe o Orçamento em tempo hábil de analisar e sugerir alterações, se considerar necessário.

Análise
O presidente do Conselho Estadual de Saúde, R.M. Machado, que está no cargo desde o ano passado, afirma que em 2006 e neste ano o órgão não recebeu o Orçamento para análise. Dentro do Conselho existe até uma comissão encarregada de fazer este controle: é a de Acompanhamento e Avaliação do Orçamento. “Nós deveríamos receber o Orçamento antes que ele fosse para a Assembléia Legislativa”, diz o presidente.
Machado lembra que o Conselho Estadual de Saúde, que está atuando desde 1994, é o controle social em ação. É a forma de participação da sociedade nas decisões do governo. De acordo com ele, a “ânsia do Conselho Estadual de Saúde é de que haja a imediata regulamentação da Emenda 29 para que possa haver uma cobrança mais efetiva da aplicação dos recursos.”

 

Estado garante que cumpre a legislação

 

 

Procurada pela reportagem da Gazeta do Povo, a Secretaria da Saúde do Paraná encaminhou uma nota reafirmando que o Estado cumpre a legislação e aplica 12% do orçamento em saúde. “A Emenda Constitucional 29, que reza sobre o porcentual mínimo do orçamento a ser investido em cada esfera de poder, ainda não está regulamentada e por isso abre brechas para discussões intermináveis sobre o que é gasto com saúde e o que não é. A falta desta regulamentação é que abre espaço para interpretações diferentes, de acordo com cada vertente teórica da saúde pública”, explica a nota.
De acordo com o governo do Paraná, “o chamado vetor saúde, que agrupa os gastos com saúde, é a parte do orçamento que soma todas as despesas com a área e é este vetor que soma os 12% do orçamento, organizado pela Secretaria de Estado do Planejamento e executado por diversas secretarias, entre elas a Saúde. Dentro deste vetor está o orçamento da Secretaria de Estado da Saúde, que somou em 2004 R$ 437,66 milhões e que foi executado quase em sua totalidade, chegando à marca dos 95%.”
A nota lembra, ainda, “que em 2003, o orçamento deixado pelo governo anterior era de R$ 253,22 milhões. Este valor era R$ 80 milhões menor do que em 2002, último ano da gestão que nos antecedeu. O novo governo, assim que assumiu, decidiu colocar R$ 5 milhões mensalmente durante este primeiro ano de mandato para recuperar os investimentos em saúde.” Segundo a Secretaria da Saúde, em 2005 o investimento foi de R$ 525,68 milhões, “chegando ao atual orçamento de R$ 581,10 milhões, que é o maior dos últimos anos.”
“Portanto, reafirmamos que justamente devido à ausência de uma lei que faça essas definições é que existem tais discussões e o Paraná apóia a regulamentação, participando em várias oportunidades em Brasília junto às forças políticas para discutir o tema e lutar pela regulamentação da Emenda. Devido à questão, o governo do Paraná e a Secretaria da Saúde, assim como todos os gestores de saúde pública do Brasil, lutam para que a regulamentação da Emenda Constitucional 29 seja consolidada, e com isso os critérios para definir o que é gasto em saúde, e que não fiquem dúvidas para toda a população, gestores, sociedade civil e órgãos fiscalizadores”, conclui a nota da Secretaria da Saúde.