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No SUS, espera demora mais que internação

Estudo mostra que na rede pública paciente aguarda 6,2 dias para ficar 5,7 dias internado; tempo cai na rede privada credenciada

Um estudo inédito revela que, nos hospitais públicos credenciados pelo SUS (Sistema Único de Saúde), o tempo de espera para internação é de 6,205 dias, mais do que o próprio período de internação, estimado em 5,7 dias.

A pesquisa, realizada pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), indica que, nos hospitais públicos credenciados ao SUS, em média 69.088 pessoas ficam por dia na espera de internação, mais do que o número médio de pacientes que conseguem ser internados diariamente (59.432).

A análise foi elaborada com dados de 2003. Segundo o Ipea, só no ano passado o SUS foi responsável por 11.638.447 internações em 5.864 hospitais públicos, privados, universitários, além de clínicas médicas e cirúrgicas. Foram utilizados 441.591 leitos.

Criado pela Constituição de 1988, o SUS garante assistência universal e igualitária a todos os cidadãos por meio de parcerias do governo federal com Estados, municípios e iniciativa privada. O Ministério da Saúde calcula que o SUS hoje responda por cerca de 80% das internações no país.

Rede privada credenciada

Somando todos os serviços do SUS, incluindo os prestados pela rede privada, os números não são tão desfavoráveis quanto os registrados pela rede pública, mas também preocupam, segundo o autor do trabalho, o pesquisador Alexandre Marinho.

Incluindo a rede privada no SUS, o tempo médio de espera para internação cai para 4,426 dias, e o período de internação fica em seis dias aproximadamente.

Segundo a pesquisa do Ipea, a possibilidade de um paciente esperar mais de um dia para ser internado pelo SUS é de 39,3%.

“O ideal é que a internação ocorresse no mesmo dia. Como essa média calculada não é separada por especialidade de atendimento, uma pessoa que precise esperar quatro dias na emergência pode morrer antes de ser internada”, disse o pesquisador.

Faltam dados oficiais

Marinho afirmou que o problema das filas não é exclusivo do Brasil. No entanto, segundo ele, países como o Reino Unido, por exemplo, tratam do caso com “mais esforço” do que aqui.

“Em outros países, o governo publica os dados sobre filas. No Brasil, o Ministério da Saúde não os disponibiliza”, declarou.

Marinho disse que a questão das filas nos hospitais é um macroproblema, que não é tratado de forma rigorosa.

A pesquisa revela que também nos hospitais universitários e nos da iniciativa privada a tendência é que os pacientes não consigam ser internados no mesmo dia.

No entanto, ao contrário do que acontece na rede pública, o tempo médio de internação é maior do que o período de espera.

Nos hospitais da rede privada credenciados ao SUS, por exemplo, o período médio das internações é estimado em 5,9 dias, superior ao do calculado para o tempo de espera, que é de 3,904 dias.

Sudeste

Por ser a região com maior concentração populacional no Brasil, o Sudeste sofre mais com o problema das filas nos hospitais do que as demais áreas. Em 2003, a região respondeu por 38,1% das internações pelo SUS.

Segundo o Ipea, o tempo de espera na fila em hospitais do Sudeste -estimado em 6,589 dias- é o dobro dos prazos verificados nas regiões Norte e Centro-Oeste e 53% maior do que a espera registrada no Sul.

Marinho declarou que o problema das filas pode trazer conseqüências graves, não só para os pacientes como também para o próprio sistema.

“Esperar nas filas traz dor e sofrimento para o paciente e a família, perda de renda e compromete a visão que o cidadão tem sobre o sistema”, analisa.

Para ministério, dados estimados podem não mostrar a realidade

DA SUCURSAL DO RIO

Encarregado pelo Ministério da Saúde para comentar a pesquisa do Ipea, o secretário de Atenção à Saúde, Jorge Solla, declarou que os dados podem não representar a realidade porque a análise só se utilizou de três números reais: o total de internações, o tempo médio das internações e a quantidade de leitos.

Segundo ele, o tempo médio de espera para internação e a média de pacientes por dia nas filas são apenas dados estimados que foram obtidos por meio de cálculos matemáticos próprios. “Há uma limitação. Por isso, em termos quantitativos, não podemos dizer que a pesquisa demonstra a realidade”, disse. Ele admitiu que o ministério não dispõe de dados reais sobre o tempo que uma pessoa leva para ser internada em hospitais credenciados pelos SUS porque depende de informações passadas pelos municípios -nem todos repassam.

O secretário, no entanto, elogiou a pesquisa. De acordo com ele, o trabalho será importante para efeitos de planejamento, administração e gestão do sistema.

Sobre a situação mais problemática nos hospitais públicos, Solla afirmou que ela tem relação com o fato de o número total de leitos ser menos da metade do que nas unidades privadas.

Solla disse que, para tentar resolver o problema das filas, o ministério investe na ampliação da assistência médica básica, emergencial e ambulatorial.

Uma das iniciativas foi o aumento, no ano passado, da verba para o programa Saúde da Família e a incorporação de 2.255 novos leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva). (MHM)

“Estou quase caindo no chão”, diz paciente

DA SUCURSAL DO RIO

Eles chegam cedo, enfrentam filas, mas as chances de frustração são maiores do que de atendimento nos hospitais públicos do Rio de Janeiro.

É o caso do autônomo José Augusto Gouveia, 43. Há duas semanas, ele começou a sentir fortes dores nas costas e nos braços. Morador do município de Duque de Caxias (Baixada Fluminense), Gouveia buscou atendimento em hospitais da região. Não conseguiu vaga em nenhum deles.

Na manhã de ontem, por volta das 6h, estava na fila do pronto-socorro do hospital Souza Aguiar (centro do Rio), um dos principais da cidade. Às 13h, ainda não tinha sido atendido. À sua frente havia, pelo menos, 20 pessoas à espera de um médico.

“Preciso ir a um ortopedista, tirar raio-X para saber o meu problema. Vou ficar aqui até de madrugada se for preciso. Não tenho dinheiro para pagar uma consulta”, disse.

Enquanto esperava, Gouveia não conseguia ficar parado. O autônomo dizia estar sentindo muitas dores. “Estou quase caindo no chão”, afirmou.

Exame

No hospital do Andaraí (zona norte do Rio), Onila Souza, 92, chegou às 7h para pegar o resultado de um exame de urina. Ao meio-dia, estava na fila para mostrar o resultado para o médico, só que atrás de outras 50 pessoas que também receberiam consulta.

De família carente e moradora do bairro onde fica o hospital, Ondina foi a pé de sua casa porque não tinha dinheiro para a passagem de ônibus.

Situação crítica também viveu a empregada doméstica Maria do Carmo de Lima, 57. Na noite do último domingo, ela conseguiu que o marido Severino Ferreira de Lima, 55, que já sofreu seis derrames e tem o lado direito do corpo paralisado há dez anos, fosse atendido na emergência.

Ontem, entrou em desespero porque o hospital informou que não poderia manter o marido internado por falta de vagas e lhe daria alta.

“Não tenho dinheiro para mantê-lo em casa. Tenho que comprar fraldas e sondas. Ele tem que ficar internado”, declarou a empregada doméstica. (MHM).