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RJ: Médicos vivem crise ética

Vale rememorar o registro, no livro de ocorrência do plantão de um importante hospital do Rio de Janeiro, o Andaraí, onde um médico que atendeu a uma criança relatou as suas dificuldades. “A menor, graças exclusivamente a Deus, melhorou e ao que parece não necessitará de assistência ventilatória. Aí eu pergunto, e se piorar, o que fazer? Reza forte? E se Deus der uma cochilada? E se acabar o oxigênio celestial, vamos ficar olhando as crianças virarem anjos? A realidade é que não temos suporte técnico e nem pessoal para oferecer assistência ventilatória infantil… No mais, é só brincar de médico e rezar, mas rezar muito, como fiz das 3h até as 7h20m, e felizmente Deus ouviu minhas preces. Sinto-me agradecido.” Duas horas mais tarde, no plantão seguinte, outro médico registrava o falecimento da criança. Sabemos que situações iguais a essa se repetem a toda hora, onde o poder público é um insensível espectador.
Os médicos que exercem com dignidade e respeito a sua profissão, tentando dar o melhor de si para os seus pacientes, vivem hoje uma crise ética sem precedentes. Depois de um longo tempo estudando medicina nas faculdades e sendo preparados para salvar vidas, neste contexto crítico, às vezes assistimos impotentes à morte dos nossos pacientes. O Código de Ética Médica, aprovado em 1988 pelo Conselho Federal de Medicina, normatiza e fiscaliza o exercício profissional, estabelecendo direitos e deveres. Hoje, estabeleceu-se um grave conflito: vemos de um lado a obrigação de cumprir esse estatuto e de outro a crise da saúde pública impossibilitando a sua aplicação. É neste contexto que nós, médicos, temos assistido a nossa população.
A justa remuneração do nosso trabalho, garantida no Código de Ética, parece um sonho distante em conseqüência das políticas de recursos humanos que nos exploram, usando o mentiroso argumento da insuficiência de verbas. No setor privado, tanto os salários como a indigna remuneração das tabelas dos planos e seguradoras de saúde estabelecem valores aviltantes para garantir o crescente lucro do setor. O artigo 23 do código dá ao médico o direito de recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar o paciente. Ainda assim, nossa opção diante da responsabilidade tem sido de insistir na assistência à população. Não sabemos por quanto tempo mais suportaremos tal desafio.
Como seres humanos, a nossa saúde tem sido seriamente comprometida. Hipertensos, cardiopatas, distúrbios digestivos, depressão, suicídio, são exemplos de como adoecemos.
Não temos mais tempo a perder. O nosso grito de alerta tem por objetivo fazer valer o que a lei estabelece como direito e dever e o motivo maior é o respeito e a valorização da vida dos nossos pacientes. Essa tarefa não é só dos médicos, mas principalmente das nossas autoridades, que a tudo assistem e nada fazem. (Jornal do Brasil – Jorge Darze, Presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro)