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Tudo sobre o movimento contra a contratualização e extinção do Código 7 no RS

Informações insuficientes e nenhuma discussão que possibilite a tomada de decisão sustentável por parte de hospitais e médicos. Assim, o Fórum das Entidades Médicas e Hospitalares em Prol da Saúde está avaliando a contratualização do SUS que muda radicalmente a relação até aqui estabelecida: os hospitais passam a gerir todos os recursos do Sistema, incluindo o pagamento dos médicos. Válido para os filantrópicos nesta fase, o programa prevê a destinação de R$ 200 milhões às instituições que aderirem ao sistema. Na adesão, a instituição recebe 40% do valor definido, de acordo com a produção paga por internações na média complexidade, no ano-base de 2004. O residual de 60% será dividido em doze meses.

“Acaba o Código 7”, afirma a coordenadora geral de Atenção Hospitalar do Ministério da Saúde Karla Larica. "O médico terá de resolver sua relação com o hospital", define a técnica, de Brasília. "A contratualização é uma normativa que está na lei do SUS. Os hospitais são prestadores de serviço e tem que normatizar, é um contrato como qualquer outro", acrescenta.

Adiretora do Departamento de Assistência Hospitalar e Ambulatorial da Secretaria da Saúde do RS, Aglaé Regina da Silva, informa que o Estado só vai contratualizar os municípios que não estão na plena. Dos 355 hospitais no RS vinculados ao SUS, só 78 têm registro de filantropia em vigor; destes, o Estado é responsável pela contratualização de 61.

O prazo final para a contratualização dos filantrópicos era o dia 25 de julho.

As Portarias

PORTARIA N 1.721/GM DE 21 DE SETEMBRO DE 2005 – Cria o Programa de Reestruturação e Contratualização dos Hospitais Filantrópicos no SUS.

PORTARIA N 172/GM DE 26 DE JANEIRO DE 2006 – Homologa processo de adesão ao Programa de Reestruturação e Contratualização dos Hospitais Filantrópicos no SUS.

 

 

PORTARIA N 635/SAS/MS, DE 10 DE NOVEMBRO DE 2005 – Estabelece o Regulamento Técnico para implantação e operacionalização do Programa de Reestruturação e Contratualização dos Hospitais Filantrópicos no SUS

PORTARIA N 284/SAS, DE 18 DE ABRIL DE 2006

– Define o fluxo para operacionalização da Contratualização do Programa de Reestruturação e Contratualização dos Hospitais Filantrópicos SUS.

 

A contratualização traz uma série de ameaças

• A remuneração dos médicos ficará na dependência da administração dos recursos do hospital (sempre insuficientes);

• Se faltar dinheiro a prioridade será para a comida dos pacientes, raio-X, exames, medicamentos, etc.;

• É possível que o hospital contrate médicos por CLT no número suficiente para atender as suas demandas e aqueles que atendiam demandas do plantão, do consultório, etc. perdem pacientes e oportunidades;

• O médico perde autonomia porque deverá seguir as normas do hospital quanto aos tipos de medicamentos, exames e procedimentos de acordo com a planilha de custos;

• O risco de erros aumenta e de processos também e a responsabilidade é do médico que atende e gerencia o tratamento do paciente; e

• O médico não foi chamado para discutir ou opinar sobre o contrato que define a sua atuação.

 

 

 

Desrespeito aos prestadores e usuários dos serviços

Nos últimos tempos o Ministério da Saúde tem orquestrado uma série de peripécias tentando parecer que faz alguma coisa em prol do atendimento aos doentes brasileiros originando várias orientações, com um mesmo direcionamento: a desconsideração e o desrespeito aos médicos.

A tentativa de anexar a recém-criada residência multiprofissional à residência médica e a instituição das práticas alternativas e complementares, permitindo a outros profissionais realizarem procedimentos que necessitariam de conhecimento médico, são alguns exemplos. Parece que as autoridades fecham os olhos para os riscos quando submetem a população a tratamentos sem um diagnóstico correto – prerrogativa do médico -, mostrando uma tendência de confundir a opinião pública ao disponibilizar maior número de alternativas, porém inconsistentes, inseguras e, muitas vezes, inefetivas.

A notícia mais recente até parece performance de um serviço secreto pois diz respeito a um número, o código sete, cuja extinção, aparentemente simples, repercutir de modo significativo no exercício profissional e no rendimento dos médicos.

Com o nome de contratualização, o Ministério passaria a transferir valores fixos (os mesmos e insuficientes de sempre) aos hospitais que assinassem os contratos que, por sua vez, seriam responsáveis pelo pagamento dos médicos. Com esta imposição superior, os hospitais dizem-se estar diante de duas alternativas: ou assinam e recebem 40% do orçamento anual antecipado (uma espécie de mensalão para induzir á concordância), ou sofrerão o corte no repasse das verbas (uma ameaça de calote depois do serviço cumprido).

E os médicos? Nunca foram chamados a discutir ou opinar sobre coisa alguma. Parece que o sonho ministerial (e, infelizmente, de alguns hospitais) é tratar doentes sem médico. Como isso não é possível ainda "toleram" a profissão, mas não permitem a sua participação nas decisões e a menosprezam. Se pudessem, os médicos alertariam para os riscos à população quando se tenta reduzir ainda mais a destinação de recursos para os atendimentos; se tivessem oportunidade, diriam que o governo tem mais é que aprovar a regulamentação da PEC 29 que determina o aumento das verbas para a saúde; se fossem ouvidos, opinariam que o ministério, ao demonstrar maior preocupação com a doença que com a saúde, deveria ser mais consistente em suas ações preventivas ou mudar o nome para "ministério da doença".

Fehosul quer debate responsável e dilatação dos prazos

Uma imposição constrangedora, que não está levando em conta repercussões sociais e econômicas negativas que surgirão por sérios problemas na gestão dos recursos públicos da Saúde.

É Assim que a Federação dos Hospitais do Rio Grande do Sul (Fehosul) entende como o Ministério da Saúde está conduzindo a contratualização pelo SUS.

Para o presidente Cláudio Allgayer, não foi permitido tempo adequado aos médicos, hospitais e prestadores de serviços para formatarem decisão responsável frente às futuras normas e portarias. Nem espaços de negociação para repactuar diretrizes.

"Tão importante revolução gerencial e assistencial não veio precedida da natural capacitação prévia dos agentes envolvidos. Invariavelmente, todos os hospitais estão pressionados a assinarem os pré-contratos em função dos prazos estabelecidos. Mas os gestores não têm nenhuma idéia sobre os procedimentos operacionais a serem adotados. E o

Ministério ainda liberou R$ 200 milhões para conquistar, por aliciamento de um prêmio antecipado, instituições que estão em péssimas condições financeiras e não podem abrir mão dos recursos do SUS. Isso é, no plano ético, a pior solução", adverte. No entanto, a Fehosul não é contra a contratualização em si, mas à postura do governo federal, sustenta Allgayer. "Se as objeções que estão sendo levantadas pelas entidades puderem ser acolhidas, e isso significar mudanças, a Federação poderá aceitar o novo sistema que daí virá".

Item imprescindível para a Fehosul é que médicos continuem recebendo diretamente do Ministério da Saúde. "Se o hospital passa a ser gerenciador dos recursos, ele vai ser obrigado a empregar médicos. E irá contratar pela CLT, impondo horário fixo e pagando o piso da categoria. E ao invés do médico atender pacientes agendados, o hospital irá colocá-lo no atendimento de todos daquela jornada", critica ele, colocando a situação como "retrógrada".

Allgayer também teme pela desassistência em um regime mal elaborado, pelo estímulo à permanência indevida do paciente no leito. Por pressão financeira e por já ter recebido a totalidade do repasse, o hospital poderá dar preferência em manter internado o paciente estabilizado mas não curado, ao invés de atender um novo em estado grave, que obrigaria execução de novos procedimentos. "Prestando mais ou menos serviços, a quantidade de recursos será a mesma, pensariam os gestores". Ele explica que problemas assim foram constatados em países europeus, como a França, que adotaram orçamentação global no final da década de 70, mas que atualmente estão introduzindo mecanismos de mercado para contrabalançar os problemas da contratualização.

Caridade de Ijuí: muda a lógica do trabalho

O que muda na relação dos hospitais com o SUS? A lógica de trabalho, responde o administrador do Hospital de Caridade de Ijuí, João Luiz Sena, em meio a imersões com sua equipe sobre o processo de contratualização. "Não é mais a lógica da produção e sim a do cumprimento de metas quantitativas (cirurgias, internações de crianças, politraumatizados, etc. com um teto físico) e qualitativas (atenção à saúde, rol de metas, participação nas políticas prioritárias do SUS, gestão hospitalar, desenvolvimento profissional). Tudo será monitorado através de indicadores para ver se atingimos as metas", detalha.

Deixando claro que não há outra alternativa senão contratualizar, Sena explica que, ancorados na Federação, os hospitais filantrópicos estão discutindo com a SES vários pontos polêmicos. Ele destaca:

 

 

Indexador que garante reajustes: "nos modelos que recebemos não há".

Defasagem da tabela: "até aqui a tabela remunera o hospital em 51%; o prejuízo é de 49%".

Repasse dos honorários médicos: "se não há justiça na remuneração vigente, os valores serão os mesmos que o hospital vai pagar".

Relação com os médicos: Fica extinto o código 7. “Nosso hospital tem poucos médicos pelo código 7, apenas 11 profissionais", explica. A grande maioria recebe pelo código 4 – honorários e SADT – em que tudo vem para a conta do hospital e este repassa ao médico. Parte é pela CLT – 15%; e 80 % são autônomos ligados a uma pessoa jurídica que é a Sociedade de Estudos, Pesquisa e Assistência Médica.”

Federação dos Filantrópicos: só mudança de gestão, sem melhora

A Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos do RS considera a contratualização uma evolução do Sistema. Mas diverge da condução, pois os orçamentos globais de cada hospital estão sendo elaborados de acordo com a equação negativa: de cada R$ 100,00 em serviços para o SUS, os hospitais recebem R$ 60. E, para a Federação, isso não mudará no novo modelo. É preciso reajustar as tabelas para, depois, discutir os contratos. Além disso, o superintendente da entidade, Jairo Tessari, alega que não existem cláusulas para reajustes, como estabelece legislação, e ele reivindica essa garantia. Diz também que não contempla possibilidade de revisão se houver aumento de atendimentos. "No modelo atual de AIHs, os procedimentos acima das cotas estabelecidas geram laudos que podem ser negociados posteriormente com o gestor. Com a contratualização isso não será mais possível", situa.

Até agora nenhum assinou o contrato final. Os 78 hospitais que se candidataram, cumprindo os critérios de seleção, passaram a discutir os Planos Operativos com os gestores. Porém, a confusão de responsabilidades dificulta as negociações. "A aplicação dos Planos surgiu de pacto entre as três instâncias do Sistema (União, Estados e Municípios) e ficou estabelecido que 100% dos prestadores de serviços deveriam ser contratualizados. Como a estrutura dos contratos foi estabelecida pelos gestores, eles é que deveriam conduzir a construção dos Planos junto aos hospitais, que na prática estão trabalhando sozinhos na elaboração", adverte. Tessari argumenta que os hospitais candidatados são referências regionais e para que Planos Operativos espelhassem os serviços que realizam, todos os municípios satélites deveriam participar. "Quem tem feito a elaboração é somente o hospital, baseado nos dados do Data-SUS referentes a procedimentos realizados durante o ano passado e que estão disponíveis na internet", informa.

"O problema é sério, por que uma instância de gestão [União] é quem estabeleceu regras da contratualização e outra [Estado] está fechando os convênios. É complicado negociar com uma que diz que está cumprindo a determinação de outra que nem sequer participa da negociação", acrescenta. Outra questão complicada para a Federação é que os hospitais devam assumir os honorários do corpo clínico e dos prestadores de serviços. Não seria problema se tivessem condições de remunerá-los de forma justa. "Acontece que a reivindicação dos médicos é a mesma dos hospitais: larga defasagem das tabelas. A Federação defende que a contratualização seja feita com manutenção de remunerações dos profissionais através do código 7", reivindica Tessari.

 

Contrato global é imoral e ilegal

O SUS não cumpre o preceito legal de cobrir integralmente o tratamento do paciente, inclusive o medicamentoso, e a contratualização resultará em conflitos éticos para o médico.

O alerta é do Dr. Bruno Wayhs, da Comissão do SUS do Conselho de Representantes da Amrigs. Profundo conhecedor do intrincado Sistema, ele teme conflitos éticos para o médico a partir da contratualização. "O médico é que determina os gastos de acordo com as necessidades do paciente. Ele vai ter o conflito de consciência na hora de defender os interesses do seu paciente e isso resultar na diminuição de seus ganhos".

Wayhs é contra a contratualização como está sendo proposta, pois "se aumenta o compromisso dos hospitais sem uma contrapartida de recursos financeiros, e fica abolido o parâmetro dos serviços dos médicos". Os valores repassados atualmente são insuficientes, há prejuízo sempre, só a alta complexidade dá um pouco de sobra. No Hospital de Caridade de Ijuí, onde ele trabalha, o prejuízo é de R$50 mil por mês. "Se o hospital dependesse só do SUS o prejuízo seria bem maior", prevê.

Como fica o médico? Hoje o hospital recebe os honorários médicos e os repassa integralmente. Com o pagamento global ao hospital, os profissionais podem sofrer pressão para diminuir custos. "Os hospitais chamam isso de parceria, o Ministério da Saúde também. Mas não houve nenhuma reunião com os médicos", argumenta.

Além disso, Wayhs alerta que a maioria dos médicos desconhece a contratualização, assim como a maioria dos hospitais. Os recursos para o financiamento da saúde no Brasil deveriam ser duas vezes e meia mais o atual, segundo estimativa da OMS.

 

Gestor prevê problemas

Maior gestora do SUS no Rio Grande do Sul, a Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre teme pela situação dos filantrópicos e dos hospitais menores. "Três quartos dos hospitais da capital teriam problemas e no RS quase todos", prevê o médico Eduardo Elsade, da SMS. Acompanhe:

Amrigs – Qual a posição da Secretaria Municipal de Saúde sobre a contratualização?

Elsade – É um bom instrumento de controle para os gestores, de trabalho e de produção para os grandes hospitais e os universitários. Mas merece ajustes no tratamento aos hospitais filantrópicos e aos menores, com poucas condições na alta complexidade e em procedimentos estratégicos, mas que fazem muitas internações, principalmente na média complexidade. Este modelo não traz um aumento considerável de recursos. E pode criar problemas pois transforma a relação dos gestores [municipais, estaduais e o federal] com as instituições e faz com que estas assumam os prestadores, principalmente da área médica.

Amrigs – Pode haver pressão por parte dos hospitais aos médicos?

Elsade – Acho que a contratualização faz com que os hospitais pequenos tenham que conter custos e, talvez, até limitar procedimentos. E aí pode estar incluída uma diferença no relacionamento com funcionários, incluída a classe médica. Isso é um problema porque os médicos, fundamentalmente, são responsáveis pela produção e pelo atendimento da população. O ideal seria um sistema que estimulasse a produção de serviços tanto das instituições como do atendimento médico. Tenho receio de que isso não aconteça a partir da contratualização.