Com 38 milhões de usuários, o mercado de planos de saúde do Brasil só é menor que o dos Estados Unidos. Junte-se a isso mais de 1,5 mil empresas em operação, contratos repletos de artigos e cláusulas de exclusões, 300 resoluções da agência reguladora do setor e o resultado é muita complexidade. Para completar, metade dos contratos foram firmados antes do estabelecimento de regras para os planos de saúde.
Parece lógico, portanto, que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), responsável pela regulação e fiscalização do mercado de planos de saúde, seja a campeã de reclamações de acordo com o balanço das queixas recebidas nos últimos cinco anos pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec): foram 16,5 mil entre 2000 e 2004. A maioria delas sobre coberturas negadas pelas operadoras.
O grande pico de reclamações (5,5 mil no Idec) aconteceu no ano passado, quando a ANS pôs em execução um programa de incentivo para que os usuários trocassem seus planos de saúde antigos por novos – estes sim, sob as normas da Lei 9.656, que entrou em vigor em janeiro de 1999. O programa, que vinha sendo discutido com médicos, empresas e clientes, foi apressado por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que tirou da ANS o poder de fixar os índices de reajuste anual dos planos antigos.
Com o precedente criado, algumas empresas resolveram ajustar seu equilíbrio econômico-financeiro com reajustes que chegaram a 81%. Também salgaram o preço cobrado dos usuários que queriam trocar seus contratos por planos novos (aumentos de até 400% no pagamento mensal). “Ao estabelecer o programa de incentivo, a ANS privilegiou os ajustes na situação econômica das empresas. Procedimento, aliás, que parece inerente à maioria das agências reguladoras”, reclama o gerente jurídico do Idec, Marcos Diegues.
Para o diretor de gestão da ANS, Gilson Caleman, a acusação não procede. “Dizer que a Agência prioriza a situação das operadoras é uma injustiça. Desde que a ANS começou a atuar, mais de mil empresas foram liquidadas ou deixaram de operar por não cumprir as regras do setor”, avalia. Com o estabelecimento das regras pela Lei 9.656, o mercado que somava mais de 3 mil empresas passou a ter pouco mais de 2 mil registradas – e apenas 1,5 mil estão efetivamente em operação hoje em dia.
Além disso, insiste Caleman, o período de grande crescimento nas reclamações – a própria ANS recebeu 15,9 mil queixas no ano passado – coincidiu com um momento especialmente conturbado para o mercado de planos de saúde: juntou-se a decisão do STF, o programa de incentivo e a aplicação de reajustes abusivos por parte das operadoras.
Apesar de procurar rebater as críticas, a ANS começa a aplicar mudanças exatamente no ponto central das queixas. Os critérios de equilíbrio econômico-financeiro do setor dividirão espaço com o desempenho na atividade fim, o tratamento de saúde. O projeto de qualificação da saúde suplementar prevê a cobrança de metas em programas preventivos, mortalidade materna e infantil e acompanhamento de diabéticos. (Vicente Nunes – Jornal do Commercio)