Como a genética poderá ajudar as seguradoras a selecionar riscos, melhorar a oferta de produtos e reduzir custos? Essa é a grande discussão hoje no mercado americano de seguros de vida, e foi apresentada no último dia 30 pelo executivo Wayne Macedo, da Transamerica Reinsurance, durante uma palestra do II Fórum Nacional de Seguros de Vida e Previdência Privada.
A Transamerica é uma das maiores resseguradoras americanas e se especializou em seguro preferente, uma classificação que premia (com um barateamento do custo do seguro e aceitação de apólices de valores mais elevados) aqueles indivíduos que se esforçam para manter uma boa saúde. O tema colocado por Wayne mostra a distância de anos-luz em que se encontra o mercado brasileiro de seguros de vida em comparação ao dos Estados Unidos.
A começar pelo tamanho. As seguradoras americanas respondem por quase a metade da produção mundial em prêmios de seguros de vida, algo como meio trilhão de dólares. Depois, pelo estágio de competitividade e seleção de riscos. O Brasil vende pouco mais de US$ 3 bilhões – em seguro de vida puro, individual e em grupo, exceto o VGBL que engorda as estatísticas mas não é seguro de vida.
Para um volume de vendas tão baixo, o custo de avaliação médica é elevado, daí porque no Brasil essa prática não é muito difundida, explica William (Bill) Alan Yates, executivo que comanda as operações brasileiras da Prudential Financial, uma das maiores seguradoras americanas.
Wayne explicou que os americanos começaram, já nos anos 70, a praticar o chamado seguro preferente. Trata-se de separar os bons e os maus riscos, ou seja, aquelas pessoas que têm maior exposição a doenças e acidentes que a média. A idéia é: quem oferece mais risco paga mais do que quem oferece menos. Esse processo teve início quando começou-se a questionar o efeito dos cigarros sobre a saúde dos usuários. As seguradoras passaram a oferecer descontos no prêmio para não-fumantes.
Em uma segunda fase, nos anos 80, exames chamados “blood profiles” (perfil de sangue) foram adotados, até como reação à pandemia da AIDS. A partir dos perfis sanguíneos, as companhias avaliam as probabilidades de doenças a partir de dados como o nível de lipídios, glicose, enzimas hepáticas (que poderiam antecipar problemas com álcool) e colesterol (que aponta para doenças arteriais coronarianas).
Nos anos 90, quando a diferenciação entre fumantes e não-fumantes e o perfil de sangue viraram “commodities”, as seguradoras passaram a olhar a qualidade de vida, ou seja, os hábitos de cada um – alimentação, prática de esportes, controle de estresse, etc. Na entrada do segundo milênio, o foco está passando para a genética: “Tem havido muito debate sobre o uso de testes genéticos para finalidades de seguros”, disse Wayne, acrescentando que a grande preocupação da indústria é se as informações genéticas – agora e no futuro – são suficientes para prever o risco de morte ou de doenças graves.
Há também uma discussão ética, relacionada ao acesso a estes dados. Em primeiro lugar, as seguradoras não deverão ter acesso aos exames de DNA das pessoas tão cedo. Em segundo lugar, diz Wayne, existe um temor de que, de posse de uma informação de que está sujeito a uma doença grave, o segurado contrate apólices em valores tão elevados que distorçam o mercado e tornem os preços injustos para os demais segurados.
O Brasil ainda está na fase da diferenciação fumante-não fumante e apenas meia dúzia de seguradoras aplicam testes e avaliação médica. A Prudential é uma dessas empresas. Segundo Yates, a seguradora aplica avaliação médica detalhada, prévia à aceitação de seguros de vida acima de R$ 300 mil. Médicos e para-médicos são contratados pela companhia que, dependendo do caso, pode mandar fazer o exame na casa do cliente. Os futuros clientes devem, além de responder ao questionário de praxe, se submeter a exames de sangue detalhados, entrevista pessoal com o médico para aprofundar a análise e, se for necessário, fazer outros exames. “Uma avaliação na frente possibilita tomar uma decisão mais bem embasada sobre as pessoas”, diz Yates.
Janes Rocha é repórter de Finanças e autora do “Guia Valor Econômico de Seguros Pessoa Física e Bens”.