Um surto de micobacteriose, um conjunto de doenças raras, atacou mais de 400 pacientes em 40 hospitais do Rio de Janeiro nos últimos quatro meses e deixou em alerta as secretarias de Saúde de todo o país. A doença, causada pela bactéria Mycobacterium, levou uma equipe do Ministério da Saúde aos hospitais fluminenses para investigar a causa do problema. Mas, até agora, o governo não sabe explicar o que está causando a doença e nem como evitá-la.
Apesar de rara, a doença já assombrou hospitais públicos de Goiás e do Pará. Em 2003, seis centro cirúrgicos de Belém registraram mais de 300 casos. Segundo o médico infectologista Roberto Maranhão, do Hospital de Clínicas de São Paulo, esse microrganismo vive na terra e na água, mas prolifera-se em instrumentos cirúrgicos mal lavados e nos cestos de lixo orgânico, comum em centros cirúrgicos. Daí para o organismo de pacientes debilitados é um pulo. "A micobacteriose é uma doença ligada á falta de higiene", avisa o especialista.
Segundo o coordenador de Vigilância em Saúde do MS, Ricardo Pio Marins, como não se sabe a causa do surto no Rio, o governo resolveu fazer um alerta de saúde para todas as secretarias de Saúde do país. "Basicamente estamos orientando os médicos a serem mais rigorosos na esterilização dos instrumentos cirúrgicos", diz Marins.
Na semana passada, uma nota técnica do Ministério da Saúde chamou a atenção de médicos para o surto e pediu para que eles fiquem de olho nos sintomas da doença para que não seja confundida com infecção hospitalar. Ontem, os técnicos do governo federal voltaram a se reunir no Rio com 300 médicos para discutir uma forma de combater o surto. "Os maiores casos ocorrem em pacientes que fizeram endoscopia, cirurgia plástica e procedimentos transcutâneo", diz a nota.
Hipóteses
As investigações feitas por técnicos da Secretaria de Vigilância em Saúde no Rio de Janeiro apontam como possíveis causas do surto a falha técnica no sistema de limpeza dos hospitais e erro na escolha do produto usado na esterilização dos instrumentos ou no procedimento em si. Considera ainda possibilidade de a bactéria ter desenvolvido resistência às substâncias químicas usadas na higienização das unidades e dos equipamentos. Essa última hipótese seria a mais grave. Os estudos para descobrir a verdadeira causa do surto de micobacteriose vem sendo realizado no instituto Hélio Franco, no Rio.
Para as autoridades de Saúde do Rio, o principal problema foi a demora para atestar a ocorrência de um surto. Centenas de pacientes, logo após cirurgias, começaram a ter problemas com a sutura. Uma inflamação com líquido branco impedia a cicatrização e infeccionava em três dias. Em seguida, espalhavam-se edemas pelo corpo. A infecção provoca lesões avermelhadas na pele, que se transformam em feridas. Nos pacientes com baixa imunidade, a doença pode comprometer vários órgãos e levar à morte.
Segundo o superintendente de vigilância em Saúde do Rio, Victor Berbara, a contaminação ocorreu em hospitais públicos e privados. "Posso garantir que a causa principal é a limpeza inadequada no material cirúrgico. Já temos tido avanços nesses processos. Várias dessas unidades já mudaram a sua forma, o seu processo de esterilização desse material", afirmou Berbara.
Com receio de que haja um surto no Distrito Federal, a Secretaria de Saúde local vai pedir ao Ministério da Saúde orientações em procedimentos a serem adotados. "Recentemente não houve casos em hospitais do Distrito Federal, mas não queremos vacilar", atesta o subsecretário de Vigilância em Saúde do DF, Eduardo Guerra. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já havia lançado um alerta nacional em 2003 por conta do surto no Pará, orientando que hospitais tenham mais rigor na hora de limpar as dependências internas e esterilizar instrumentos.
Entenda a doença
1. O que são micobacterioses?
São doenças causadas por microbactérias pertencentes ao gênero Mycobacterium
2. Onde essas bactérias são encontradas?
Em ambientes hospitalares, principalmente em centros cirúrgicos. Geralmente os microorganismos instalam-se em instrumentos mal lavados e em cestos de lixos orgânicos.
3. Como a bactéria afeta o paciente?
Causa uma infecção com lesões avermelhadas na pele, que se transformam em feridas. Nos pacientes com baixa imunidade, pode comprometer órgãos importantes, como fígado e estômago, e levar à morte.
Tratamento
Segundo a Sociedade Brasileira de Infectologia, o tratamento é longo e difícil. O paciente tem que tomar uma combinação de três medicamentos durante oito meses. Os remédios são fornecidos gratuitamente pelo Ministério da Saúde. Por paciente, o governo gasta em média R$ 5 mil ao mês.