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Está na hora de mudar!

Hospital público para pobre; seguro saúde para a classe média; clínica particular ou exterior para rico… Este o modelo perverso de assistência médica que está se consolidando em nosso país.

Com o florescimento dos planos de saúde através do canto do cisne que propunha uma hotelaria melhor com competência, diante dos sucessivos conflitos na relação de trabalho no setor público resultante de um corporativismo intencional, a classe média, sem perceber, foi abdicando dia a dia, mês a mês, ano a ano, de um direito inalienável, qual seja o retorno em serviços pelo Estado, do imposto que cada um paga.

Nos hospitais públicos, antes prestigiados e competentes em função do mecanismo de cobrança dos formadores de opinião que lá se tratavam, implantou-se o desprezo, o descaso e a total falta de respeito humano. O epílogo foi o “parto na pia”. Quando muito, pela dupla militância, em uma situação de emergência, o primeiro atendimento dado em corredores sujos e cheios de macas é sucedido pela apresentação cínica de um cartão com o canto de sereia: “Aqui nós não temos condições, mas vocês podem me procurar na minha clínica, onde, além do mais, atendemos a todos os convênios…”

E lentamente a decomposição se acentuou, física e moral, dos prédios e da ética. Consolidou-se, para alegria dos donos de hospitais e planos de saúde, a mistificação resultante do pagamento por procedimentos. Deliberadamente, confundiu-se setor de serviços (dever do Estado) com setor produtivo (busca do lucro). O doente passou da condição de cidadão “sujeito” à de objeto de consumo.

Assisti a esse patético processo de degradação, protegido pelo baluarte que tive a ventura de criar, transformado em trincheira, pela defesa dos princípios que encaram o homem como sujeito e não como objeto de lucro. Vivo em uma instituição que adquiriu notabilidade e respeito internacional, e em meu cotidiano constato a total abdicação do direito de cidadania:

— Desculpe, doutor, por procurá-lo, e estar aqui ocupando o lugar de um pobre…

Ao que respondo sempre:

— Mas afinal, o senhor não paga impostos?

Depois de ter sido expropriada do direito aos serviços públicos prestados pelo Estado, transformada em mera consumidora, a classe média brasileira ainda pede desculpas quando, cheia de constrangimento, tem alguma oportunidade de acesso aos serviços que, sendo de todos, pertencem também aos que colaboram para seu financiamento. Como se o que definisse a cidadania fosse o nível econômico ou cultural. Não percebem que, com seu padrão de exigência, seu olhar crítico e sua capacidade formadora de opinião, sua presença nos serviços públicos imporia um resgate da qualidade perdida, um atalho para “nivelar por cima”, em seu favor e no de toda a população.

Está na hora de mudar! Um país que levou ao poder quem veio das classes mais humildes, sempre lutando por cidadania, não pode conviver com o incesto gerado pela terceirização da obrigação maior do Estado: prestar serviços.

ALOYSIO CAMPOS DA PAZ JUNIOR é fundador e cirurgião-chefe da rede Sarah de Hospitais de Reabilitação.