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‘Infinitamente mais feliz’

Num discurso de uma hora e 27 minutos em que deu satisfações até sobre as 800 novas ambulâncias com UTI que o Ministério da Saúde distribuirá, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestou contas ontem do seu primeiro ano de governo com elogios ao Congresso e aos ministros, citando seis deles em especial, além de agradecimentos ao povo pelo ano de sacrifícios. O presidente disse que termina este ano “infinitamente mais feliz” do que começou. Na cerimônia no Palácio do Planalto, Lula disse ter consciência de que as mudanças que o Brasil precisa não serão obra de um mandato ou uma década, mas disse que é importante que o alicerce seja sólido. Ao falar das dificuldades enfrentadas na economia, disse que o tempo das incertezas já passou.

– Recuperamos a estabilidade da economia para o país crescer, construímos a base política para aprovar reformas justas e necessárias, ampliamos o diálogo com a sociedade. Fizemos do Brasil um interlocutor respeitado na diplomacia e no comércio internacional. Hoje, posso afirmar, com muita segurança, que os alicerces de um novo projeto de nação foram firmemente estabelecidos em 2003 – discursou o presidente, para uma platéia de aproximadamente 500 pessoas, entre ministros, parlamentares e integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

Lula iniciou a cerimônia com quase duas horas de atraso. A demora foi provocada por ajustes no longo discurso de 30 páginas. Lula queria dar detalhes dos programas do governo na sua prestação de contas. Leia os principais trechos do discurso:

REFORMAS E CONGRESSO: “O que o Congresso fez em sete meses para votar a reforma da Previdência e a tributária, eu penso que em poucos momentos na História da instituição foi feito. Inclusive o trabalho construtivo, mesmo daqueles que eram contra a proposta inicial enviada pelo Executivo. Acho que, poucas vezes, os homens públicos deste país trabalharam com tanta dedicação e com tanta vontade de fazer o melhor. Por isso eu quero, presidente Sarney, que o senhor saiba que o Poder Executivo tem, na memória, o trabalho inestimável que vocês prestaram. Acho que o Brasil saberá reconhecer isso.”

ESTABILIDADE: “Recuperamos a estabilidade da economia para o país crescer, construímos a base política e parlamentar para aprovar reformas justas e necessárias, ampliamos o diálogo com a sociedade. Fizemos do Brasil um interlocutor respeitado na diplomacia e no comércio internacional. Hoje, posso afirmar, com muita segurança, que os alicerces de um novo projeto de nação foram firmemente estabelecidos em 2003.”

HERANÇA: “O Brasil estava em profunda crise. Uma das mais graves crises da História republicana. Os prognósticos eram os piores possíveis. A principal razão do desequilíbrio e da falta de confiança no país era a relação entre a dívida pública e o PIB. Nos oito anos da administração passada, ela mais que duplicou, passou de 30% para 63% do PIB.”

SACRIFÍCIO: “O novo governo teve que exercer, portanto, rígido controle das contas públicas, tomou a drástica decisão de elevar o superávit primário para 4,25% do PIB. E foi uma medida de extremo sacrifício, que obrigou um corte de R$ 14 bilhões no Orçamento.”

INCERTEZAS: “É com o sentido de humildade, diante dos desafios à frente, que venho anunciar: o tempo da incerteza passou. Revertemos as expectativas pessimistas.”

INFINITAMENTE MAIS FELIZ: “Quero dizer que termino este ano infinitamente mais feliz do que comecei. E imaginem, nesta época do ano, como é que estava a minha cabeça. Eu lia nos jornais alguns economistas importantes dizerem: ‘O Brasil vai quebrar, o Brasil vai afundar, coitado do Lula’. Os meus amigos diziam: ‘Pôxa, Lula, você pegou uma batata quente, pegou um pepino, isso não tem jeito’. E o povo, na sua sabedoria, dizia: ‘Presidente, vai fundo’.”

INDICADORES MELHORAM: “Os títulos brasileiros no exterior estão cotados hoje a quase 100% do valor nominal. O chamado risco-país, que passava dos 2.400 pontos, já está abaixo dos 500 pontos. Reduzimos e dominamos a inflação, que era projetada em mais de 40%. Fechamos 2003 na casa dos 8%. Temos um inédito superávit comercial de US$ 24 bilhões.”

MAIORIA ALIADA: “É importante lembrar que não fomos eleitos com maioria na Câmara e no Senado, a nossa maioria foi construída sob a coordenação da Casa Civil para dar novo rumo ao país.”

AVANÇOS NA PREVIDÊNCIA: “A reforma da Previdência tornará o sistema de aposentadorias e pensões mais justo, abolindo privilégios, reduzindo desigualdades entre aposentados do serviço público e do INSS.”

TRIBUTÁRIA: “A reforma cria condições para o país crescer mais rapidamente, regenera as exportações, torna mais barata a cesta básica do trabalhador e vai acabar com a guerra fiscal entre os estados.”

REFORMA AGRÁRIA: “Nos últimos anos, milhares de famílias foram simplesmente jogadas em áreas rurais e imprestáveis para a agricultura, sem água, energia, longe das estradas e sem escola. Em quase 80% dos assentamentos que encontramos, não havia condições de produzir. Antes de avançar com os assentamentos, decidimos recuperar os antigos. Até o final de 2006, assentaremos 530 mil famílias.”

FOME ZERO: “O programa superou as dificuldades iniciais, se consolidou e está implantado em 1.227 municípios, beneficiando cerca de 5 milhões de pessoas, especialmente no Norte e no Nordeste. Os indicadores nutricionais e sanitários melhoraram. Vamos estender o programa a todo o país.”

EDUCAÇÃO: “Decidimos priorizar a solução do analfabetismo. Mais de três milhões já estão em processo. O Brasil Alfabetizado gera emprego e renda para 106 mil professores. Além disso, demos um salto de qualidade na alimentação escolar que atende 37,5 milhões de alunos.”

SAÚDE: “Implantamos mais 2 mil novas equipes do Saúde da Família, chegando a 18.700, responsáveis pela cobertura de 35% da população. Contratamos 7.700 novos agentes comunitários, totalizando 182.750 agentes, responsáveis pela cobertura de cerca de 94 milhões de brasileiros.”

TRANSPORTES: “Encontramos cerca de 51 mil quilômetros de estradas deteriorados. Neste ano, mesmo com poucos recursos, já recuperamos a trafegabilidade de 31 mil quilômetros de estradas. Além disso, restauramos completamente 3.251 km e sinalizamos 12.781 km em 20 estados.”

HABITAÇÃO: “Dos recursos disponíveis para a Habitação, R$ 5,3 bilhões foram destinados a famílias com renda de até cinco salários-mínimos. Em novembro, já havíamos executado 66,5% das operações previstas.”

SEGURANÇA: “O governo implantou o Sistema Único de Segurança Pública. Inicialmente, foram investidos R$ 285 milhões de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para a estruturação do Susp. Intensificamos o combate ao crime organizado.”

POLÍTICA EXTERNA: “Um dos maiores motivos de orgulho é a nossa política externa. Pela voz do presidente ou pela ação do Itamaraty, o governo posicionou-se de maneira clara contra o terrorismo e pela paz, unindo-se a países que condenaram tanto a barbárie dos atentados terroristas quanto a reação militar e unilateralista que se seguiu.”

RECURSOS: “Com tudo isso, podemos assegurar que 2004 será melhor que 2003. Não faltarão recursos para financiar os novos empreendimentos que se multiplicarão pelo país.”

IMPRENSA:”Eu quero agradecer à imprensa por esses 11 meses. A imprensa com que muitos de nós às vezes ficamos magoados, porque nem sempre as notícias falam bem da gente. E eu aprendi uma coisa: notícia é aquilo que nós não queremos que seja publicado, o resto é publicidade. A imprensa na verdade, é como coração de mãe: por mais que a gente brigue com ela, a gente sabe que precisa dela.”

MANDATOS:”Temos consciência de que as mudanças que o Brasil precisa não serão obra de um mandato, de dois mandatos ou de uma década. Quem sabe, seja obra de uma ou mais gerações. O que é importante é que o alicerce feito para essa mudança seja muito sólido, para que a casa não caia com o primeiro vento forte.”

Tosse, engasgo e irritação

BRASÍLIA. Foi um discurso de tirar o fôlego. Literalmente. De 153 páginas com letras grandes, o longo balanço do primeiro ano de governo provocou muitos engasgos. Com o calhamaço sobre o púlpito, o presidente Lula mostrou impaciência e folheou o documento quando ainda faltava mais da metade da apresentação.

– Já vou terminar – prometeu, enquanto, no Salão Nobre do Palácio, os convidados demonstravam inquietação.

Lula tossiu e engasgou com freqüência, especialmente no fim da leitura, interrompendo o discurso. Para limpar a garganta, Lula recorreu aos copos d’água. Mas acabou transbordando no terceiro copo, quando lhe foi servida água gelada.

– Quero só pedir para quando me trouxerem água não trazerem água gelada. Quem preparou a água nunca falou no microfone.

Incomodado, Lula não teve alternativa: fechou o documento e encerrou seu discurso de improviso. Num tom mais informal, concluiu:

– Muito obrigado, meus companheiros. Feliz Natal, feliz Ano Novo e um futuro melhor para o Brasil em 2004.