Com a possibilidade de a Prefeitura de Curitiba obter êxito em seu recurso, estabelecimentos de saúde devem se acautelar avançando nas negociações para celebrar contrato com empresa especializada no tratamento de resíduos
A Prefeitura de Curitiba e suas Secretarias de Saúde e Meio Ambiente foram notificadas nesta terça-feira, ao meio dia, da concessão de liminar que obriga a administração pública a dar continuidade ao serviço de coleta, transporte, tratamento e destinação final dos resíduos de saúde. A Procuradoria do Município anunciou que iria recorrer da decisão da juíza da 1.ª Vara da Fazenda Pública, o que deve ocorrer ainda nessa quarta-feira, considerando que é a data em que expira o prazo de uso da vala séptica da CIC e a partir do qual o lixo hospital terá de receber o tratamento adequado em outro local. A Prefeitura celebrou contrato para a coleta nos seus serviços próprios, com a empresa Cavo, devendo formalizar outro de caráter emergencial para cumprir a decisão judicial, caso não consiga reverter de imediato os efeitos da liminar. A multa diária fixada para o município é de R$ 3 mil reais em caso de descumprimento.
Em seu despacho, a juíza Fabiana Passos de Melo foi incisiva de que “a interrupção dos serviços certamente colocaria Curitiba em situação de calamidade, expondo a população ao risco de contaminação pelos resíduos de serviços de saúde, além de que estaria prejudicada pela própria prestação dos serviços de saúde, na seara privada que, não tendo destino para dar aos RSS, certamente veria reduzida a possibilidade de execução de suas atividades, o que é inaceitável, considerando o prejuízo que causaria à saúde dos cidadãos que diariamente são atendidos em suas dependências”. A magistrada fundamentou muito bem a antecipação de tutela, sob amparo constitucional, nas leis ambientais e de defesa do consumidor. Também levou em conta a dotação orçamentária de Curitiba, que prevê para 2005 investimentos para fixação de local para tratamento dos resíduos e recursos ainda para o serviço de coleta, além da cobrança de taxa do lixo no IPTU.
Apesar da liminar, a RECOMENDAÇÃO da Fehospar e do Sindipar é para que os estabelecimentos de saúde negociem as melhores condições contratuais com as empresas credenciadas para coleta, transporte, tratamento e destinação. É importante que estejam definidos os termos negociais na hipótese de o setor de saúde ter de assumir a responsabilidade a curto prazo. As duas principais empresas disponíveis, a Cavo e a Serquip, estão oferecendo condições contratuais semelhantes no que se refere a valores, portes e índices de reajuste anual. Contudo, há uma série de fatores que devem ser considerados e que merece uma análise mais criteriosa de cada estabelecimento. A Fehospar formalizou um protocolo de intenções com a Cavo para que desse especial atenção sobretudo aos pequenos geradores. (ver valores constantes de tabela enviada).
Para os municípios metropolitanos, que se beneficiavam do sistema de coleta coordenado pela Prefeitura de Curitiba, é necessário que se contate com suas próprias prefeituras, para avalar as decisões adotadas. Cinco dos municípios (Pinhais, Campo Largo, Campina Grande do Sul, Mandirituba e Quatro Barras) celebraram contrato com a Cavo para a coleta dos resíduos próprios e também para os demais serviços de saúde, pelo menos temporariamente, de modo a cumprir as normas de proteção ambiental e saúde pública. Também São José dos Pinhais e Fazenda Rio Grande estariam negociando contratos com a Cavo. Outros municípios estariam negociando com a Serquip. Na hipótese de os municípios descartarem a responsabilidade de coleta dos serviços privados, as empresas terão de formalizar a contratação.
Até a tarde de hoje, o IAP havia recebido somente 121 planos de gerenciamento de nove dos 14 municípios metropolitanos que depositavam resíduos na vala da CIC. O Instituto, porém, não soube informar quais as municipalidades que estariam assumindo o ônus da coleta e tratamento dos resíduos.
Contatos para possível contratação de serviços:
Cavo/Sul – (0xx41) 333-4232, e-mail: comercial@cavo.com.br – site: www.cavo.com.br
Serquip – (0xx41) 339-3046, e-mail: serquip@terra.com.br – site: www.serquip.com.br
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Segue cópia da liminar obtida da 1.ª Vara da Fazenda Pública, em ação proposta pelo Sindipar e em trabalho jurídico coordenado pela advogada Maria Solange Marecki:
Autos n.o 1.052/05, em que é autor o Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Paraná (SINDIPAR), e requeridos, Prefeitura Municipal de Curitiba, Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Secretaria Municipal da Saúde.
1. Acolho a emenda de fls. 405/408. Retifiquem-se registro e autuação.
2. Em fusão de relatório e fundamentação, consigno que é questão do feito a responsabilidade pela coleta, transporte e destinação final dos resíduos sólidos de serviços de saúde, o chamado lixo hospitalar, no Município de Curitiba, e passo desde logo a analisar a legislação pertinente, para concluir pela cabimento da antecipação de tutela, como postulada pelo autor.
3. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), exercendo a competência da União, dentro dos limites postos no art. 2º, incs. II a VI, c/c o art. 7º, da Lei n.º 9.782/99 , dispôs, na Resolução da Diretoria Colegiada (RDC), n.o 306/2004, sobre o Regulamento Técnico para o Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) .
De início, cabe destacar que cabe à União legislar sobre normas gerais de conservação da natureza, proteção do meio ambiente e controle a poluição, detendo os Estados competência suplementar (art. 24, inc. VI, e §2º, da Constituição Federal), razão pela qual, à toda evidênci, deve o Município de Curitiba submeter-se às regras estipuladas pela ANVISA.
Pois bem.
A RDC n.o 306/04//ANVISA, segundo seu histórico, veio para harmonizar as normas federais dos Ministérios do Meio Ambiente, por meio do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), e da Saúde, através da ANVISA, referentes ao gerenciamento do RSS, abrangendo todos os serviços relacionados com o atendimento à saúde humana ou animal, com a finalidade de minimizar a produção de resíduos e de proporcionar aos resíduos gerados um encaminhamento seguro, de forma eficiente para proteção dos trabalhadores, preservação da saúde pública, dos recursos naturais e do meio ambiente.
Eis a regulamentação da matéria em comento, atualmente.
E a leitura atenta da RDC n.o 306/04//ANVISA revela, em pelo menos dois pontos de seu texto, que se impõe ao ente público a responsabilidade pela coleta, transporte e disposição final dos RSS.
Com efeito, atribui-se ao gerador dos resíduos o dever de elaborar um Plano de Gerenciamento (chamado PGRSS), que “deve ser compatível com as normas locais à coleta, transporte e disposição final dos resíduos gerados nos serviços de saúde, estabelecidas pelos órgãos locais responsáveis por estas etapas” , grifei.
Aí já se vê que dentre as etapas do gerenciamento dos RSS, aos órgãos locais (entenda-se = Município) cabe a coleta, o transporte e a disposição final.
Mas não é só.
No item 2.7, expressamente consta que é responsabilidade dos serviços geradores de RSS “Requerer aos órgãos públicos responsáveis pela execução da coleta, transporte, tratamento ou disposição final dos resíduos ou serviços de saúde, documentação que identifique a conformidade com as orientações dos órgãos de meio ambiente. ” grifei
Resulta claro, portanto, que a responsabilidade do gerador de RSS vai até o chamado armazenamento externo, e a partir da fase seguinte, a coleta, surge a responsabilidade do órgão público.
Ademais, a Lei Estadual n.o 12.493/99, dentro da competência suplementar estabelecida na Carta Magna, dispõe que todos os Municípios do Estado do Paraná deverão disponibilizar áreas e/ou reservar futuras para efetivação da destinação final dos resíduos sólidos urbanos.
Concluindo, é atribuição legal do Município de Curitiba, dentro de seu território, a coleta, transporte e destinação final dos RSS.
Tal argumentação consubstancia a prova inequívoca da verossimilhança das alegações declinadas na profacial.
Por outro lado, o perigo de dano irreparável, caso não seja antecipada a tutela, é incontestável.
A preocupação da ANVISA com o gerenciamento dos RSS, especificado na RDC n.o 306/2004 (e o faz de forma bastante detalhada, baseada em critérios estritamente técnicos), revela a importância do assunto, e se tem por fim a proteção dos trabalhadores, preservação da saúde pública, dos recursos naturais e do meio ambiente, é certo que, caso não seja feito de forma adequada, ou com solução de continuidade, tais bens não serão protegidos como determinado pela Constituição Federal; afinal, a saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196) e todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações (art. 225, caput).
A interrupção dos serviços, pelo Município requerido, certamente colocaria Curitiba em situação de calamidade, expondo a população ao risco de contaminação pelos RSS, além de que estaria prejudicada a própria prestação dos serviços de saúde, na seara privada, que, não tendo destino para dar aos RSS, certamente veria reduzida a possibilidade de execução de suas atividades, o que é inaceitável, considerado o prejuízo que causaria à saúde dos cidadãos que diariamente são atendidos em suas dependências.
Não se olvide, também, que é direito básico do consumidor a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral (Art. 6º, X, da Lei n.o 8.078/90), como já era previsto na CF, art. 37, caput.
No caso vertente, consigno que se antecipa o provimento para cumprir exatamente o qu eé determinado legal: proteção da saúde da população e preservação do meio ambiente, não havendo perigo de irreversibilidade, pois, se ao final o pedido for julgado improcedente, apenas cessará a responsabilidade do Município de Curitiba no tocante ao gerenciamento dos RSS, valendo aqui destacar que há no seu orçamento(segundo informações constantes dos autos) verba específica para cumprimento de tal obrigação legal. Irreversíveis seriam, sim, os danos que seriam causados à população com a denegação da tutela neste momento.
4. Assim, preenchidos os requisitos do art. 273, caput, e inc. I, do Código de Processo Civil, antecipo tutela para determinar aos requeridos que continuem a executar a coleta, transporte, tratamento e destinação final dos resíduos de serviços de saúde, de acordo com as determinações da RDC n.o 306/04//ANVISA, e, com fundamento no art. 461, §5º, do CPC, imponho multa de R$ 3.000,00 (três mil reais) por dia de serviço não prestado, caso em que se verificará descumprimento flagrante de ordem judicial.
Intimem-se: a) os requeridos, na pessoa de seus representantes, para cumprimento desta decisão; b) o Procurador-Geral do Município, c) o autor, e d) o Ministério Público.
Citem-se para contestar.
Curitiba, 25/04/2005