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O novo papel dos hospitais-escola

No Brasil, os hospitais de ensino são responsáveis por 25,6% dos leitos de UTI da rede pública de saúde, por 40% dos serviços de alta-complexidade e por mais de 12% das internações hospitalares. Ao todo, são 147 instituições desse tipo no País , das quais 44 ligadas diretamente ao Ministério da Educação (um deles no DF, o Hospital Universitário, pertencente à UnB). Mesmo sendo um número pequeno diante dos cerca de 5 mil hospitais brasileiros, essas instituições são consideradas estratégicas para o Sistema Único de Saúde (SUS).

Com a definição de uma nova política para os hospitais de ensino, o governo federal pretende torná-los centros hospitalares de referência para o SUS. Nesse sentido, serão destinados R$ 100 milhões àqueles vinculados ao MEC e mais R$ 100 milhões aos classificados como instituições filantrópicas.

– O investimento é um novo recurso que se soma aos reajustes de tabela feitos pelo Ministério da Saúde desde o início do governo Lula para aprimorar os serviços dentro dos hospitais – observa o diretor do Departamento de Atenção Especializada do Ministério da Saúde, Arthur Chioro.

A reorganização dos hospitais de ensino não se resume ao repasse de recursos para superação da crise financeira que enfrentam, como a que acometeu o HUB na primeiro semestre deste ano [veja matéria nesta página]. A nova política inclui aprimorar o papel que eles desempenham em relação ao ensino e à pesquisa em saúde, dos mecanismos de gestão hospitalar e mudanças na maneira como se inserem na rede do SUS.

Por isso, duas outras portarias foram assinadas pelos ministros da Saúde, Humberto Costa, e da Educação, Tarso Genro. Uma cria novos requisitos para certificação dessas instituições como ”de ensino”.

– A partir de agora, só serão considerados hospitais de ensino aqueles certificados com os novos critérios propostos na portaria – destaca Chioro.

Todas as instituições hospitalares de ensino e as que pretendem obter essa classificação estão sendo avaliadas e certificadas. Até agora, mais de 150 hospitais já requisitaram a vistoria. Um total de 19 instituições já foi avaliado e os primeiros certificados começam a ser concedidos em breve.

Novos critérios – Ao todo, são 17 critérios a serem observados para se obter o título de hospital de ensino. Agora, é preciso oferecer atividades curriculares de internato para todos os estudantes de pelo menos um curso de Medicina e promover ações de outro curso da área de saúde. Outras exigências são estar de acordo com as normas de pós-graduação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e ter dez vagas de primeiro ano de residência hospitalar nas áreas básicas.

É necessário, ainda, garantir o acompanhamento de professores aos estudantes de graduação e residentes, assim como a realização de atividade regular de pesquisa. A instituição deve ter instalações adequadas de ensino, com sala de aula e recursos audiovisuais, e acesso a biblioteca atualizada e especializada na área de saúde. ”Existem hospitais de ensino que ainda não têm área de pesquisa. Nesses casos, eles devem apresentar um projeto criando essa área”, ressalta Arthur Chioro.

Outros critérios considerados na avaliação são a formação de comissão de documentação de óbito e de comissão de ética e pesquisa, e a constituição de um conselho gestor de acompanhamento de contrato, com a participação de estudantes, professores, funcionários, comunidade e gestores de Saúde. Atividades de vigilância epidemiológica e outras também faz parte dos novos requisitos.

– Com esses novos critérios, avaliamos que alguns hospitais universitários perderão o título. Só que isso não significa uma diminuição do número de hospitais, pois vários outros vão poder aderir à nova política. O que desejamos é a qualificação da rede de hospitais de ensino em nosso país – observa Arthur Chioro.

A expectativa do Ministério da Saúde é, em pouco tempo, chegar a cerca de 160 hospitais de ensino como referência para a rede pública de saúde. O diretor conta que, a cada dois anos, as instituições serão reavaliadas. ”As certificações são sempre feitas pelos dois ministérios, que, para isso, contam com uma comissão formada por 12 membros do Ministério da Saúde e 12 da Educação”, observa.

Verbas terão reforço imediato

Uma ação imediata para enfrentar a crise nos hospitais de ensino é o reforço financeiro assegurado pelo governo federal. Arthur Chioro explica que dos R$ 100 milhões destinados pelo Ministério da Saúde aos hospitais vinculados às universidades federais, R$ 50 milhões serão distribuídos em oito parcelas, das quais duas já foram liberadas.

O valor dos repasses segue critérios do MEC, como quantidade de alunos e de leitos. Os outros 50 milhões serão incorporados nos novos contratos, a serem assinados após a avaliação baseada nos requisitos para classificação como ”de ensino” e o estabelecimento de novos compromissos com os gestores locais (no caso do HUB, a Secretaria de Saúde do GDF). Esses compromissos têm como base a qualificação da assistência, da gestão hospitalar, do ensino e da pesquisa.

Após o reconhecimento da qualificação dos hospitais, esse dinheiro será distribuído como um incentivo para aqueles que oferecem mais serviços e realizam maior número de procedimentos.

O financiamento dos hospitais de ensino é um dos principais pontos a serem trabalhados na nova política. Atualmente, o repasse de recursos é baseado na produção de serviços e agora vai passar a ser feito de acordo com o cumprimento de metas.

– Os hospitais de ensino recebiam o dinheiro de acordo com a realização de consultas, transplantes, número de internações e outras ações. O problema é que, dessa forma, muitos hospitais escolhiam a realização de procedimentos que, pela tabela do SUS, pagavam melhor – comenta Arthur Chioro. – Assim, essas instituições não atendiam à população naquilo que mais precisava e nem supriam as áreas com demanda reprimida, conforme as necessidades do sistema.

Com a nova política, o ministério, junto aos gestores locais, vai estabelecer as metas desses hospitais em quatro áreas. Ou seja, quais são os seus compromissos com relação à assistência (o que o SUS precisa que eles façam), à formação e educação permanentes, à área de pesquisa e avaliação tecnológica e ao aprimoramento da gestão. A prestação de serviço passará a ser regulada pelo gestor do SUS, que vai definir quais são os pacientes que serão atendidos e que tipo de cirurgias serão feitas, por exemplo.

A nova forma de remuneração não inclui a alta-complexidade. Nesse caso, o ministério vai continuar pagando por produção. Já em relação à média-complexidade, área que tem maior estrangulamento no SUS, será calculado quanto é repassado atualmente para os hospitais de ensino. Com base nesse levantamento, o ministério vai estabelecer um repasse fixo para cada instituição e criar um fator de incentivo. Quanto à atenção básica, a idéia é que os hospitais de ensino não concentrem esforços nesse tipo de atendimento. Para isso, a população conta com as unidades básicas de saúde do SUS e as equipes do Programa de Saúde da Família (PSF), sob responsabilidade da Secretaria de Saúde local.

Os recursos recebidos regularmente pelos hospitais de ensino serão mantidos, tais como o Fundo de Incentivo ao Desenvolvimento de Ensino e Pesquisa em Saúde (Fidesp)

– Os hospitais vão continuar recebendo um valor fixo do Fidesp e outros incentivos, além do novo investimento dos Ministérios da Saúde e Educação, todo mês. A proposta é que essas instituições possam planejar suas ações, pois terão a certeza de que vão receber o dinheiro, sendo 90% fixos e 10% liberados por atingimento das metas – reforça Arthur Chioro.

Caso as instituições não alcancem as metas, o recurso será destinado para o gestor do SUS na prefeitura ou no estado, que terá a responsabilidade pela gestão e controle do novo contrato, conclui o diretor.

Dívidas somam R$ 300 mi

Governo federal quer aperfeiçoar a gestão hospitalar

A crise financeira dos hospitais universitários não é novidade. Acredita-se que somente as instituições públicas federais – que representam um terço do total – acumulem cerca de R$ 300 milhões em dívidas. Para descobrir exatamente o montante dessa dívida, o governo federal está realizando um estudo específico sobre o assunto, com a participação de vários ministérios.

– Há uma imprecisão muito grande e, em tese, os hospitais universitários que são públicos não poderiam ter dívidas, mas acumularam esses débitos por meio de suas fundações de apoio – assinala o diretor do Departamento de Atenção Especializada do Ministério da Saúde, Arthur Chioro.

Já em relação às instituições de ensino filantrópicas e privadas, Chioro afirma que é ainda mais difícil identificar o valor da dívida. Isso porque o total fica diluído junto ao endividamento do setor privado hospitalar brasileiro. ”Sabe-se que a dívida dessas instituições é muito grande, mas não há como precisar seu valor”, reforça o diretor.

Várias são as causas da crise enfrentada pelos hospitais universitários. Boa parte da dívida está relacionada com encargos, dívidas trabalhistas e imposto de renda. No caso dos hospitais públicos estaduais e municipais, geralmente o que ocorre não é exatamente um endividamento, mas, principalmente, dificuldades operacionais. Assim, o déficit financeiro dessas instituições é suprido pelas prefeituras e pelos governos estaduais.

Arthur Chioro afirma que, no caso dos hospitais públicos federais, o endividamento se deve principalmente ao fato de não terem sido autorizadas contratações de 1994 a 2002. Ou seja, os serviços aumentaram, os hospitais perderam funcionários e servidores – com grande número de demissões voluntárias, aposentadorias e falecimentos – e não houve autorização para reposição de pessoal.

Com isso, os hospitais públicos federais acumularam um déficit de 22 mil funcionários, contratados via fundações com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). ”Vários hospitais chegaram a comprometer mais de 50% do que recebiam do SUS para pagar pessoal. Alguns pararam de pagar os encargos trabalhistas dos funcionários contratados via fundação, enquanto outros passaram a não pagar o fornecedor”, comenta o diretor.

No entanto, a crise dos hospitais universitários não é apenas financeira. Arthur Chioro reforça que a nova política para esses hospitais busca não só superar essa crise, mas aprimorar os mecanismos de gestão hospitalar e rever a maneira como esses hospitais se inserem na rede do SUS, além de oferecer uma melhor formação aos profissionais de saúde e qualificar a pesquisa.